Filhos de pais alérgicos fatalmente terão alergia? Segundo o médico alergista José Carlison Santos de Oliveira, a resposta é “não necessariamente”. Apesar de existirem fatores genéticos que determinam quem pode ou não ter alergia, a condição é multifatorial e, por isso, apenas indica maior probabilidade.
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Segundo Oliveira, há estudos que indicam que quando um dos pais é alérgico, a possibilidade de seus filhos apresentarem tal problema pode ser de até 40%, porcentual que dobra quando ambos apresentam a doença. “Sendo assim pais alérgicos têm mais chances de terem filhos alérgicos, mas pais sem alergia alguma também podem ter filhos alérgicos”, diz ele, que é membro do Departamento Científico de Alergia Alimentar da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia.
Também não é possível afirmar que uma alergia é mais “transmitida” hereditariamente que outra, embora, diz o médico, em doenças alérgicas como asma, rinite e dermatite atópica, o determinante genético exerça fator mais importante do que em outras alergias, como as dermatites de contato.
Entre as maiores fake news que pacientes trazem à clínica sobre o tema, o médico cita as mais comuns: a de que a alergia alimentar é hereditária; que alergia e intolerância são a mesma doença; que a alergia alimentar dura a vida toda; que frutas e verduras não causam alergias; que a alergia alimentar só acontece na infância; que não comer alimentos alergênicos na gravidez previne alergia na criança; que quem é alérgico a um alimento tem que deixar de comer todos os outros alimentos que causam alergias; que quem tem alergia a ovo pode comer ovo frito ou cozido; e que quem tem alergia a camarão não pode comer peixe.
Veja mais mitos e verdades sobre o tema, a partir de informações do médico alergista:
Pais devem evitar dar ao filho o alimento causador de sua própria alergia?
Erro comum entre pais e até entre profissionais de saúde, mesmo quando a pessoa é muito alérgica a algum alimento ele deve ser introduzido regularmente na dieta do filho, bem como outros alimentos tidos como alergênicos. Também erra quem deixa de consumir um alimento na gestação pelo temor de que haja risco de que o bebê desenvolva alergia. As duas práticas podem levar a mais riscos de alergias futuras.
Alergias a frutos do mar são mais hereditárias?
Isso não é uma verdade. Não existem provas de que alergia a frutos do mar seja mais ou menos hereditária que outras alergias alimentares. Há um fator genético nas alergias alimentares, mas não uma transmissão hereditária. Cerca de 80% das manifestações de alergia alimentar ocorrem com leite de vaca, ovo, soja, trigo, amendoim, castanhas, peixes e crustáceos, mas qualquer alimento pode causar alergia. Não é necessário cuidado no primeiro consumo de algo, pois que é preciso um primeiro contato para que o sistema imune conheça aquele alimento e induza uma tolerância ou não. Não se tem alergia ao que não se conhece. As reações ocorrem após uma primeira exposição.
Como funcionam as alergias a frutos do mar?
Não há generalização: pode-se ter alergia a camarão e não se ter a ostras ou mexilhões. Isso também com os peixes: pode-se ter alergia a salmão e não se ter a bacalhau, e vice-versa. Porém, há proteínas presentes em vários tipos de frutos do mar e, quando se desenvolve alergia a elas, ela se estende a tudo aquilo que tem a proteína na sua estrutura. Isso quer dizer que quem tem alergia a camarão pode ter reação a caranguejo, siri ou lagosta, caso a alergia seja a uma proteína comum a todos.
Conservantes e corantes químicos agem como gatilhos de alergias?
Conservantes e corantes não fazem bem a ninguém, mas é difícil se manter afastado deles. Não há associação entre o consumo deles e o aparecimento ou aumento de alergias na infância. Alergias a eles são raras e quase sempre existe outra causa não diagnosticada que é erroneamente confundida com o corante como agente causador. Porém, um dos corantes mais implicados em alergias é, sem dúvida, a tartrazina (amarelo), que felizmente já não é tão usado na indústria atual, mas há relatos esporádicos de reações com o corante vermelho carmim, glutamato monossódico, nitratos, benzoatos, parabenzoicos, sulfitos, butil-hidroxi-anisol (BHA) e butil-hidroxi-tolueno (BHT).
