Livrar-se de um passado como superobeso não é algo que deixa poucas marcas. A cirurgia plástica reparadora pós-bariátrica melhora a aparência geral, mas com muitos desafios extras, tanto relacionados a mudanças fisiológicas quanto à construção de expectativas reais.
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O tema, discutido na 9ª Jornada Paranaense de Cirurgia Plástica, promovida pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica – Regional Paraná no começo de dezembro, traz muitas nuances, que devem estar presentes sempre na conversa entre o paciente e o cirurgião plástico que irá tentar reduzir a quantidade de gordura e pele em excesso após uma drástica redução de peso.
São diversas as cirurgias que podem ser necessárias, comumente realizadas após um ano e meio da bariátrica — e após a liberação do cirurgião que realizou a cirurgia bariátrica —, segundo o cirurgião plástico Alexandre Mansur, um dos organizadores do evento. “Isso depende do tipo de corpo do paciente, se há gordura mais na região abdominal e tronco ou mais na região do quadril, e também de acordo com a quantidade de peso perdida, o que irá causar flacidez em diferentes áreas do corpo. O mais comum é a flacidez e a queda das mamas, também o abdome em avental (aquela barriguinha que cai), mas há a flacidez e pitose da região glútea, dorsal, braços, coxas, e isso define as cirurgias necessárias”, diz ele.
Mas cada caso é um caso e os tipos e o tamanho da cirurgia reparadora vai depender do quanto se emagrece, das características pessoais e do que mais incomoda o paciente.
Cirurgias reparadoras
Veja quais são as mais realizadas no paciente pós-bariátrica:
- A primeira cirurgia costuma ser a abdominoplastia ou dermolipectomia abdominal. E quando temos a queda dos glúteos, a abdominoplastia circunferencial.
- Passando para a parte superior, do tórax, do tronco, há a cirurgia plástica mamária e, muitas vezes, faz-se necessária a dorsoplastia, que é o tratamento da região posterior.
- Depois, a cirurgia da flacidez da coxa, chamada dermolipectomia crural ou lifting de coxas e as cirurgias do braço, chamadas braquioplastia.
- Por último, o lifting facial, porque a flacidez também atinge o rosto.
Para pacientes que tiveram emagrecimentos maiores, a cirurgia circunferencial ou 360º pode ser necessária: junto com a plástica de abdome, faz-se a volta toda da cintura, de bruços com o lifting de glúteo, retirando o excesso de pele posterior. Depois, em decúbito dorsal, faz-se a cirurgia do abdome. “Muita gente fala ‘vou fazer uma redução de estômago, depois eu faço plástica de mama e abdome e ok”, mas não se emagrece só na barriga, mama, braço ou perna, então para reparar a circunferência do tronco, essas cirurgias são as melhores”, diz Mansur.
Critérios para fazer a plástica
Além de ter feito a cirurgia bariátrica um ano e meio antes, ser elegível para uma cirurgia reparadora exige, primeiramente, a estabilização do peso, depois a liberação do cirurgião do aparelho digestivo e, então, a estabilização de condições clínicas. “Normalmente quem emagrece assim melhora as doenças relacionadas à obesidade como pressão alta, diabete e alterações cardíacas, mas fica um grau de desnutrição causado pela cirurgia bariátrica, pelas alterações no tubo digestivo que interferem na absorção dos alimentos. Então o paciente deve estar equilibrado para a cirurgia, sem anemia e sem carência de vitamina”, diz Mansur.
Maiores desafios para os cirurgiões
Além da desnutrição causada pela bariátrica, estão entre os maiores desafios para cirurgiões na hora de operarem esses pacientes as alterações na pele, que causam um encolhimento e dão um resultado não tão bom quanto se fosse feita em outro indivíduo. “O cirurgião tem ainda que conscientizar o paciente de que a obesidade envolve uma compulsão, que precisa ser tratada, e que a pessoa deve também abandonar a ideia de “corpo perfeito”, pois ficam muitas cicatrizes após a cirurgia, assim como em outras plásticas. O cirurgião deve prevenir o paciente de expectativas falsas, desmistificando até mesmo essa ideia de que a cirurgia plástica brasileira dá resultados perfeitos, algo lúdico, mas que não existe”, diz Mansur, que assinala que o tipo de bariátrica (gastrectomia vertical ou bypass gástrico) escolhido não influencia na forma como se apresentam as sobras de pele ou acúmulos de gorduras no corpo. Antes da cirurgia, porém, são importantes exames pré-operatórios completos e, quando necessárias, reposições de ferro, de vitamina B, vitamina D, de ácido fólico e a ingesta rica em aminoácido com bastante proteína. “Essa dieta é importante, mas vemos que muita gente não faz, focando no pão, bolo e farinha de trigo, com predomínio de carboidratos que não nutrem, em vez de optar por aminoácidos de qualidade, como os chamados construtores”, diz ele.
