O médico da Casa Branca Sean Conley e a equipe que está atendendo o presidente americano no hospital militar Walter Reed. Donald Trump foi internado após ser diagnosticado com Covid-19| Foto: Brendan Smialowski / AFP
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O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, foi internado em um hospital militar na sexta-feira (2) após ter sido diagnosticado com Covid-19. O republicano está "muito bem" e não precisou de suplementação de oxigênio, disseram os médicos que estão atendendo o presidente neste sábado, embora uma fonte da Casa Branca tenha dito a jornalistas que Trump recebeu suporte de oxigênio em sua residência antes de ser levado ao hospital.

Trump aparentemente não está sendo tratado com hidroxicloroquina, um medicamento que ele promoveu em diversos momentos desde o início da pandemia e disse ter usado de forma profilática em maio. O presidente americano recebeu uma infusão de anticorpos policlonais e neste sábado iniciou tratamento com o antiviral remdesivir, segundo o médico da Casa Branca, Sean Conley. Os cientistas ainda não têm provas conclusivas de que esses dois tratamentos são eficazes para combater o novo coronavírus, mas ambos demonstraram resultados promissores até o momento.

Anticorpos monoclonais

O médico Sean Conley afirmou na sexta-feira que Trump recebeu uma dose única de 8g de um coquetel de anticorpos policlonais, além de zinco, vitamina D, famotidina (um antiácido), melatonina e aspirina.

Os anticorpos sintéticos ainda estão sendo estudados para o tratamento de Covid-19 e os primeiros resultados promissores dessa classe de medicamentos foram divulgados no mês passado.

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O coquetel recebido por Trump é composto por dois anticorpos monoclonais - versões criadas em laboratório de proteínas do sistema imune que são capazes de neutralizar o novo coronavírus. O medicamento experimental é produzido pela empresa de biotecnologia Regeneron e ainda está em fase de ensaios clínicos de grande escala. Nos Estados Unidos, o tratamento só está disponível para "uso compassivo", ou seja, o uso emergencial de medicamentos em fase de testes que precisa ser aprovado pela Administração de Alimentos e Medicamentos (FDA) dos EUA em cada caso.

A empresa divulgou resultados de estudos iniciais com o possível tratamento na terça-feira (6) e disse que o medicamento pareceu reduzir a carga viral e melhorar os sintomas dos pacientes e Covid-19. Os resultados se referem a testes que envolveram 275 pessoas e ainda não foram publicados em um periódico científico ou passaram pela revisão de cientistas independentes.

O REGN-COV2, como é chamado o tratamento recebido por Trump, é produzido a partir de anticorpos produzidos por camundongos que foram geneticamente modificados para que tivessem um sistema imunológico igual ao dos seres humanos. Os dois anticorpos monoclonais que compõe o medicamento se ligam a partes da proteína "spike" do coronavírus - as saliências em forma de espinho usadas pelo vírus para entrar nas células humanas.

Outras empresas têm apostado nos anticorpos monoclonais e policlonais para o tratamento da infecção pelo novo coronavírus. Em meados de setembro, a companhia Eli Lilly anunciou os resultados dos testes com o seu medicamento (que ainda não foram publicados em um periódico científico) e disse que o tratamento pode ter ajudado os pacientes a eliminar o vírus mais rápido e ter evitado que eles fossem hospitalizados. Os testes foram feitos com 452 pacientes, que receberam uma de três dosagens do anticorpo sintético ou placebo.

Especialistas viram os resultados divulgados pela Eli Lilly como animadores, mas mantiveram um otimismo com cautela. O infectologista João Prats, da BP, a Beneficência Portuguesa de São Paulo, disse à Gazeta do Povo após ver os resultados que o estudo foi feito com um grupo pequeno de pacientes com sintomas leves, e por isso não é possível afirmar com certeza que os efeitos vistos foram provocados pelo medicamento ou pelo acaso.

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Como funcionam

Anticorpos monoclonais são amplamente usados na oncologia, além de outras especialidades. Eles são produzidos para ter estrutura semelhante à de anticorpos humanos, feitos para atuar contra alguma proteína específica.

No caso dos medicamentos em testes para Covid-19, o anticorpo monoclonal é feito para atingir parte de uma proteína do Sars-CoV-2 e impedir que o vírus entre e infecte as células humanas.
"Na oncologia, esses anticorpos atuam contra proteínas do tumor, fazendo com que o tumor perca a sua vascularização e diminua", explica Ricardo Carvalho, oncologista da BP, ressaltando que esse tipo de terapia geralmente é caro.

"Anticorpos monoclonais sempre aparecem quando surge um vírus novo", diz Prats. A estratégia é semelhante ao uso de plasma de pessoas recuperadas, cujos anticorpos podem ajudar quem ainda está enfrentando a doença.

Remdesivir

O uso emergencial do antiviral remdesivir foi autorizado nos Estados Unidos em maio. A União Europeia autorizou o uso do remédio em julho. A droga é produzida pela empresa farmacêutica americana Gilead.

Médicos viram impactos positivos do uso do remdesivir em ensaios clínicos com pacientes hospitalizados com coronavírus. O medicamento foi criado há dez anos para ser uma opção de tratamento de hepatite e em 2014 foi testado para o tratamento de ebola. O remdesivir apresentou bons resultados para tratar Sars e Mers, duas infecções causadas por tipos diferentes de coronavírus.

Para autorizar o uso emergencial do remdesivir, o FDA americano baseou-se em uma pesquisa com 1.063 pacientes de Covid-19 dos EUA, Europa e Ásia que indicou que o medicamento acelerava a recuperação de pacientes e diminuía as taxas de mortalidade. Outros estudos com a droga, no entanto, apresentaram resultados menos animadores.

Dois meses após a autorização do remdesivir nos EUA, o governo americano anunciou que o país comprou praticamente todo o estoque global do medicamento.

"O presidente Trump fechou um acordo incrível para garantir que os americanos tenham acesso à primeira terapêutica autorizada para a Covid-19", disse em comunicado o secretário do Departamento de Serviços de Saúde e Humanos dos EUA (HHS), Alex Azar. "Na medida do possível, queremos garantir que qualquer paciente americano que precise de remdesivir possa obtê-lo", completou.

O HHS garantiu quantidade suficiente do medicamento para o tratamento completo de mais de 500 mil pacientes para hospitais americanos até setembro. Isso representa 100% da produção projetada da Gilead para julho, 90% da produção de agosto e 90% da produção prevista para setembro, além de uma quantidade que será usada em ensaios clínicos. O tratamento com remdesivir exige, em média, 6,25 frascos.

No Brasil, o uso do remdesivir foi autorizado pela Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) apenas para estudos clínicos.

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