Após passar oito anos sem ingerir carne, a advogada Lindsley Magda Arndt diz ter percebido diversos benefícios em sua saúde e que a dieta vegetariana seria ideal para sua família. “Minha pele ficou mais bonita, o intestino funcionou melhor, passei a ter mais disposição e a ficar menos doente”, relata a curitibana. Por isso, assim que descobriu sua primeira gravidez, conversou com o marido a respeito da alimentação que teriam em casa e, juntos, tomaram a decisão: “não ofereceríamos carne aos nossos filhos até que tivessem idade para decidir por eles”.
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Segundo a mãe, alguns amigos os criticaram, afirmando que a pequena Laís – hoje com 5 anos – teria deficiência de nutrientes e sentiria fraqueza. No entanto, Lindsley pesquisou bastante a respeito do assunto e, assim que a bebê estava pronta para unir a amamentação aos alimentos sólidos – a partir dos 6 meses de idade –, começou a oferecer algumas frutas e verduras, até chegar às leguminosas como grão de bico, lentilha, feijão e ervilha, para substituir a proteína da carne. “Fiz tudo de acordo com a fase em que ela estava, e sempre apresentei os alimentos com aspecto atrativo, simples e saboroso”, conta, ao comemorar o resultado.
“Não tive dificuldade para introduzir a dieta vegetariana, e vi minha filha crescer saudável, inteligente, disposta e com exames de sangue exemplares”, conta a advogada, que ofereceu o mesmo cardápio ao caçula no período de introdução alimentar. “Hoje o Caio tem 2 anos e só recusa comida quando está satisfeito, come até brócolis cru”, completa a mãe, orgulhosa. “Se eu der uma bacia com alface e rúcula temperadas com azeite, sal e limão, ele dá conta de tudo sozinho”.
De acordo com a nutricionista Thaisa Navolar, essa é a realidade de muitas famílias que optam pela alimentação vegetariana, e isso pode contribuir para a saúde das crianças em todas as fases da vida. “Isso porque elas tendem a consumir mais frutas, verduras e legumes, incentivando a formação de hábitos saudáveis no futuro”, comenta, ao pontuar que bons hábitos previnem sobrepeso, obesidade e doenças como diabetes tipo 2”.
Além disso, a especialista afirma que pais com alimentação vegana estrita ou que ingerem alguns produtos de origem animal – como ovos e laticínios – oferecem às crianças menor quantidade de gorduras saturadas, doces e salgadinhos. “E isso é um grande benefício na infância”, garante.
Pontos de atenção
Só que alguns cuidados são necessários para iniciar o contato do bebê com alimentos sólidos sem colocar carne no cardápio. De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), é importante que o pequeno continue recebendo aleitamento materno até 2 anos ou mais, e que sua mãe tenha uma dieta rica em ácidos graxos essenciais, folato, ferro, zinco e vitamina B12. "E, na impossibilidade de aleitamento, a opção são as fórmulas à base de proteína hidrolisada de arroz ou, para maiores de 6 meses, de proteína isolada de soja", informa a entidade, em nota. Em 2017 a SBP publicou um Guia Prático de Atualização sobre Vegetarianismo na infância e adolescência, onde assinala vários pontos de atenção aos quais pais e pediatras devem ficar de olho na hora de estabelecer esse tipo de dieta.
Além disso, a SBP recomenda que sejam oferecidas diferentes frutas, verduras e legumes ao longo do dia, e que eles sejam coloridos. Lembrando que, "muitas vezes, são necessários volumes maiores de determinado alimento para substituir a carne, leite e derivados", alerta a instituição, solicitando acompanhamento com um pediatra para garantir que o bebê está recebendo oferta suficiente de calorias, vitaminas e minerais.
No mais recente Guia Alimentar para crianças brasileiras até 2 anos, publicado pelo Ministério da Saúde, em 2019, é apontada a necessidade de atenção redobrada à escolha dos alimentos e à sua combinação, para garantir acesso a nutrientes, como ferro e cálcio, que atendam as necessidades das crianças e que previnam deficiências nutricionais. "É fundamental que a criança vegetariana, como qualquer outra criança, seja acompanhada por profissionais de saúde que monitorem seu crescimento e desenvolvimento, orientem sobre sua alimentação e sobre suplementação com vitaminas e minerais", cita o documento.
E como fazer a introdução alimentar sem carne?
Segundo a nutricionista Thaisa Navolar, é necessário que todos os grupos alimentares estejam presentes nas refeições. “Basicamente, o pratinho completo terá dois tipos de legumes como cenoura e brócolis, um cereal ou raiz, que pode ser o arroz, e mais uma leguminosa como a lentilha”, exemplifica. Para ver outras opções, é possível consultar o Guia Alimentar da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB), que apresenta várias sugestões para a introdução alimentar dos 6 aos 12 meses.
Nas primeiras semanas, por exemplo, é indicado o consumo de um alimento de cada vez, começando com legumes cozidos, depois com frutas, cereais e, por último, as leguminosas. "Mas sem rigidez de quantidade ou de horários, pois deve ser uma experiência leve e divertida para a família", orienta a especialista.
Aos poucos, o número de itens presentes em cada refeição aumentará até que sejam ingeridos alimentos de todos os grupos alimentares no almoço e no jantar. "Isso por volta do oitavo mês do bebê”, informa Thaisa, ao pontuar que o cozimento deve ser realizado sem sal durante todo o primeiro ano de vida. “O que pode ser feito é temperar a comidinha com ervas naturais que a família use”.
E a vitamina B12?
No entanto, mesmo se alimentando adequadamente, a nutricionista explica que a vitamina B12 precisará ser oferecida à criança vegetariana na forma de suplementação, pois essa vitamina está presente somente em produtos de origem animal. "Então, deve ser prescrita por um nutricionista ou pediatra”, pontua Thaisa, ao citar que quem ingere carne também pode apresentar essa necessidade. “É possível ter baixa absorção de vitamina B12 por inúmeras causas, e cada situação deve ser avaliada”, finaliza.