Crianças infectadas podem ter o coronavírus em quantidades detectáveis no corpo e liberar o vírus por até três semanas, mesmo que nunca tenham apresentado sintomas. É o que indica um estudo publicado no fim de agosto pela revista científica Jama Pediatrics, que aumenta as evidências de que crianças podem ter um papel maior na transmissão de Covid-19 do que se estimava – embora a presença de vírus não signifique necessariamente que uma pessoa possa transmiti-lo.
A investigação avaliou a carga viral e os sintomas de 91 crianças em 22 hospitais da Coreia do Sul e constatou também que a duração dos sintomas, quando ocorrem, "variou amplamente", de três dias a quase três semanas. Estudo anterior havia apontado que crianças têm alta carga viral e podem ser mais infecciosas do que adultos.
Houve ainda uma diferença considerável quanto ao tempo pelo qual as crianças continuam liberando o vírus, indica, na revista, um comunicado de pesquisadores do Children's National Hospital, de Washington. Enquanto o vírus foi detectado em uma média de cerca de duas semanas e meia em todo o grupo, um quinto dos assintomáticos e metade dos sintomáticos estavam com o vírus por quase três semanas.
O trabalho foi realizado entre fevereiro e março, com menores de 19 anos, em 22 hospitais. Por volta de 22% dos pacientes nunca desenvolveram sintomas, e 58% foram sintomáticos já no teste inicial. Um em cada quatro pacientes apresentaram sintomas após o diagnóstico, em alguns casos até 25 dias depois.
As crianças, com ou sem sintomas, tinham carga viral detectável por uma média de 17 dias, e algumas delas por 21 dias ou mais.
Testagem de crianças
No comentário que analisa os dados do estudo, Roberta DeBiasi e Meghan Delaney, médicas do Children's National Hospital dizem que os achados ressaltam a necessidade de ampla testagem entre as crianças. Segundo elas, os resultados do estudo mostram que, se apenas as crianças com sintomas fossem testadas, 85 crianças (93% do grupo) não teriam sido diagnosticadas.
As especialistas dizem que algumas questões ainda precisam ser investigadas. A detecção do vírus por testes com swab (um tipo de cotonete) no nariz não indica necessariamente que o paciente esteja transmitindo o vírus. "Métodos de detecção molecular sensível podem detectar vírus viáveis e infectantes, mas também vírus inviáveis ou fragmentos de RNA sem capacidade de transmissão", dizem.
O médico Calum Semple, pesquisador de saúde infantil e epidemias na Universidade de Liverpool (Reino Unido), concorda com esses comentários. "A presença de material genético do vírus [coletado por] swabs no trato respiratório não necessariamente se equipara à transmissão, especialmente em pessoas que não têm sintomas importantes como tosse e espirros", disse o especialista ao Science Media Centre.
Transmissão de Covid-19 por assintomáticos e por crianças
O papel dos assintomático na transmissão do novo coronavírus tem sido motivo de debates. Os riscos existem, como alertam estudos anteriores.
Uma das explicações para o caso de pessoas infectadas pelo Sars-CoV-2 que não apresentam sintomas é uma resposta imunológica mais fraca ao vírus, sugere um estudo publicado em junho pela Nature.
O papel das crianças na transmissão do coronavírus, especialmente das assintomáticas, tem sido levado em conta na discussão sobre como reabrir escolas com segurança durante a pandemia.
Um estudo francês publicado em junho indicava que as crianças transmitem menos o novo coronavírus para adultos e outras crianças. A questão ainda está sendo investigada, e estudos mais recentes apontam que os menores têm um papel maior na transmissão de Covid-19 do que se acreditava inicialmente.
As crianças têm sido menos afetadas por infecções dos coronavírus, mas uma síndrome rara associada à Covid-19 que pode causar sintomas graves tem sido diagnosticada em crianças.
Casos da Síndrome Multissistêmica Inflamatória Pediátrica (SMIP) foram registrados em crianças no Brasil. Sintomas se assemelham a outras condições, como a doença de Kawasaki e o choque tóxico.