Disponível na Netflix, a série documental “A Indústria da Cura” tem gerado polêmica ao tratar os óleos essenciais como uma terapia alternativa popular, mas controversa. A produção, feita nos Estados Unidos, mostra um grupo de pessoas fazendo o uso dos compostos na pele e até tomando o líquido dos frascos na tentativa de reduzir quadros de transtornos psicológicos – o que acabou colocando em xeque a segurança e eficácia dos produtos.
Siga o Sempre Família no Instagram!
No Brasil, os óleos essenciais se tornaram mais conhecidos depois que a aromaterapia (ciência por trás dos cheiros) entrou para a lista de Práticas Integrativas e Complementares (PICs) do Sistema Único de Saúde (SUS), em 2018. O acesso a eles, pela internet, é fácil e a promessa, tentadora: alívio das dores, combate à ansiedade, depressão, insônia, estresse, irritabilidade, resfriados, alergias, acne e até celulite.
Só que não é por serem produtos “naturais” que não requerem cuidado, alerta a farmacêutica Viviane Duarte, professora da pós-graduação em óleos essenciais da Associação Brasileira de Fitoterapia (Abfit). “Podem causar reações cutâneas, como irritação, sensibilidade e fototoxicidade (risco de queimadura por exposição ao sol). E alguns pacientes com histórico de crises convulsivas e distúrbios sensoriais ou psíquicos devem ser acompanhados de perto”, diz. Soma-se, ainda, aos grupos de risco, idosos, crianças com menos de 3 anos, cardíacos e pessoas que usam remédios para tratamentos de longa duração.
Segundo Viviane, indicadas para a promoção do bem-estar e na melhora da imunidade, as essências são consumidas por aqui com difusores pessoais (colares aromáticos) e aromatizadores de ambiente, que espalham o perfume pelo ar. “Os óleos essenciais são essências puras ou destiladas extraídas de frutas, cascas, galhos, folhas ou flores”, argumenta.
Pelo que afirma, preparados altamente potentes, uma gota de óleo essencial pode conter de 20 a até 400 compostos químicos. Por isso, as fórmulas teriam mais de uma ação – outro ponto de atenção. “As propriedades químicas do óleo essencial definem esses efeitos. Podem ser encontradas, por exemplo, ações antisséptica, anti-inflamatória, cicatrizante, antimicótica e ansiolítica”, afirma a professora.
Precauções
Viviane defende que o uso dos óleos essenciais só seja feito mediante acompanhamento de profissionais formados (aromaterapeutas), durante a terapia, e com a participação de uma equipe multiprofissional para dar apoio. “Observamos que, na prática terapêutica, a vivência traz um comportamento único para cada pessoa”, ressalta.
A especialista também não aconselha a compra de fórmulas prontas em sites e perfis em redes sociais. “Eu não recomendo, pois, as fórmulas de internet são indicadas de forma genérica e os óleos essenciais devem ser utilizados de forma individual, respeitando o perfil de cada pessoa, sua história pregressa e seus hábitos sociais”, adverte.
Demora no tratamento
Para Luiz Ernesto Pujol, secretário-geral do Conselho de Medicina do Paraná (CRM), os efeitos dos óleos essenciais (sejam como cosméticos, remédios ou alimento) são “limitados” e ele cita como principal risco à saúde a demora em iniciar o tratamento adequado para doenças graves.
“Vamos supor que eu tenha um câncer que ainda não foi diagnosticado, mas que está tendo manifestações no meu organismo e que eu, acreditando que a aromaterapia vai me ajudar, comece a utilizá-la antes de procurar um médico. Enquanto eu uso [os óleos essenciais], estou protelando não só o diagnóstico da minha doença, mas a conveniente terapêutica para essa patologia”, sustenta.
Para ele, a tentativa de resolver o problema sem a participação de um médico pode agravar os quadros clínicos pela demora na busca por um especialista. “Nas patologias psiquiátricas, eles podem até ter algum efeito, mas nas doenças em que há lesão no organismo, não é isso que se prega. É um perigo. Tem mais riscos do que benefícios”, dispara.
Ingestão
Sobre a ingestão de óleos essenciais, Pujol acrescenta, ainda, que essa é uma técnica que as pessoas realmente devem evitar. “Um médico jamais aconselharia um paciente a usar esse método quando se trata de óleos essenciais, pois não há nenhuma pesquisa ou comprovação científica que apoie essa prática”, pondera.
Uso diário
Famosos pelos efeitos calmantes, os óleos essenciais também ganharam espaço entre as profissionais que lidam com mulheres durante a gestação. Adepta da aromaterapia, a curitibana Tatiane de Souza Armênio, da Casa Uterus, passou a usar os compostos desde que começou a “doular”, seis anos atrás. “Comecei a testar durante o trabalho de parto. Vi que funcionavam e acabei trazendo para minha prática diária”, conta.
Hoje, as gotas são usadas desde os primeiros enjoos até as primeiras contrações. “Os óleos são colocados em difusores individuais e de ambiente e também em escalda-pés seguidos de massagem. O tratamento é personalizado e atende a mulher principalmente na redução da adrenalina na hora do nascimento do bebê”, aponta Tatiane.
Com o tempo, a doula foi selecionando os cheiros que mais dão resultado para as grávidas. “O de lavanda, por exemplo, é curinga para ansiedade e colabora com o sono, trazendo mais tranquilidade para a mãe. Já os mais cítricos (como o de limão siciliano) têm boa ação nos quadros de enjoo, enquanto que o de laranja doce é usado no ambiente, durante o trabalho de parto, para trazer aquela sensação de aconchego”, explica.