Medicamentos usados no tratamento da aids não apresentaram resultados satisfatórios contra quadros graves da Covid-19
Medicamentos usados no tratamento da aids não apresentaram resultados satisfatórios contra quadros graves da Covid-19| Foto: Bigstock

Mais dois medicamentos falharam em apresentar benefícios a pacientes graves da infecção pelo novo coronavírus. Vão para o final da fila das prioridades dos médicos, agora, o lopinavir e o ritonavir.

Remédios usados há anos contra o vírus da aids, o HIV, ambos fazem parte da iniciativa global da Organização Mundial da Saúde (OMS), Solidarity, que promove estudos clínicos visando o tratamento da Covid-19. Fazem parte desse grupo, ainda, a hidroxicloroquina e a cloroquina (que também não têm tido muito sucesso contra o novo coronavírus), o Interferon beta-1a, e o remdesivir.

Destes, o remdesivir ganhou destaque nas pesquisas, sendo recentemente liberado pelo FDA (entidade semelhante à Anvisa, nos Estados Unidos) para uso por pacientes com quadros graves da Covid-19. No mesmo dia, a Anvisa anunciou que entrou em contato com o fabricante, a biofarmacêutica Gilead, para acompanhar a evolução dos estudos com o medicamento.

A falta de benefícios do lopinavir e ritonavir foi identificada por pesquisadores da China, Reino Unido e Estados Unidos, e publicada na revista científica New England Journal of Medicine (NEJM) na quinta-feira (07), depois de receber a avaliação de outros pesquisadores. A partir de um estudo randomizado, 199 pacientes com o diagnóstico confirmado para a doença foram divididos em dois grupos: 99 deles receberam as duas medicações em teste, além do tratamento padrão, e 100 pessoas tiveram acesso apenas ao cuidado padrão (que inclui o uso de antibióticos e respiradores, quando necessário).

Nas conclusões, os pesquisadores destacam que "em pacientes adultos hospitalizados com quadros severos da Covid-19, nenhum benefício foi observado com o tratamento do lopinavir-ritonavir, além do tratamento padrão". Ainda, 14% dos pacientes avaliados não puderam completar os 14 dias de uso dos medicamentos devido a efeitos colaterais gastrointestinais, como náusea, dores abdominais e diarreia.

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Embora os resultados do lopinavir e ritonavir tenham se mostrado pouco benéficos aos pacientes em quadros graves da Covid-19, isso não exclui a possibilidade de que possam ter uma ação mais positiva entre pessoas com sintomas mais brandos ou mesmo em um momento anterior à complicação da doença.

"Na circunstância desse estudo, com pacientes muito graves ou já há muito tempo de sintomas, vimos que não funciona. Não sabemos ainda quando é o momento ideal para tratar essas pessoas", explica Eduardo Sprinz, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), coordenador do ambulatório de HIV/AIDS e chefe do serviço de infectologia do hospital das clínicas de Porto Alegre.

Devido ao avanço rápido da doença, e os números de mortos crescentes, a principal preocupação dos pesquisadores têm sido encontrar medicamentos que atuem contra os casos graves da Covid-19, e não os brandos ou leves, de acordo com Viviane Alves, microbiologista do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) e chefe do laboratório de Biologia Celular e Microrganismos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

"Outros estudos podem ser feitos, com outras dosagens, outras faixas etárias. Mas é uma carta fora do baralho como prioridade [o lopinavir e ritonavir, e a cloroquina/hidroxicloroquina]. O remdesivir, por exemplo, teve uma redução nos dias de internação dos pacientes. Não foi uma grande redução, mas foi visto uma melhora", explica.

A especialista lembra ainda que, em 80% dos casos, segundo dados da OMS, as pessoas que entrarem em contato com o novo coronavírus vão desenvolver sintomas leves da doença, ou nem apresentarão esses sinais. "Esses mais leves, em geral, não precisam de tratamento. Alguns evoluem para uma forma grave, mas o foco, agora, é evitar as mortes. Ter uma alternativa para evitar esse desfecho da doença".

Cartas fora do baralho?

Dos medicamentos mais esperançosos, Sprinz cita o potencial do remdesivir - "talvez seja o primeiro de uma série de sucessos que vamos ter daqui para frente" - mas também alerta para os resultados não tão positivos envolvendo a hidroxicloroquina. "Na mesma revista científica [NEJM] foi publicado um estudo observacional sobre a hidroxicloroquina, que os pesquisadores verificaram que, usá-la ou não, não trouxe diferença."

O especialista se refere ao estudo desenvolvido por pesquisadores de diferentes instituições de Nova York, divulgado pela revista científica também na quinta-feira (7). Das conclusões, os norte-americanos destacam: "(...) a administração da hidroxicloroquina não foi associada a um risco reduzido ou aumentado do ponto final para entubação ou morte. Estudos randomizados e controlados com a hidroxicloroquina em pacientes com a Covid-19 são necessários".

No final de abril, outro estudo desenvolvido por norte-americanos, em hospitais de veteranos, identificou uma mortalidade maior entre os pacientes que fizeram uso da hidroxicloroquina, em relação aos que não tomaram o remédio. Trata-se, porém, de um estudo que ainda não foi revisado por outros pesquisadores. Há, atualmente, 175 estudos envolvendo a medicação em pacientes com a Covid-19, de acordo com informações do ClinicalTrials.gov - base de dados das pesquisas clínicas mundiais.

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