Um quinto dos pacientes diagnosticados com a Covid-19 e atendidos em um hospital na Itália apresentou, além dos sintomas mais conhecidos da infecção pelo novo coronavírus, manchas e lesões na pele. Especialistas discutem agora se esse poderia ser um novo sinal da doença.
De início, os únicos três sintomas associados à Covid-19 eram febre, tosse seca e falta de ar. Cinco meses depois dos primeiros casos, o Centro para Controle de Doenças norte-americano (CDC) aumentou a lista dos sinais aos quais os profissionais de saúde deveriam ficar atentos, incluindo dores musculares, tremores, dores de cabeça e garganta, além da perda do olfato e do paladar.
Esses sinais foram adicionados depois de um aumento no relato dos médicos que estão na linha de frente dos cuidados. O mesmo poderia acontecer com os sinais dermatológicos, mas por enquanto poucos casos foram registrados e sem uma associação clara com a doença.
"Quando se busca por manifestação específica na pele, na Covid-19, você encontra um número muito pequeno de trabalhos, no máximo uns 20 artigos. Muitos sem fotografias e alguns poucos fazem a biópsia da pele para comprovar", explica Paulo Ricardo Criado, médico dermatologista, coordenador do departamento de Medicina Interna da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) e professor do Centro Universitário Saúde ABC.
Sinais do inverno?
O inverno no hemisfério Norte, e as baixas temperaturas, podem ser uma das explicações para algumas pessoas terem desenvolvido as manchas na pele, de acordo com o dermatologista. "Há várias alterações que podem ocorrer por exposição ao frio. O chamado livedo reticular é uma delas. São manchas que lembram uma rede de pescador sob a pele, azuladas, e são muito comuns com o frio", sugere Criado.
Quando a pele é exposta às baixas temperaturas, as veias acabam dilatando, enquanto as artérias se contraem, para que a pessoa não perca o calor do sangue. Nesse processo de contrair e dilatar, surgem as manchas. "Alguns casos relatam o que tem sido chamado de 'dedos da Covid', que deixam a ponta dos dedos azuladas ou avermelhadas. Essa doença, que estão associando à Covid-19, se chama eritema pérnio, ou perniose, e também ocorre muito no inverno, pelo frio. Pode ocorrer em pessoas sem doença nenhuma de base, mas com uma sensibilidade das extremidades. Pode surgir nos dedos das mãos, pés, nariz e orelhas", explica o médico.
Outra hipótese levantada pelo dermatologista para justificar a falta de mais relatos das manchas na pele seria uma ausência desse especialista na linha de frente do combate à Covid-19. "Pode ser o fato de nós estarmos atendendo menos pacientes, principalmente nos países que adotaram o confinamento. E os médicos que estão com os pacientes internados, são tantas complicações que o problema de pele passa sem registro", sugere Criado.
Coronavírus poderia causar lesões na pele
Teoricamente, sim. O receptor que o vírus utiliza para entrar na célula humana, chamado de ECA 2 (enzima conversora de angiotensina 2), está presente nos pulmões, rins e também nos vasos sanguíneos da pele, na camada da epiderme.
"Como existe esse receptor na pele, que é a chave para o vírus entrar nas células, em teoria poderíamos ter manifestações dermatológicas da Covid-19 sim. Mas estamos chegando a quase 3 milhões de pessoas infectadas pelo mundo e são raros os relatos desse tipo", explica o médico Paulo Ricardo Criado.
Se houver uma associação entre os sinais e o coronavírus, ele não será o primeiro vírus a apresentar sintomas dermatológicos, segundo lembra a médica dermatologista Francine Belinetti, professora da PUC, em Londrina. "Qualquer virose pode cursar com fenômenos imunológicos que geram manchas na pele", diz. Exemplo pode ser visto na dengue, que apresenta o chamado exantema, ou um rash cutâneo.
"Mas nenhuma lesão relatada para a Covid-19 é patognomônica, que podemos relacionar diretamente ao coronavírus ao vermos na pele. A doença é espectral, e cada pessoa responde de uma maneira. Algumas têm febre, outras quem um quadro respiratório mais exacerbado. O mesmo acontece na pele, pode ser a única manifestação da pessoa. É uma doença nova, nada é inesperado", reforça a médica.
Dos relatos até o momento registrados na Itália, Estados Unidos e Tailândia, as manchas tendem a aparecer principalmente na região do torso dos pacientes. Caso tivessem coceira, era leve, e as lesões tendiam a sarar em poucos dias. As manchas não estavam relacionadas à severidade da doença.