Estudo publicado na revista científica The Lancet nesta sexta-feira (4) diz que a vacina russa, Sputnik V, é segura e foi capaz de criar anticorpos contra o novo coronavírus. Ainda assim, os cientistas russos reconhecem que mais testes são necessários para comprovar a eficácia da candidata.
"A vacina é altamente imunogênica e induziu fortes respostas em 100% dos voluntários adultos saudáveis, com títulos de anticorpos em participantes vacinados mais elevados do que no plasma convalescente", ressalta a revista. Entende-se por plasma convalescente o sangue de indivíduos infectados pelo vírus que produziram anticorpos para a doença.
A Lancet ainda informa que não foram registrados efeitos colaterais graves em participantes do estudo. "As reações mais comuns foram dor no local da injeção, hipertermia [aumento da temperatura corporal acima dos níveis normais], dor de cabeça, astenia [cansaço/fadiga] e dores musculares e articulares, típicas em vacinas baseadas em vetores virais recombinantes. Nenhum evento adverso sério foi relatado durante o estudo", ressalta a publicação.
A Rússia foi o primeiro país a registrar uma vacina contra a Covid-19, o que aconteceu em agosto. A notícia, no entanto, foi recebida com desconfiança pela comunidade internacional, considerando a celeridade da produção do imunizante e a falta de estudos sobre ele até então.
Candidata russa
O diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Renato Kfouri, avaliou nesta sexta-feira que a potencial vacina russa para a Covid-19 pode ser categorizada como candidata. "A vacina russa agora pode ser categorizada como candidata, é a 8ª vacina entrando em fase 3", disse em entrevista à GloboNews, citando as possíveis vacinas produzidas pela Universidade de Oxford e pelas empresas chinesas Sinovac e CanSino como outros exemplos que estão na terceira fase de estudos clínicos.
Sobre o tempo de imunização que a Sputnik V pode oferecer, Kfouri afirmou que é improvável que os cientistas russos conseguirão essa informação em tempo hábil para a eventual aprovação da vacina. "Vamos licenciar vacinas nesse cenário de pandemia sem todas as informações completas, uma delas é esse período de imunização. Para preencher todas as informações que precisamos, esperaríamos 4, 5 anos", acrescentou.
Como funciona?
Para ensinar o sistema imunológico a se defender do Sars-CoV-2, a vacina russa usa dois vetores do vírus causador do resfriado, o adenovírus. Esses são enfraquecidos, de forma que não são capazes de gerar nenhuma doença, e recebem o gene que produz a proteína Spike do novo coronavírus — usada pelo vírus para entrar nas células humanas, ligando-se à enzima conversora de angiotensina 2 (ECA2 ou ACE2, na sigla em inglês).
Dos adenovírus usados pelos cientistas russos, um é o adenovírus humano recombinante tipo 26 (rAd26-S) e o adenovírus humano recombinante tipo 5 (rAd5-S). Os participantes receberam, na primeira fase do estudo, um dos dois tipos de adenovírus em testes. Já na segunda fase, que teve início até cinco dias depois da primeira aplicação, os voluntários foram imunizados com o tipo 26 e, na sequência, o tipo 5.
Essa estratégia é diferente, por exemplo, da adotada por Oxford, que usa um único vírus como vetor nas duas doses da vacina.
De acordo com os pesquisadores, o estudo de fase 1/2, para verificar a segurança e a produção de anticorpos, não foi randomizado e envolveu 76 participantes voluntários, homens e mulheres, entre 18 e 60 anos. A maioria, porém, era de participantes jovens, entre 20 a 30 anos.
Além disso, eles colocam como uma limitação do estudo o fato de que não houve nenhum grupo controle - participantes que não recebem a vacina em teste, justamente para servir de comparativo.