A radioterapia, a quimioterapia e a cirurgia foram apenas uma parte do tratamento que Cristina Aquino adotou contra o câncer de mama. Os exercícios físicos é que completaram a batalha, e garantiram que a personal trainer, hoje com 46 anos, tivesse uma recuperação bem mais rápida que o normal.
"Foi o diferencial. Eu já tinha histórico de fazer exercícios físicos e a minha recuperação foi mais rápida que a da média das pessoas. Como eu era da área, estudei a fundo como funcionava a cirurgia, quais musculaturas eu poderia fortalecer e fiz fisioterapia assim que fui liberada. Hoje, não tenho sequela alguma e meu estado geral é bom", explica a personal trainer, que desenvolveu um programa de treinamento voltado a mulheres que passam pelo câncer de mama.
Mas muito além da questão física, os exercícios também tiveram um impacto emocional para Cristina. "Os estudos mostram uma melhora na função e na qualidade de vida, em reduzir os níveis de depressão. Realmente, é uma perda, uma dilaceração muito grande. Você não sabe como vai sair, e se vai sair daquilo. Por isso tantas mulheres têm problemas psicológicos durante o tratamento, e o exercício ajuda nisso", reforça ela.
Os mesmos benefícios foram identificados pela Soraia Cruz. Quando recebeu o diagnóstico de câncer de mama há cinco anos e meio, a aposentada de 60 anos não era muito adepta da academia. "Antes, eu era mais sedentária e não gostava, inclusive, de academia e de exercícios. Não ia todos os dias. Hoje eu vou de segunda a domingo, seja à academia, seja ao parque nos finais de semana."
Por insistência do médico, marido e filho, Soraia decidiu dar uma chance aos exercícios e, tão logo recebeu a liberação da equipe médica, passou a caminhar na esteira. "No começo eu não podia pegar peso com o braço, mas podia caminhar e fazer exercícios para a perna. Fui fazendo aos poucos e hoje faço tudo o que eu quero. Eu adoro spinning e tem aulas da academia que eu adoro também. Você sai exausta, mas satisfeita e feliz", incentiva a aposentada.
Exercício também é remédio
Diante dos benefícios, adotar os exercícios físicos como parte essencial do tratamento oncológico se tornou uma bandeira dos especialistas. Uma coalizão global, encabeçada pelo Colégio norte-americano de Medicina Esportiva, atualizou recentemente as diretrizes para incluir os exercícios tanto na prevenção quanto como parte do tratamento, para agir contra a fadiga, a ansiedade e a depressão, além de melhorar a qualidade de vida do paciente.
Embora os exercícios físicos sejam objeto de estudos clínicos associados ao câncer há anos, e sobrem argumentos indicando a prescrição dos mesmos, ainda são poucos os pacientes fisicamente ativos. De acordo com um estudo divulgado no início de outubro pelo "Cancer Journal for Clinicians", a maioria das pessoas em tratamento oncológico, ou mesmo depois da recuperação, é considerada sedentária.
Para o cirurgião oncológico Gustavo Guimarães, ainda há muita desinformação e medo tanto por parte do paciente, quanto do médico, que acaba não prescrevendo a atividade física. "As evidências de que os exercícios sejam, sim, um remédio, são recentes. Não está na prática rotineira do médico perguntar ao paciente sobre qual exercício ele faz, e deveria fazer parte. Se você questiona repetidamente o paciente, ele vai entender que é algo importante e vai querer trazer essa mudança em uma próxima consulta. É um reforço positivo", sugere o médico, que é diretor do Instituto de Urologia, Oncologia e Cirurgia Robótica (IUCR) e coordenador geral dos Departamentos Cirúrgicos Oncológicos do grupo Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Sistema imunológico reforçado
Além de benefícios ao sistema cardiovascular e respiratório, pacientes oncológicos ganham um benefício muito mais importante quando passam da vida sedentária à ativa. O sistema imunológico é reforçado, garantindo que o organismo esteja mais preparado para o combate à doença.
"Sabemos que os imunoterápicos [medicamentos de imunoterapia contra o câncer] ‘apresentam’ a célula do câncer ao sistema imunológico, mas esse sistema precisa estar forte para combater a doença. Os exercícios garantem isso e também diminuem os radicais livres, que são danosos ao DNA, prevenindo o surgimento do câncer. Também diminui a ansiedade, depressão, fadiga, que são efeitos do tratamento contra a doença. As vantagens são múltiplas", completa o cirurgião oncológico Gustavo Guimarães.
Em quem está pensando em prevenir o câncer, também vale uma ida à academia. Um dos principais fatores associados ao surgimento da doença é a obesidade, e o controle de peso favorece essa manutenção, além de outras doenças crônicas, como diabete e hipertensão.
"Quando se fala em câncer, a obesidade e inatividade física estão relacionadas ao aumento na incidência de alguns tipos, como mama, colo, próstata, esôfago, estômago, endométrio, bexiga, rim, ovário, pâncreas e pulmão", reforça o especialista.
Quantidade importa
Conforme João Soares Nunes, médico oncologista clínico do hospital Erasto Gaertner, de Curitiba, a maioria dos estudos clínicos que associam os exercícios físicos ao câncer reforça a intensidade moderada para os resultados esperados.
"A American Cancer Society tem uma recomendação, há quase 10 anos, do ponto de vista de prevenção do câncer, que é fazer 150 minutos por semana de atividade físico. Nessa recomendação, a distribuição é de cinco fases de 30 minutos, com três aeróbicos e dois de musculação, conforme a conveniência do paciente. Os exercícios aeróbicos e de musculação complementam um ao outro", explica o médico.