Recordar – palavra que, etimologicamente, significa “trazer ao coração” – a importância da saúde no campo da cardiologia: esse é o objetivo do Dia Mundial do Coração, data oficializada em 2000 pela Federação Mundial do Coração e celebrada todos os anos no dia 29 de setembro. E a ênfase não é para menos: no Brasil, as doenças cardiovasculares ainda são as principais causas de mortes. De acordo com o Ministério da Saúde, cerca de 300 mil indivíduos sofrem infarto agudo do miocárdio (IAM), dos quais 30% vêm a óbito.
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Estima-se que até o ano de 2040 haverá aumento de até 250% dessas ocorrências no país. Mas há também motivo para esperança: a tecnologia tem avançado muito nessa área e muitos dos procedimentos aos quais se recorre hoje são minimamente invasivos, sem a necessidade de grandes incisões que exigiam longa fase de recuperação e caracterizadas pela alta incidência de complicações. “A revolução na área significa ampliar o número de pacientes beneficiados e envolve um valor incalculável”, comenta o cardiologista Carlos Eduardo Duarte, especialista em estimulação cardíaca da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Duarte realizou recentemente na BP uma das primeiras cirurgias de implante do menor marca-passo do mundo, no Brasil. O Micra, como é chamado, é do tamanho de um comprimido de vitamina, não exige mais cabos-eletrodos e é indicado para tratar a bradicardia, doença que ocorre quando o ritmo cardíaco é irregular ou lento, com menos de 60 batimentos por minuto – o considerado normal para um paciente adulto varia entre 60 e 100 batimentos por minuto.
O menor marca-passo do mundo
“É a inovação mais transformadora em marca-passos e com a diferença de ser indicado, principalmente, para pacientes com graves condições de saúde – câncer, doenças renais, idosos etc. – que não seriam elegíveis para a cirurgia convencional”, explica o cardiologista, que ressalta ainda que estudos atestam que a cirurgia com o Micra reduz o índice de complicações em cinco vezes. Por essas e outras, Duarte acredita que a tecnologia não deve demorar para se tornar mais acessível no Brasil, ainda que tenha chegado ao país há menos de um ano, em novembro de 2021.
“Como é um marca-passo mais seguro para o paciente, já utilizado por mais de 100 mil pessoas no mundo e indicado para casos de pacientes com outras doenças graves, que não aguentariam a cirurgia com o marca-passo comum, acredito que tenha chances de entrar em tanto no SUS (Sistema Único de Saúde) quanto no rol da ANS (Agência Nacional de Saúde) em um curto espaço de tempo”, avalia o médico. “Também tem a questão dos eletrodos: quando há complicações, eles necessitam de cirurgias complexas e arriscadas para a sua troca. Mas isso depende muito de avaliações peculiares de políticas públicas e incorporações do Ministério da Saúde”.
O dispositivo envia os impulsos elétricos que regulam os batimentos cardíacos por meio de um ponto na própria estrutura do marca-passo, que fica em contato direto com o músculo do coração, em vez de usar cabos-eletrodos para isso. Uma bateria de lítio, que dura até 12 anos – a média de uma bateria de um marca-passo comum é de seis a oito anos –, alimenta um gerador, que está em contato com um microprocessador. “É mais ou menos como um gerador automático de um condomínio. Quando acaba a energia de rua, ele é acionado, e desliga quando não é mais utilizado”, exemplifica Duarte.
Novos caminhos
Um dos procedimentos minimamente invasivos que entraram em 2021 no rol da ANS foi a crioablação para tratar a fibrilação atrial, um tipo de arritmia cardíaca que ocorre quando as irregularidades na transmissão de impulsos elétricos que coordenam os batimentos do coração disparam. A crioablação, que dura de duas a três horas, cauteriza ou congela a parte do órgão responsável pela arritmia.
Já o implante percutâneo de válvula aórtica ou TAVI (da sigla em inglês, Transcatheter Aortic Valve implantation) ainda não entrou no rol, mas é outro dos procedimentos minimamente invasivos que têm merecido atenção. O TAVI é indicado para casos de estenose aórtica, quando a valva aórtica sofre obstrução ou estreitamento em pacientes idosos ou de maior risco para a cirurgia convencional. A condição acomete 5% da população com idade acima de 75 anos e sua prevalência aumenta com a idade.
“Os pacientes mais idosos apresentam um risco mais elevado para a cirurgia convencional, sendo este procedimento muitas vezes até contraindicado”, explica Fernanda Marinho Mangione, cardiologista da BP, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e diretora de avaliação de tecnologia em saúde da Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista. Na cirurgia convencional, a troca da valva aórtica é feita com o peito aberto, com incisões de grandes proporções, recuperação lenta e com risco elevado para o paciente idoso, mais suscetível a complicações.
Já no TAVI, essa mesma valva é corrigida por meio da introdução de um cateter na região da virilha, que segue até o coração, implantando assim uma nova valva e restabelecendo a passagem adequada do fluxo sanguíneo. O procedimento é feito sem cortes, com uso de anestesia local e sedação leve. Muitos pacientes, inclusive, recebem alta em até dois dias, enquanto os que fazem a “cirurgia aberta” têm um tempo médio de internação de uma semana.
Prevenção em primeiro lugar
É fato que a medicina tem feito o seu papel com a ajuda de pesquisas científicas, tecnologia, conhecimento e expertise dos profissionais de saúde, buscando ampliar as possibilidades de procedimentos minimamente invasivos. Acompanhar o órgão, de perto, é primordial para a saúde, independentemente da idade. Ao mesmo tempo, o paciente precisa entender a importância de cuidar do coração por toda a vida.
“Investir em prevenção, seguindo uma alimentação equilibrada, rica em vegetais e pobre em gordura, sal e açúcar, recorrendo à prática regular de atividade física e consultas periódicas ao clínico ou ao cardiologista são práticas essenciais para a vida saudável”, afirma Marcelo Cantarelli, coordenador do Cath Lab do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e do Grupo de Hospitais DASA-Leforte.