Pesquisadores calculam que mais de 740 mil novos casos de câncer estejam associados ao consumo de bebida alcoólica no mundo.| Foto: Bigstock
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O papel do cigarro no surgimento de um câncer já é bastante conhecido pela população, mas ele não está sozinho. O consumo de bebidas alcoólicas – mesmo que em poucas doses – também é responsável pelo desenvolvimento da doença.

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Pesquisadores na França, Nigéria, Canadá e Holanda calculam que, em 2020, 4,1% de todos os novos diagnósticos de câncer no mundo podem ser atribuídos ao consumo alcoólico. Isso representa 741.300 casos da doença.

A maioria (76% ou 568 mil) ocorreu em homens e os tipos de cânceres mais associados às bebidas foram:

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  • Esôfago (189 mil);
  • Fígado (154 mil);
  • Mama (98 mil).

Os resultados da pesquisa foram publicados na revista científica Lancet Oncology, no início de julho.

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Álcool e câncer: o que explica?

Há alguns caminhos biológicos que explicam como o consumo de bebidas alcoólicas poderia levar ao desenvolvimento de um câncer, de acordo com os pesquisadores. Uma delas é via o acetaldeído, formado pela quebra do etanol, ou álcool.

Conhecido metabólito carcinogênico, o acetaldeído gera alterações no DNA e interfere na habilidade de as células se recuperarem. O álcool também aumenta os níveis hormonais, como o androgênio e o estrogênio – e isso explicaria o impacto no câncer de mama entre as mulheres.

Como os hormônios incentivam o crescimento e multiplicação das células, há mais riscos de desenvolvimento do câncer. Tumores nada mais são do que um crescimento e reprodução descontrolado de células.

Ainda, o álcool é capaz de reduzir a habilidade do corpo em absorver certos nutrientes que são protetores contra o câncer, como as vitaminas A, C, D e E, além do ácido fólico. "O etanol pode também promover o desenvolvimento do câncer de forma indireta ao agir como solvente para outros agentes carcinogênicos, como as substâncias químicas do tabaco", explicam os autores no artigo publicado.

Segundo Maria Ignez Braghiroli, médica oncologista clínica e diretora da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, embora o consumo alcoólico esteja associado a outros comportamentos de risco para o câncer, como o cigarro, é preciso levar em consideração a culpa que ele mesmo carrega. "Se olhar o caso da cirrose, que é uma inflamação contínua do fígado, quando a causa é o álcool, o consumo leva à inflamação e ao desenvolvimento do câncer", explica.

"Esse não é o único estudo que mostra isso. Nos últimos 10 anos, pelo menos dois ou três estudos tentaram fazer essa correlação, e estimaram qual seria o percentual dos tumores associados ao álcool. Uns até com percentuais maiores, de 5%", completa a especialista.

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Quantidade importa?

Segundo a pesquisa, sim. Quanto maior for o consumo de bebidas alcoólicas, maior o risco da doença e, para chegar a esses resultados, os pesquisadores analisaram três grupos de dados: a estimativa global de consumo alcoólico; riscos do álcool para cânceres específicos e a estimativa da incidência global de câncer em 2020.

Com os dados em mãos, foram calculadas as contribuições de três quantidades de consumo:

  • Moderado: menor que 20g por dia, equivalente a até duas doses;
  • Arriscado: entre 20g a 60g por dia, equivalente a duas a seis doses;
  • Pesado: acima de 60g por dia, equivalente a mais de seis doses;
  • Incremento: Eles também calcularam a contribuição de beber 10g a mais todos os dias.

De acordo com dados do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA), uma dose padrão (14g de álcool puro) representa:

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  • 350 mL de cerveja;
  • 150 mL de vinho;
  • 45 mL de destilados.

"O maior fardo de cânceres atribuíveis ao álcool foi representado pelo consumo pesado (346.400 casos) e consumo arriscado (291.800 casos), enquanto que o consumo moderado contribuiu com 103.100 casos, e beber até 10g por dia contribuiu com 41.300 casos", destacam os pesquisadores.

"É difícil falar em consumo saudável de álcool, inclusive não é o que o estudo nos mostra. Ele mostra que um consumo pesado foi responsável por grande parte dos tumores. Mas, mesmo o consumo leve, até 10g por dia, que é um uso pequeno, ainda assim teve um percentual associado a isso", explica a médica.

Segundo Braghiroli, é preciso lembrar que cada organismo tem uma sensibilidade diferente ao álcool, e uma quantidade que possa ser menos arriscada para uma pessoa, pode ser demais para outra. "Quem tem cirrose, seja qual for a causa, se pelos vírus da hepatite C ou B, ou até da obesidade, não tem consumo de álcool que seja seguro. Todo consumo é de risco", destaca.