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Das pessoas infectadas pelo novo coronavírus e que, com sintomas mais graves da doença demandam atendimento hospitalar ou morrem, mais da metade (53%) delas possui algum problema no coração. Esse é um dado divulgado pelo Ministério da Saúde, e reforçado por um estudo norte-americano publicado na revista científica JAMA Cardiology, que destaca os impactos da Covid-19 no órgão.

No estudo, pesquisadores fizeram uma revisão das informações envolvendo a Covid-19 e o coração, bem como doenças causadas por outros coronavírus (SARS e MERS), além da influenza (gripe). Como conclusão, eles perceberam que a Covid-19 pode induzir a inflamação vascular, a miocardite (inflamação do músculo do coração) e as arritmias cardíacas.

Além dos danos ao órgão, esses sintomas podem confundir os médicos a acharem que o paciente está sofrendo um infarto quando, em realidade, são sinais da infecção pelo novo coronavírus. Das duas condições mais comuns, chamam atenção dos médicos dois fatores de alerta: a elevação da troponina e a
miocardite.

"Estão sendo, inclusive, designados como fatores preditivos isolados de complicação. Ou seja, se a pessoa apresentar essas duas alterações, elas já predizem a alta gravidade do caso, mesmo que naquele momento o paciente esteja bem", explica Fernando Kubrusly, cirurgião cardiovascular do INCOR Curitiba.

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Sinais de "infarto"

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A troponina se trata de uma proteína, que é liberada na circulação sanguínea quando há uma lesão no músculo do coração. Infartos, por exemplo, são diagnosticados a partir do exame que avalia a quantidade dessa proteína no sangue.

"Esses dados da troponina têm sido muito estudados e hoje, talvez, seja um dos materiais laboratoriais importantes. Antes, o paciente chegava com queixas inespecíficas, e não eram nem sintomas gripais, e fazia o exame que indicava a troponina aumentada. Era levado como paciente cardíaco e, às vezes, até chegava a fazer um cateterismo. No exame, percebiam que as artérias estavam boas, e esse quadro de miocardite que ele apresentava era causado pela Covid-19. Isso acontecia muito em Londres", cita o cirurgião cardiovascular.

No caso da miocardite, que é outro fator que indica um risco maior de complicações da Covid-19, trata-se de uma inflamação do músculo cardíaco que pode levar a uma falência do órgão. Esses cenários podem acontecer tanto em pessoas que já tenham doenças cardíacas anteriores, como em pessoas até então saudáveis, conforme explica Kubrusly.

"Esse aumento da troponina pode aparecer mesmo em quem não tem doença cardíaca. Esse é um dos grupos que chamaram atenção na Inglaterra. Eles viram que em hospitais que tratavam principalmente casos cardiológicos tiveram um aumento na incidência de infarto, quando na verdade era a Covid-19."

O médico lembra, porém, que quem tem predisposição, com doenças cardíacas já instaladas, teria mais chance de desenvolver as complicações uma vez infectado pelo novo coronavírus.

Atenção aos hipertensos

Até o momento, não há dados suficientes que indiquem a hipertensão – uma das doenças mais prevalentes no Brasil – como um fator de risco isolado para complicações da Covid-19. Na Itália, porém, esse dado já foi divulgado: por lá, 73,5% das vítimas são hipertensos. "Sabemos que a hipertensão está presente mais comumente nos casos graves e que vão à óbito. Ao que tudo indica é, sim, um fator preditivo, mas não sabemos se é só a hipertensão, ou associada a outros indícios", explica Kubrusly.

A orientação do especialista ao hipertenso é, nesse momento, conversar com o médico para uma avaliação global, e avaliar o risco. "Hoje muitos cardiologistas estão disponíveis, se não fisicamente, via telemedicina, teleorientações. Esse paciente deve ficar isolado nesse momento. A chance de uma pessoa com doença cardíaca se contaminar é a mesma de quem não tem, mas o desfecho pode ser diferente."

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Medicamentos sob análise

Uma das medicações bastante conhecida de pessoas com doenças cardíacas é o bloqueador dos receptores de enzima conversora de angiotensina, mais comumente chamados de inibidores do ECA. Esse grupo de medicamentos ficou famoso logo no início do combate ao novo coronavírus por supostamente auxiliar a entrada do vírus nas células humanas – questão que não foi ainda comprovada.

"Não se sabe ao certo. Hoje a recomendação da Associação norte-americana de Cardiologia é para que a pessoa não interrompa o uso dessa medicação. A gente vê comumente pacientes parando de tomar por conta própria, mas não é forte a evidência, nem de melhora, nem de piora na infecção", explica o médico.

Parar de tomar o medicamento, sem orientação médica, pode levar a uma situação de descompensamento da primeira doença, o que pode, sim, aumentar ainda mais o risco de complicações no caso de uma infecção pela Covid-19.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]