Apesar de não ser uma doença somente respiratória, o comprometimento do pulmão é um indício de gravidade para a Covid-19.| Foto: Bigstock
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Após um ano de pandemia, os especialistas sabem que a Covid-19 não é uma doença que atinge unicamente o trato respiratório. No entanto, um dos sinais de maior gravidade continua sendo o comprometimento do pulmão.

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Exames de imagem, como raio-X e tomografias, são usados para visualizar a extensão da doença. As partes esbranquiçadas que aparecem nesses exames, chamadas de vidro fosco, indicam o quanto a reação daquele organismo diante do Sars-CoV-2 pode ter afetado a respiração do paciente.

Sabe-se hoje que, uma vez que o coronavírus invade as células do pulmão, o sistema imunológico de algumas pessoas pode reagir de forma exagerada, produzindo uma quantidade maior de citocinas – moléculas que sinalizam o perigo, recrutam outras células de defesa e montam uma resposta inflamatória ao vírus.

Cada resposta inflamatória gera um acúmulo de líquidos e, nos alvéolos pulmonares – que são estruturas finas e flexíveis –, isso os torna mais espessos e menos flexíveis, atrapalhando as trocas do gás carbônico pelo oxigênio e formando o "vidro fosco". Assim, a respiração é comprometida.

"O paciente com a Covid-19 é aquele que busca pelo ar, mas é como se não tivesse ar disponível, porque o pulmão está tão inflamado que o ar não entra de forma suficiente para todas as áreas. O ar não chega aonde deveria porque tem uma lesão no pulmão que impede a passagem", explica Flávia Makoski Ciescilivski, fisioterapeuta da Rede Prófisio, atuante no hospital Marcelino Champagnat, em Curitiba, que vem atendendo pacientes com Covid-19.

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Inspira e expira

Com o pulmão comprometido, a pessoa aumenta o número de inspirações e expirações por minuto, sem que a mesma quantidade de ar entre. "Em vez de fazer 16 frequências respiratórias por minuto, a doença impede que essas entradas e saídas levem os 500 mL de ar. Começam a levar 400 e, para compensar, o paciente faz 20 frequências. Isso vai aumentando até 32 frequências por minuto, que é o padrão para a Covid-19", explica a fisioterapeuta.

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Há casos de pacientes que não sentem a mesma falta de ar, embora estejam com um dano significativo no pulmão. De acordo com Roberta De Santis Santiago, médica pneumologista, doutora em Ciências da Pneumologia pela Universidade de São Paulo, essa é uma questão ainda em aberto e sem conclusões, por enquanto.

"Alguns casos têm tido essa apresentação, de não ter sintomas respiratórios tão evidentes, mas ainda está em discussão o quanto essa hipoxemia [baixo nível de oxigênio no sangue] apresenta sintomas ou não. Em geral, as pessoas têm tido a falta de ar, além da tosse, aumento da sensação de fraqueza, febre, e a perda do olfato e paladar", explica a especialista, que também é fellow em Pesquisa Clínica no Massachusetts General Hospital, na cidade de Boston, nos Estados Unidos.

50% comprometido

Além de estimar a gravidade da Covid-19, os exames de imagem também dão indícios de quão rápida pode ser a recuperação daquele paciente. "Uma área comprometida de 25% ou 30% indica uma recuperação melhor ou mais rápida. Se a pessoa passa de 30% para 50%, o pulmão está mais comprometido", orienta a médica pneumologista.

O paciente com 50% de lesão acende um alerta nos profissionais da fisioterapia das UTIs, porque ele está trabalhando dobrado para se manter, segundo explica a fisioterapeuta Flávia Ciescilivski. "Ele precisa de repouso para não agravar. Em alguns casos, pode aumentar a gravidade e o pulmão ficar mais comprometido, ou pode ser que fique estagnado nos 50%. Pode ser também que regrida ao quadro de melhora."

De acordo com a médica pneumologista, o período entre o 5º e o 7º dia do início dos sintomas é um marco importante para observar se eles se dissipam, ou se há uma piora no estado geral daquela pessoa. "Se chegar ao sétimo dia e tiver sinais de que não está melhorando, mas piorando nos sintomas, é importante avaliar", destaca.

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Danos permanentes?

Se a lesão causada pela Covid-19 será temporária ou permanente, ainda é preciso mais tempo para responder a essa questão, de acordo com Irinei Melek, médico pneumologista, presidente da Associação Paranaense de Pneumologia e Tisiologia e preceptor de Pneumologia e intensivista do hospital Angelina Caron.

"O que estamos vendo nos consultórios são pacientes com a queixa de um cansaço persistente que pode ser da falta de ar ou da dor no corpo, mas que precisa ser avaliado. Cerca de 80% dos casos é comprometimento do pulmão, mas 20% pode estar relacionado ao coração, à perda de músculo, comum em pessoas que passaram tempo internadas. Uma porcentagem pequena, em torno de 2%, é de comprometimento definitivo", detalha.

As lesões pulmonares definitivas são conhecidas, no meio médico, como fibroses. Segundo explica a pneumologista Roberta Santiago, a inflamação no pulmão pode ser tão grave que, em algumas áreas, o órgão chega a cicatrizar. "Quando vira a cicatrização, o tecido pulmonar não é mais tão eficiente quanto antes, e isso pode levar a um comprometimento permanente".

A gravidade da Covid-19 é um dos fatores para as fibroses, mas também doenças prévias, o tempo em tratamento, o uso de ventilação mecânica, etc. "Eu gosto de comparar com uma perna quebrada. Às vezes a gente quebra e coloca gesso ou faz cirurgia e recupera completamente. Mas às vezes acontece uma cicatrização exagerada ou o osso não fica do mesmo jeito, e a pessoa tem uma dor crônica. O pulmão pode tanto recuperar rápido quanto ficar com a fibrose."

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Recuperação

Além da lesão física, a fisioterapeuta Flávia Ciescilivski ressalta o impacto funcional que o comprometimento do pulmão acarreta. "Para dizer que o pulmão tem recuperação, é preciso acompanhar esse paciente no mínimo um ano, com testes específicos. Quando se fala em 70%, 50% de comprometimento, isso é o exame de imagem, mas em capacidade respiratória é uma pessoa que não consegue lavar três pratos ou ficar em pé por cinco minutos porque sente fadiga, falta de ar, como se tivesse feito uma semana de academia", explica.

Hoje se espera que, assim que o paciente sair da fase mais aguda da doença, ele apresente uma melhora progressiva nos dois meses seguintes. Mas é comum, no entanto, pessoas que, mesmo após quatro meses, não consigam subir uma escada como faziam antes.

Do paciente que teve uma doença leve ao que precisou de ventilação mecânica, todos podem precisar dos exercícios de reabilitação, segundo Ciescilivski. "Tem paciente que precisa fazer todos os dias, outro três vezes na semana e outro só uma vez na semana. No caso de uma doença moderada, um paciente que teve 40% a 60% de comprometimento do pulmão e não precisou fazer uso da ventilação mecânica, ele está apto depois de um mês, 45 ou 60 dias", calcula.