Cinco dias depois da histórica oração pelo fim da pandemia do novo coronavírus que o papa Francisco presidiu em uma Praça de São Pedro deserta e chuvosa, a Santa Sé publicou nesta quarta (1º) um formulário litúrgico específico para a celebração da missa “em tempos de pandemia”. Os textos, que são de uso opcional, passam a fazer parte das “missas para diversas necessidades” do missal católico, ao lado de formulários que já existiam, como as missas “em tempo de guerra ou calamidade”, “em tempo de terremoto” e “após as colheitas”.
Conforme a Covid-19 se espalha, cristãos de diferentes confissões recorrem à oração neste período crítico. O próprio Francisco foi a inspiração do bispo católico de Barretos, dom Milton Kenan Júnior, para compor uma oração para este momento de epidemia. "O papa tem nos dito que uma sociedade que despreza o pobre e o planeta está se condenando a si mesma”, diz o bispo. “Ele tem ressaltado a necessidade de vencermos a cultura da indiferença, dando-nos conta da realidade que nos cerca e das consequências do nosso egoísmo".
Um trecho da oração do bispo diz: "Na ganância desenfreada, na busca do lucro a todo custo, na corrupção que corrói nossas instituições, nos escândalos daqueles que se enriquecem às custas da fé simples do vosso povo e dos que, sob o manto da piedade, abusam dos mais pequeninos e vulneráveis, profanamos a vossa casa e jogamos as pérolas que confiastes aos vossos ministros na lama mais depravadora".
Para o bispo, a oração é necessária neste momento como um caminho para sustentar a confiança em Deus e enxergar com mais profundidade e sabedoria a nossa situação. "A oração nos faz olhar o mundo com outros olhos. Ela nos faz descobrir aquilo que é mais importante, aquilo que tem mais valor. A oração nos faz olhar o mundo com os olhos de Deus", explica dom Milton.
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) realiza novamente nesta quarta (1º) o Terço da Esperança e da Solidariedade, uma iniciativa que o organismo idealizou para este tempo de pandemia. A oração, que acontece semanalmente desde o dia 18 de março, será transmitida a partir das 15h30 em todas as televisões católicas e pela internet, nas páginas da CNBB no Facebook e no YouTube.
De hora em hora
Igrejas evangélicas em todo o mundo também têm se mobilizado em campanhas de oração por aqueles que sofrem com a pandemia. No Brasil, antes mesmo de os primeiros casos surgirem, já havia uma mobilização em apoio aos outros países, que se intensificou com o avanço do novo coronavírus em todas as unidades da federação. Um desses movimentos é o Oração Nação, composto por diversas denominações evangélicas e que representa diretamente pelo menos 3 milhões de pessoas, segundo Everaldo Borges, pastor da Igreja com Propósito (ICP), em Curitiba.
"A oração é e sempre será uma forma do povo de Deus vencer quando as estratégias humanas não estão funcionando. É muito importante a igreja neste momento em todo país concordar em unidade, com orações e súplicas, clamando a Deus para responder com cura", comenta o pastor. Por meio do movimento, as pessoas são incentivadas a orar de hora em hora, em sua casa, pelas famílias e pelo momento delicado que a sociedade vive.
A Junta de Missões Nacionais, ligada à Convenção Batista Paranaense, também organizou um relógio de oração – como é conhecida nas igrejas essa organização das orações de hora em hora. O evento virtual aconteceu na última segunda-feira (30) e no site da organização era possível baixar um arquivo com 144 pedidos de oração. O documento, que ainda está disponível para download, traz, a cada 10 minutos, dentro de 24 horas, um pedido específico. Durante todo o dia 30, pastores batistas de todo o Brasil se revezaram em lives para conduzir os momentos de oração e estar "junto" dos membros das igrejas.
Música para acalmar
Algumas igrejas, respeitando as determinações da Organização Mundial de Saúde (OMS), têm buscado ainda outras estratégias para levar conforto a quem está em casa. A Primeira Igreja Batista (PIB) de Curitiba organizou em um carro algumas caixas de som e saiu a levar mensagens de paz e esperança às famílias que estão dentro de suas casas. O veículo percorreu uma avenida da capital paranaense entoando louvores em voz e violão. "Pessoas aplaudiram, cantaram, piscaram as luzes dos apartamentos e nos agradeceram. Nas ruas teve quem buzinasse em sinal de apoio", lembra Albert Martins de Oliveira Filho, diretor de comunicação da PIB. "A intenção é fazermos isso outras vezes ainda", completa.
Juntos em um mesmo propósito
Iniciativas ecumênicas também têm surgido nesses dias. No sábado (27), aconteceu, por meio do aplicativo Zoom, uma celebração ecumênica online, organizada pelo Núcleo Ecumênico e de Diálogo Inter-Religioso da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (NEIR/PUCPR). Entre os diversos líderes cristãos que participaram do momento, estiveram o presidente da CNBB e arcebispo de Belo Horizonte, dom Walmor Oliveira de Azevedo, o pastor Inácio Lemke, que preside o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic), a pastora Silvia Genz, presidente da Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil (IECLB), e dom Naudal Alves Gomes, primaz da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB).
"Estamos todos envolvidos pela mesma graça, estamos todos vinculados no mesmo Espírito, estamos todos nos amando no mesmo amor de Cristo", diz o coordenador do núcleo, o padre e teólogo Elias Wolff, que é também professor do Programa de Pós-Graduação em Teologia da PUCPR. O núcleo está preparando outra celebração para a quinta-feira (2), desta vez inter-religiosa, que será transmitida a partir das 19 horas pelas páginas da CNBB e do Conic no Facebook.
"A oração não é a busca de um milagre, como se Deus fizesse tudo sozinho. Não é responsabilizar a Deus para resolver os problemas que encontramos", explica Wolff. "A oração é o momento de buscar força em Deus e buscar luz para as situações escuras da nossa vida e da nossa história, e assim nos sentirmos impulsionados a continuarmos a caminhada que estamos fazendo para encontrar soluções para os nossos problemas", finaliza.