Margaret Keenan, 90 anos, foi a primeira pessoa a receber a vacina contra a Covid-19 no Reino Unido| Foto: Jacob King/POOL/AFP
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Em menos de um ano, o mundo passou das incertezas de uma nova doença para a esperança de um futuro com a Covid-19 controlada (ou inexistente). Como chegamos até aqui? Com muito investimento, interesse e aprendizado, listam os especialistas ouvidos pelo Sempre Família.

Nesta terça-feira (8), o vídeo da Margaret Keenan, de 91 anos, recebendo a vacina desenvolvida pela Pfizer e BioNTech, na Inglaterra, rodou o mundo. A liberação para o uso emergencial do imunizante foi concedida pelo Reino Unido no dia 2, última quarta-feira, e a expectativa é que 400 mil pessoas sejam vacinadas nas próximas semanas.

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Espera-se, ainda, que a agência regulatória dos Estados Unidos, o FDA, aprove o uso da mesma vacina a partir do dia 10, quando está marcada uma reunião com as farmacêuticas. E, se tudo isso ainda parece demorado, vale lembrar que o anúncio da parceria entre as desenvolvedoras para pensarem em um imunizante contra o novo coronavírus foi divulgado em março, no dia 17, há apenas nove meses.

"É algo muito emocionante. Ver hoje o vídeo da primeira pessoa a ser vacinada, uma senhora de 90 anos, é um marco, considerando que estamos há um ano com conhecimento dessa pandemia. Sem dúvida é um marco histórico", explica Mellanie Fontes-Dutra, doutora em neurociências, colaboradora do Instituto Questão de Ciência, membro do Infovid, e uma das coordenadoras da Rede Análise Covid-19.

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Corrida de várias candidatas

A aprovação do uso emergencial da vacina da Pfizer pode ter sido uma das primeiras, mas não é e não será a única. A Sputnik V, desenvolvida pelo Instituto Gamaleya, por exemplo, já vem sendo usada para vacinar a população na Rússia, conforme anunciou um hospital próximo de Moscou no fim de novembro. A vacina recebeu o registro no país em agosto, e até o momento divulgou apenas resultados preliminares dos estudos de fase 3.

Outra candidata que está na etapa final dos estudos clínicos é a da farmacêutica Sinovac, da China. A expectativa é que sejam divulgados os resultados preliminares de eficácia da Coronavac, do braço brasileiro da pesquisa, no dia 15 de dezembro. Até o momento, há os dados de imunogenicidade (para verificar se a vacina causa alguma reação no sistema imunológico) e de soroconversão, mas não de eficácia.

E, nesta terça-feira (8), a revista científica Lancet publicou os resultados de eficácia da fase 3 da vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford e pela AstraZeneca. A média calculada foi de 70% de eficácia, mas um novo estudo será feito para confirmar os achados depois que as desenvolvedoras divulgaram um erro na dosagem das vacinas para um grupo de voluntários.

De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), ao todo são 52 candidatas a vacinas que estão em testes clínicos (em seres humanos) e outras 162 em análises laboratoriais.

Resultados rápidos

Uma série de fatores permitiu que, não apenas a vacina da Pfizer/BioNTech, mas todas as outras se desenvolvessem no ritmo que se vê hoje. O primeiro deles: dinheiro.

"Foram bilhões de dólares, euros, reais, várias moedas investidas de forma constante para propiciar que não faltassem insumos. A ciência sabe dar respostas rápidas, mas precisa do investimento. Isso faz até a gente se perguntar, em um momento com tantos cortes nas ciências, o que poderíamos ter com um investimento constante", questiona Mellanie Fontes-Dutra, que é uma das coordenadoras da Rede Análise Covid-19.

O consórcio da OMS, chamado de Covax, foi um dos mecanismos de investimento pensado no início da pandemia, lançado em abril para o desenvolvimento de vacinas e de medicamentos. Fazem parte 78 países, de diferentes níveis econômicos, que receberão doses de vacinas, assim que aprovadas, suficientes para imunizar até 20% da população. Outro projeto de aceleração foi o "Operation Warp Speed", nos Estados Unidos. O objetivo é a produção e distribuição de 300 milhões de doses de vacinas contra a Covid-19 até janeiro de 2021.

Aliado ao investimento, o médico pneumologista Frederico Fernandes cita o interesse dos pesquisadores de diferentes áreas para o combate à pandemia. "A maioria dos pesquisadores em imunologia se voltou, este ano, a pesquisar o coronavírus. E em todas as áreas vimos isso, em epidemiologia, pneumologia, estudos de ventilação mecânica e UTI. O que se produziu de conhecimento sobre o novo coronavírus foi ímpar", destaca o médico, que é presidente da Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia (SPPT).

Mudanças na área de regulação de alguns países, como a própria Anvisa, também aceleram as inovações. Fernandes explica que, até então, não havia a possibilidade de iniciar a submissão de informações sobre um medicamento ou vacina novos sem ter todos os dados prontos. "Isso tem uma lógica, porque você afasta o esforço de uma agência regulatória com algo que você nem sabe se vai dar certo. Mas, pela pandemia, houve essa flexibilização e é possível fazer as submissões prévias para que a aprovação seja mais rápida", detalha o especialista.

Até o momento, no Brasil, todas as farmacêuticas que testam as candidatas no país começaram o envio de dados sobre as vacinas para a Anvisa, de acordo com informações da própria agência.

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Aprendizados novos

No futuro, quando uma nova doença surgir, a resposta da comunidade científica, e de toda a sociedade, será melhor, espera Frederico Fernandes, médico pneumologista.

"Eu acredito que a experiência pela aqual estamos passando vai mudar nossa capacidade de descobrir, testar e aprovar novos tratamentos e vacinas. Eu acho que a capacidade da Humanidade de produzir uma vacina para doenças emergentes melhorou muito este ano, e isso, claro, vai ser um legado de toda essa terrível situação. Com o investimento que tivemos, isso cria novas plataformas de estudo, tecnologias novas", explica.

Para Mellanie Fontes-Dutra, doutora em neurociências, a conexão entre os diferentes especialistas – tanto no próprio país, quanto em outros – será outro legado importante para o futuro.

"Também entramos no consenso que a vigilância epidemiológica é importante. Estar cada vez mais atento a pandemias emergentes, tentar sempre estar um passo a frente. Mas espero que o legado com relação à responsabilidade com a ciência permaneça, que as autoridades tenham o legado de adotar políticas baseadas em evidências. Espero que esses legados se mantenham para darmos respostas melhores, e até evitarmos que novos problemas surjam", detalha.

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