Nayara está dando uma aula de solidariedade: mãe de duas meninas, ela doa leite para nove crianças.| Foto: Lineu Filho/ Tribuna do Paraná
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Em meio à pandemia da Covid-19, uma mãe vem salvando vidas de crianças da UTI Neonatal do Hospital Evangélico Mackenzie, em Curitiba. E melhor ainda: sem nem precisar sair de casa. A recepcionista Nayara Davantel Pinheiro, de 29 anos, tem no peito o melhor remédio que existe para os bebês prematuros: leite materno. Mãe de Dara, de 1 ano e 5 meses, e da Lívia, de apenas 3 meses, Nayara consegue alimentar as filhas e fazer doações mensais de 20 litros de leite materno – quantidade que alimenta nove bebês internados.

A recepcionista é a melhor doadora do banco de leite do hospital, que vem passando por uma baixa no número de voluntárias com a pandemia. “A gente imagina que, se fosse colocar no papel, nossa necessidade de leite aumentou de 30% a 40% agora”, explica a coordenadora técnica da UTI neonatal do hospital, a médica Juliana Baratella André Roseda. “As mães não estão entrando na UTI para amamentar por causa das restrições do novo coronavírus. Nossa necessidade aumentou tanto por conta das restrições de visitas quando por causa do fechamento na maternidade no Bairro Novo”, comenta a coordenadora.

A maternidade em questão precisou ser transformada em hospital para tratar casos de Covid-19, na capital paranaense. Por isso, as mães que dariam à luz nesta unidade foram transferidas para o Hospital Evangélico Mackenzie.

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Gesto simples e muito importante

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Para não deixar os estoques de leite ainda mais baixos, a coordenadora faz um apelo para que as mães continuem doando. “Muitas mães têm medo de doar por causa da importância desse leite, que vai para a UTI neonatal, para bebês que pesam entre 500 e 600 gramas. Pode parecer algo complexo, mas é muito simples. Esse leite vai passar por todo um processo de pasteurização no hospital, por controle de qualidade, testes de microbiologia”, salienta Juliana. Para garantir toda a segurança, o leite doado é testado para saber se não há nenhum tipo de contaminação.

As doações são fundamentais para garantir o desenvolvimento dos bebês da UTI neonatal, que conta com 40 leitos. Hoje grande parte dos bebês que ocupa essas vagas são prematuros e precisam do leite materno para se fortalecer. “O leite materno é o melhor em digestibilidade. Ele tem a quantidade certa de proteínas, aminoácidos, lipídios e células de defesa. Leite de fórmula não tem essas células de defesa, que para um bebê prematuro faz toda a diferença já que ele nasce sem imunidade”, ressalta a médica.

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Amamentação que venceu julgamentos

Nayara, que atualmente disponibiliza cinco litros de leite materno semanalmente, começou a doar para o Evangélico Mackenzie em janeiro de 2019. “Minha primeira bebê estava completando um mês quando comecei a doar. Eu tinha uma produção muito alta e o banco me ajudou muito”, revela a mãe. 

Porém, quando ficou grávida da sua segunda filha, Nayara teve que lidar com o julgamento nas ruas. “Quando eu amamentava em público, grávida, as pessoas me olhavam. ‘Nossa, você está amamentando grávida, não pode!’, diziam. Ninguém tinha uma informação técnica de que não podia. Disseram que meu bebê ia nascer antes, que eu poderia abortar”, lembra Nayara. Mesmo com os julgamentos sem fundamento, a mãe continuou amamentando.

Ao procurar o banco de leite do hospital, a situação melhorou. Nayara conseguiu retirar o excesso de produção, que favoreceu a doação. “Meu seio ficava explodindo de leite, era muita dor. Quase tive mastite (infecção nos seios durante a amamentação) de tanto leite que produzia”, lembra ela. Agora, mesmo amamentando as duas filhas, a mãe também consegue fazer a doação semanalmente. São duas retiradas, uma pela manhã e outra antes de dormir, todos os dias. 

E para manter a produção em alta, a mãe conta que hoje se hidrata muito, mas nem sempre foi assim. “Dizer que eu sempre tomei água é mentira. Antes da gestação eu tinha uma dificuldade enorme de tomar água. E como eu queria produzir leite, precisava beber água e criei uma meta. Hoje, consigo tomar de dois litros e meio a três, por dia, mas fui começando gradativamente”, conta. Para se hidratar, Nayara também bebe muito chá de erva-doce e camomila. “Deixa o bebê mais tranquilo”, explica. 

A alimentação também tem todo um cuidado. A doadora não bebe nada com cafeína e incluiu na dieta sucos nutritivos, além de alimentos que contêm ferro, como a beterraba. “Procuro buscar ao máximo o equilíbrio na minha alimentação”, esclarece. A massagem nos seios para a estimulação do leite é igualmente importante.

Para Nayara, todo o cuidado na doação é uma retribuição pela sorte de ter leite. “Acho injusto jogar esse leite fora. Eu fico pensando nessas mães que estão com os filhos no hospital, na dor que é. Vejo que não podem amamentar, que as às vezes não têm o leite porque nasceu o bebê prematuro. E nada é melhor do que o leite natural. Quando você dá leite materno, o bebê fica mais tranquilo, menos irritado”, conta.

Doação sem precisar sair de casa

A doadora recordista do banco de leite hoje repassa as informações para outras futuras mamães e para, assim, aumentar a quantidade de voluntárias. Segundo ela, a preparação para a amamentação acontece antes do bebê nascer. “Tem que preparar o peito para não rachar, não sangrar. E mesmo que isso aconteça, a mãe tem que entender que é só uma fase. Muitas mães desistem ali, muitas vezes isso acontece por falta de informação”. 

No caso do Hospital Evangélico Mackenzie, é possível fazer um cadastro no banco de leite e um funcionário do hospital vai até a casa da doadora, que entrega os frascos esterilizados e depois faz a coleta deles uma semana depois.