Fisiologia alterada
Após o emagrecimento, segundo o cirurgião plástico Rogério Scheibe, também organizador do evento, a circulação sanguínea no pós-obeso exige atenção, por terem vasos calibrosos, pois que esses vasos e veias não emagrecem como os demais tecidos. “Esse paciente sangra mais que um paciente comum, o que pode levar a uma anemia por perda sanguínea”, diz ele.
Na hora da cicatrização, um paciente pós-bariátrico também pode encontrar mais dificuldades, pois pode se tornar mais vagarosa quando há anemia, perda de ferro ou proteína. “Como são grandes e têm mais suturas, as cicatrizes exigem cuidado para não infeccionarem”, diz ele.
Uma preocupação do cirurgião plástico, diz Scheibe, é que as cicatrizes fiquem bem colocadas, em dobras, pregas, axilas, na prega abdominal inferior, na dobra mamária/sulco mamário ou onde muda a pele ou cor da pele, a exemplo da intersecção entre o mamilo e a pele da mama.
“As cicatrizes são grandes, existem e não vão deixar de existir, mas o cirurgião se esforça para que, quando o paciente esteja vestido, ele tenha um corpo praticamente dentro do normal, dissimulando-as, por exemplo, no lugar onde vai o sutiã ou onde fica o biquíni”, diz Scheibe, apontando que as tatuagens também tem sido feitas com resultados bastante positivos.
Flacidez com o tempo
Quem faz a cirurgia desnutritiva, a da técnica do bypass gástrico, segundo Scheibe, faz flacidez com o tempo e em todas as áreas corpóreas, abdome, braços e até face. “Se ela faz reparo no abdome hoje, por exemplo, daqui alguns meses, anos, ela vai ter nova flacidez, não tão intensa como antes, mas que exigem novas cirurgias, às vezes bem menores e menos agressivas”, diz.
Além dessa flacidez posterior, de um modo geral, segundo Scheibe, pacientes bariátricos ficam com um metabolismo anormal, emagrecem por não absorverem alimento, têm com uma certa frequência anemia e tem eletrólitos, sal, potássio, cloreto, alterados. “Eles têm uma dificuldade de se alimentar tanto em quantidade como em frequência e também têm distúrbios intestinais, com grandes e desconfortáveis descargas intestinais”, diz ele.
Vários procedimentos ao mesmo tempo?
Quando a pessoa decide passar pela cirurgia plástica, muitas vezes a insatisfação com o corpo leva a pensar que dá para fazer vários procedimentos ao mesmo tempo. Porém, como explica Scheibe, as cirurgias em pacientes pós bariátricos têm que ser decididas de modo cauteloso. “Eu tenho, para mim, fazer uma cirurgia a cada vez ou, quando muito, duas cirurgias, quando o paciente não tem uma grande perda de peso e não tem uma grande quantidade de tecido sobrando: por exemplo, o braço e a mama de um mesmo paciente, ou junto com o abdome fazer as coxas” diz ele, que alerta que não se pode colocar em risco de vida por querer melhorar rapidamente. “Isso de que ‘já que estou fazendo, vou aproveitar’, não existe. O correto é: ‘já que estou fazendo, vou fazer o que meu médico indica com segurança’.
Muitas vezes, segundo Scheibe, o paciente encara o cirurgião plástico como se tivesse uma varinha de condão que bate no paciente e ele vai se tornar ‘lindo e maravilhoso’. “Por isso, o paciente deve ser bem orientado de que vai passar por uma série de reformas e que muitas vezes pode necessitar de auxílio psicológico ou psiquiátrico na sequência”, diz ele.