Como a microbiota intestinal influencia no desenvolvimento de alergias?
Ela influencia diversos sistemas orgânicos e estudos sugerem evidências de sua ação na maturação do sistema imunológico, podendo tanto prevenir quanto estimular o aparecimento das alergias. Especula-se que crianças expostas a uma grande diversidade de estímulos teriam proteção ao desenvolvimento de alergia maior do que as que não são expostas. Há também uma forte associação da degradação ambiental com o aumento exponencial das doenças alérgicas no mundo. Isso está inteiramente associado à exposição, desde a primeira infância, a um ambiente mais diverso e acesso a alimentos mais naturais e menos processados. Todos esses aspectos favorecem ou não a uma composição da microbiota intestinal que vai influenciar diretamente no aparecimento ou no agravamento das doenças alérgicas.
O uso excessivo de antibióticos por crianças pode predispor a alergias?
Esse é um tema controverso, mas o certo é que o consumo excessivo desses medicamentos pode levar a vários distúrbios importantes, inclusive no sistema digestório e imunológico. Antibióticos são medicações necessárias para tratamento de várias doenças infecciosas graves e salvam milhões de pessoas o tempo todo. Porém, eles não discriminam microorganismos protetores (simbiontes) daqueles patogênicos, matando bactérias boas e más, podendo causar um desequilíbrio na microbiota, que chamamos de disbiose. Como uma função de nossa flora que reside naturalmente é moldar a resposta imunológica, não é de surpreender que a composição alterada da microbiota esteja ligada a doenças mediadas por imunidade, incluindo doenças alérgicas.
Frutas também são causadoras de alergias em crianças? Quais seriam as mais comuns?
Frutas podem e causam alergias tanto em crianças quanto em adultos. Os adultos são menos afetados que as crianças e a prevalências das alergias a frutas parece estar aumentando em todo o mundo. Existe uma conhecida reatividade cruzada entre o látex e algumas frutas. Entre 30% e 50% dos alérgicos ao látex apresentam reatividade clínica a algumas frutas, mas somente cerca de 10% dos pacientes que apresentam reações a frutas desenvolverão alergia ao látex. As frutas mais classicamente relacionadas à síndrome látex-fruta são: banana, abacate, maracujá, papaia e kiwi, mas um número crescente de alimentos tem adentrado esta lista, com destaque à mandioca, de grande consumo regional. As alergias a frutas ainda necessitam de mais estudos ou evidências e, embora haja uma tendência a rotular algumas frutas como mais alergênicas que outras, a exemplo do morango, abacaxi e kiwi, este dado não existe ainda como comprovação científica.
Quais são as alergias cruzadas mais vistas na clínica e que vale prestar atenção?
As reações cruzadas ocorrem quando uma proteína alimentar é encontrada em alimentos (fontes) diferentes. Essa proteínas chamamos pan-alérgenos. Tropomiosina do camarão ou profilinas de plantas são exemplos de proteínas que podem levar a reatividade cruzada. Uma das reatividades cruzadas mais difundidas é a que ocorre na Síndrome Látex-frutas. Desde que entendemos que uma proteína pode ser encontrada em fontes diversas ficou mais assertivo avaliar essas reações que podem acontecer entre os diversos alimentos. O leite de vaca é um dos principais causadores de alergias alimentares em todo o mundo e os pacientes alérgicos apresentam elevada reatividade cruzada a leites de outros mamíferos, com destaque para cabra, ovelha e búfala, não podendo haver substituições entre esses tipos de leites. Pacientes alérgicos a proteínas de ovo de galinha reagem à clara de ovo de outras aves.