“Então, há quanto tempo você está doente?” Eu estava tossindo há semanas, lutando contra uma febre que chegava a 40°C, e tentando encontrar energia suficiente para cuidar dos meus dois filhos, de um e cinco anos. Mas foi preciso eu estar segurando a mão do meu filho mais velho, às duas da madrugada, no meio da sala de emergência pediátrica para que alguém notasse o quão doente eu estava – esse alguém sendo o pediatra de plantão. Depois de o médico ouvir o pulmão do meu filho, e pedir um raio-X do peito que mais tarde confirmou uma pneumonia, ele se virou para mim.
“Você está claramente muito doente”, ele disse. “Eu sei que você não quer deixar seu filho, então eu vou chamar alguém da sala de emergência dos adultos para vir e examiná-la.” Depois de um exame rápido do “médico de adulto” e um raio-X do meu peito, eu fui diagnosticada com bronquite severa e exaustão. Eu me senti envergonhada, especialmente porque eu deveria estar focando em meu filho e por ter me permitido ficar tão doente. Afinal, que tipo de mãe não consegue cuidar de si mesma?
A resposta, claro, é: a maioria das mães. Em um país como os Estados Unidos, sem licença maternidade paga e obrigatória, ou cuidado com a saúde infantil acessível, onde a maternidade e o martírio são geralmente vistos como pseudônimos, mais frequentemente do que não, as mães não cuidam de si mesmas. Nós ignoramos o pedido para colocarmos as máscaras de oxigênio primeiro em nós mesmas, e cuidamos das nossas crianças enquanto ofegamos por ar.
Como resultado, são as pessoas que nós confiamos a saúde dos nossos filhos que acabam percebendo que nós precisamos de cuidados também. “Eu não sei dizer nem quantas vezes eu percebo que algo está errado com a mãe”, diz Sara Siddiqui, pediatra e professora assistente clínica no departamento pediátrico do hospital infantil Hasselnfeld do centro médico Langone da Universidade de Nova York, que trata de crianças há mais de 20 anos.
“Em primeiro lugar, nós somos, em muitos casos, a primeira pessoa que elas veem depois de terem o bebê”. Siddiqui conta ter diagnosticado mães que chegaram ao consultório dois ou três dias depois do parto com os pés inchados ou dificuldade para respirar, que não tinham visto nenhum outro médico, além daquele examinando o recém-nascido.
“Uma mãe quase desmaiou no consultório enquanto eu examinava o bebê porque ela tinha tido uma cesárea e não percebeu que ainda estava muito fraca”, completa. Conforme as prioridades mudam após o nascimento – e as pessoas ao redor da mãe também focam mais no bebê do que nela – ela passa a se preocupar menos consiga mesma e mais na criança. E esse pensamento não muda conforme o crescimento da criança. Mas os pais, especialmente aqueles com crianças pequenas, estão mais susceptíveis a doenças.
Pesquisadores descobriram que uma criança menor de seis anos contrai, em média, seis a oito resfriados em um ano, e como o sistema imunológico ainda está em desenvolvimento, eles levam muito tempo para se recuperarem. Como os pais – especialmente as mães, que ainda são responsáveis pela maior parte dos cuidados da criança e têm menos horas de sono que os companheiros homens – estão cansados, é mais difícil para que os próprios sistemas imunológicos os protejam dos resfriados do filho.
Falhar em cuidar adequadamente de si mesmo, seja no período pós-parto ou, como eu, cinco anos depois de ter o primeiro filho, pode ter sérias consequências. “Especialmente nesse período do ano”, diz Siddiqui. “Quando eu examino um paciente e a mãe está tossindo, com dificuldades para completar as frases, isso significa que ela está com algum problema respiratório ou tem uma doença respiratória. Nestes casos, eu digo ‘Eu percebi que você também está tossindo’, ou ‘Eu percebi que você pode precisar de um inalador’, ou ‘Eu percebi que você pode precisar de um tratamento, então acho que é uma boa ideia se você buscar o seu médico, ou se você não tiver um, eu posso indica-la.’”
Mas não é apenas uma falta de sono, a compreensível mudança nas prioridades, as mudanças físicas intensas durante o período de pós-parto ou a miríade de micro-organismos que a criança parece atrair que faz com que a mãe fique, e permaneça, doente. É a dificuldade em tratar nós mesmas com o mesmo cuidado que oferecemos aos nosso filhos.
