Palavras de incentivo e expressões de amor e solidariedade com aquele tom de carinho típico entre netos e avós. Esse foi o conteúdo de dezenas de cartas escritas pelos alunos do 5º ano do ensino fundamental do Colégio Marista Glória, em São Paulo, para idosos que estão em instituições de longa permanência durante esse tempo de isolamento social. “As crianças ficaram muito comovidas e felizes por poderem participar dessa iniciativa, pois também se lembraram de seus avós, que também estão distantes por causa da pandemia”, conta a professora Tânia Regina da Cruz dos Santos, responsável pela ação no colégio.
A ideia de as crianças escreverem as cartinhas surgiu a partir de um convite dos alunos da Escola Paulista de Enfermagem da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), que promovem o Projeto Recrear. “É um projeto de extensão destinado a criar espaços de diálogo aos participantes, discutindo sua inserção na sociedade, seu papel ético, político como cidadão e o trabalho interprofissional com questões relativas ao envelhecimento”, explica a enfermeira e docente do Departamento de Saúde Coletiva da Escola Paulista de Enfermagem, Meiry Fernanda Pinto Okuno.
Segundo ela, o propósito do projeto é ocupar o tempo ocioso dos idosos durante a internação no hospital por meio de atividades recreativas, como jogos, leituras, entre outras. No entanto, durante a pandemia de Covid-19, as ações no hospital tiveram que ser interrompidas e, por isso, o projeto decidiu estender suas atividades para as Instituições de Longa Permanência (ILPIs). E uma das ações foi justamente coletar na comunidade local cartas de incentivo e conforto emocional para os idosos institucionalizados.
Solidariedade
De acordo com Tânia, o convite “caiu como uma luva” para as crianças do colégio, que já estavam participando de um projeto de intervenção social (PIS), cujo objetivo este ano é abordar e refletir sobre como os idosos têm sido tratados em nossa sociedade. “Nesse projeto, todas as ações vêm sendo construídas em parceria com os estudantes, pois acreditamos que eles podem nos dizer muito sobre os temas propostos”, explica a professora. Além das cartas com desenhos, pinturas e mensagens de incentivo aos idosos, os alunos também planejam organizar uma live sobre o assunto e selecionar histórias inspiradoras sobre o tema para lerem e refletirem juntos.
“A reação das crianças ao escreverem as cartas foi ímpar. São crianças muito especiais e sensíveis a essa questão”, conta Tânia. “Nessas cartinhas, elas quiseram expressar amor, mensagens de fé, de solidariedade, de compaixão. E nesse tempo de pandemia, é importante a gente resgatar e, principalmente, trazer à tona para as crianças esse sentimento de solidariedade”.
“Eu adoro idosos. Gosto muito de ajudar. Agora nossa quarentena está sendo um pouquinho chata, mas nós temos que ficar em casa para nos protegermos. Espero que estejam se cuidando”, escreveu a aluna Maria Eduarda, de 10 anos, em sua cartinha. O estudante Pedro, também de 10 anos, mostrou que sentir empatia é importante para todas as idades: “Quero dizer que estou passando o mesmo que vocês e por causa disso gostaria de compartilhar meu amor, carinho, conforto e companhia. Acredito que sentem falta de abraços assim como eu estou sentindo. Gostaria de poder abraçar a minha mãe, mas não posso fazer isso porque ela trabalha em um hospital (...) Mas logo tudo isso acaba e vamos poder fazer tudo o que fazíamos antes: abraçar, beijar, estamos próximos uns dos outros”.
Empatia
O isolamento social também não tem sido fácil para os pequenos. Segundo a professora, é da natureza das crianças serem livres para pular, correr, ir para a escola ou para a casa dos amigos, então todas essas restrições sociais que estamos vivendo se tornaram um grande desafio para elas. Ao mesmo tempo, iniciativas como a escrita dessas cartas, por exemplo, se tornaram uma excelente oportunidade para que elas possam se colocar no lugar das outras pessoas, principalmente em tempos mais difíceis.
“Eu acho que, como educadores, pais e professores, a gente não pode mais desvincular a educação emocional da acadêmica, ambas andam lado a lado. A empatia precisa, mais do que nunca, ser levada a sério dentro e fora da escola, principalmente nesse tempo de pandemia”, expressa a professora. “O mundo tem precisado cada vez mais de médicos empáticos, advogados empáticos, administradores empáticos, então esse projeto tem como objetivo ajudar essas crianças a se tornarem mais empáticas diante de questões que estão cada vez mais próximas a elas”.
Uma reportagem do Jornal da Tarde da TV Cultura registrou o momento em que os idosos de uma das casas de repouso receberam as cartinhas carregadas de amor e esperança. Eles fizeram questão de retribuir o carinho. Carolina Rodrigues Ferreira, de 83 anos, pediu para que repassassem o recado às crianças: “Eu estou bem, muito obrigada por tudo. Diga aos alunos que a gente também está enfrentando tudo isso junto com eles. Logo logo a gente vai se encontrar, tá bom?”.