Uma série de estudos clínicos internacionais publicados nesta quarta-feira (2) mostram que medicamentos corticoesteroides, como a dexametasona, podem reduzir o número de mortes de pacientes em estado grave de Covid-19.
Os esteroides são medicamentos baratos e amplamente disponíveis, que agem como anti-inflamatórios. O uso de um desses medicamentos, a dexametasona, já havia sido recomendado em junho para o tratamento de pessoas hospitalizadas que precisam de ventilação mecânica ou de oxigênio.
Com base nessas e em evidências anteriores, a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou novas orientações de tratamento, recomendando fortemente que esses medicamentos sejam usados pelos médicos para combater as formas mais severas da infecção.
Entre os quatro artigos publicados nesta quarta-feira (2) no Journal of the American Medical Association (Jama) está uma meta-análise, coordenada pela OMS, que avaliou sete estudos clínicos controlados e randomizados com três corticoesteroides que envolveram 1.703 pacientes que foram tratados em cinco continentes. Os estudos avaliaram três medicamentos dessa classe: dexametasona, hidrocortisona e metilprednisona.
Os pesquisadores concluíram com essa revisão que o uso de corticoesteroides foi associado à redução de mortalidade de pacientes críticos em 20%, em comparação a pacientes que receberam o tratamento usual e placebo. Os dados mostram ainda que a hidrocortisona teve benefícios similares aos da dexametasona.
"Os métodos dessa análise seguem os mais altos padrões", avaliou Stephen Evans, professor de Farmacoepidemiologia na London School of Hygiene & Tropical Medicine. "Os ensaios incluídos na análise também são de alto padrão, com 'baixo risco de viés'", disse Evans à imprensa pelo Science Media Centre.
Os pacientes foram divididos da seguinte maneira:
- 678 pacientes receberam corticoesteroides. Desses, 222 morreram em período de 28 dias
- 1025 pacientes receberam tratamento usual ou placebo. Desses, 425 morreram em período de 28 dias
Seis dos estudos analisados relataram efeitos adversos graves entre os pacientes:
- 64 eventos adversos ocorreram entre 354 pacientes que receberam corticoesteroides
- 80 eventos adversos ocorreram entre 342 pacientes que receberam tratamento usual ou placebo
A dexametasona foi o primeiro medicamento a mostrar resultados positivos para pacientes de Covid-19 em estado grave, quando os resultados iniciais do estudo britânico Recovery foram publicados em junho.
Os três novos estudos clínicos publicados no Jama nesta quarta-feira avaliaram o uso de medicamentos da família dos corticoesteroides em pacientes internados em diversos países. Um deles examinou a dexametasona em 299 pacientes no Brasil; um estudo francês investigou doses baixas de hidrocortisona em 76 pacientes em comparação a 73 que receberam placebo; e o outro analisou a hidrocortisona em 379 pacientes em oito países.
Depois da divulgação dos resultados do Recovery, alguns ensaios clínicos com os esteroides foram suspensos, já que os médicos consideraram que não seria ideal tratar pacientes com placebo enquanto o tratamento com esses medicamentos indicava ser eficaz.
Dexametasona pode piorar quadro se utilizada no início dos sintomas
A dexametasona é um medicamento corticoesteroide, que atua reduzindo as inflamações do organismo. Como a Covid-19 tem por característica a inflamação do pulmão, do coração, entre outros órgãos, a substância atuaria contra esse sintoma, facilitando a recuperação nos casos graves.
Mas os especialistas reforçam o alerta de que o medicamento só tem efeito em pacientes internados, que precisam de suporte respiratório. Caso seja administrada em pacientes sem sintomas graves, ou sem uma inflamação sistêmica, além de não ter qualquer efeito contra o novo coronavírus, há o risco de a medicação piorar o quadro de infecção.
Isso acontece porque um dos efeitos colaterais da dexametasona é uma imunossupressão, ou a redução do sistema imunológico – visto que o objetivo do medicamento é conter uma inflamação desenfreada, atiçada pela defesa do organismo. Uma vez tomada a medicação em um momento de início dos sintomas, em vez de o corpo continuar atuando sozinho contra o agente infeccioso, a defesa é baixada e abre-se o caminho para uma maior replicação viral.