Pedir ajuda não é vergonha alguma
Mães são conhecidas por não pedirem por ajuda, um produto da nossa cultura de “faça tudo sozinha” que atrelou o valor de uma pessoa à sua habilidade em agir totalmente independente de outros. Mães, em particular, são julgadas pela sua capacidade de autossacrifício e desenvoltura, seja qual for o custo pessoal.
“Apesar de todos os avanços para a igualdade feminina desde a década de 1950, as icônicas mães daquela geração se mantêm profundamente intricadas na nossa cultura como uma imagem de maternidade ideal, no qual há o sacrifício pessoal em prol da família”, diz Carly Snyder, psiquiatra reprodutivo e perinatal da cidade de Nova York. “Em geral, as mulheres crescem com a suposição de que são cuidadoras e que qualquer ajuda adicional é demais. Isso acontece independentemente de ser um lar mais progressivo, com pais que dividem as tarefas da paternidade, ou não.”
Snyder diz que nós abraçamos – e mesmo celebramos – nosso martírio porque isso nos permite esconder o fato de que não podemos viver expectativas irrealistas. “Perfeição é o objetivo e, falando honestamente, o ‘eu não consigo’ ou ‘eu não quero fazer’ é algo que induz a ansiedade porque ameaça mostrar a nossa vulnerabilidade. Isso significa que nós não somos o ideal de mães que imaginamos ser, e isso é assustador.”
Assim, nós mães fazemos o que eu fiz: ignoramos as nossas necessidades em nome de uma suposta perfeição, mesmo quando isso literalmente nos deixa doentes. Ao sair da sala de emergência com meu filho dormindo em meus braços, e eu tossindo a cada passo e contando as horas para buscar o remédio na farmácia para não uma, mas duas pessoas, eu me cobrei mentalmente.
Como uma mãe que trabalha e cuida dos dois filhos quase sozinha, visto que o parceiro trabalha 12 horas por dia, 60 por semana, eu deveria saber mais. Como alguém que já passou por duas crises de depressão pós-parto, que já visitou a UTI pediátrica por um vírus respiratório quando o segundo filho tinha apenas três semanas de vida, além de incontáveis resfriados e gripes que não são tão incomuns quando você está cuidado de crianças pequenas, eu deveria saber mais.
“Mães precisam entender que nossas crianças precisam que nós estejamos saudáveis, mas nós somos humanos e às vezes nós também ficamos doentes”, explica Snyder. “Nós não podemos nos curar rapidamente ou completamente se não dermos aos nossos corpos uma chance para isso". Mas saber que eu preciso de ajuda não torna o pedido mais fácil. Saber que eu preciso ficar saudável para que eu possa cuidar de forma adequada dos meus filhos não deixa mais fácil priorizar minha própria saúde, mental e fisicamente.
Como mães, nós somos encorajadas a priorizar a saúde das crianças acima e em detrimento às nossas. Nós somos aclamadas como “melhores mães” se levamos correndo nossos filhos ao consultório do pediatra em um primeiro sinal de algo errado, enquanto passamos por cima das nossas próprias doenças. Somos saudadas como altruístas uma e outra vez até que cuidar menos de si é menos uma escolha e mais uma resposta padrão. Quando nossa função enquanto mãe não recebe agradecimentos, qualquer elogio – mesmo que exija prejuízo da nossa saúde física e mental – vale a pena.
Mas se encorajamos as mães a ajudarem umas as outras com a mesma frequência com que ajudam os filhos, se nós acreditarmos nas mães quando elas dizem estar doentes ou com dor, talvez não tenhamos a pior taxa de mortalidade materna entre os países desenvolvidos. Talvez uma quantidade menor de mães se sentiria isolada, sozinha e sobrecarregada. Talvez a maternidade, como diz Snyder, poderia “se tornar menos uma tarefa e muito mais alegre.”
E talvez eu não teria que depender da compaixão de um pediatra para me sentir vista, escutada e digna de cuidado médico adequado. “Se você estabelecer o mesmo tipo de relacionamento que tem com o pediatra, com o médico, eu acho que a saúde das mulheres avançaria”, diz Siddiqui. “Se fizéssemos mais cuidado preventivo para as mulheres como nós fazemos para as crianças, ajudariam” tanto as mães quanto as crianças.