Visão, olfato, audição, paladar e tato. Estes são os cincos sentidos que fazem parte do sistema sensorial do corpo humano e são fundamentais para a formação de conexões do cérebro. Neste contexto, o tato tem um papel diferenciado e faz parte do conceito de memória afetiva.
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De acordo com o neurologista infantil Antônio Carlos de Farias, do Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba, as crianças que são mais tocadas, beijadas e abraçadas, têm a tendência a formar um número maior de conexões cerebrais, principalmente no período de 0 a 2 anos. Durante este período, chamado de sensório-motor, a velocidade do desenvolvimento é mais rápida do que em qualquer outra fase da vida.
Isso acontece, porque todas as conexões construídas neste momento formarão a base de sustentação para os próximos aprendizados, além de serem importantes para sua saúde e comportamento. Ana Elizabeth Luz Guerra, psicóloga do Centro Internacional de Análise Relacional (CIAR), afirma que o afeto por meio do toque já é transmitido desde quando o bebê está na barriga da mãe. “É fundamental ter cuidado na maneira como o ventre de uma grávida é tocado, pois é ali que se inicia o investimento na formação de um futuro adulto mais tranquilo e saudável psiquicamente”.
Após o nascimento, os estímulos são ainda mais importantes para o estabelecimento das relações sociais. Sem a proteção do útero, o recém-nascido precisa do calor do corpo dos pais para se sentir menos desprotegido e a amamentação tem um papel importante. “É um período muito crucial. O bebê, por exemplo, tem muita estimulação sensorial da boca, o contato face a face, o toque da mãe”, comenta Farias. “Todo o estímulo que acontece nessa fase tem relação direta com a formação dessas conexões no cérebro, que, a grosso modo, colabora muito com a inteligência global no futuro”, ressalta.
O neurologista observa, ainda, que a privação do estímulo sensorial causa prejuízos significativos no desenvolvimento, especialmente antes do primeiro ano, como regressões de linguagem, regressão autista, problemas de comunicação, transtornos comportamentais, ansiedade e fobias.
Sensações geradas pelo toque constituem a memória corporal
A psicóloga Ana Elizabeth assegura que o toque afetivo fica registrado na criança. Seu corpo depende e se modifica em função dessa rede de trocas, que inclui o olhar e as palavras. Suprir suas necessidades afetivas favorece o estabelecimento de vínculos, o sentimento de pertencimento, a construção da identidade corporal, do psiquismo, do pensamento e da linguagem.
Esses cuidados, segundo ela, geram sensações de prazer e desprazer que constituem a memória corporal do sujeito. “Quando acontece com ternura e afeto, a criança tende a se organizar psiquicamente de forma mais saudável e sedimentará experiências positivas em relação ao outro e ao mundo. Se for desagradável, invasivo ou agressivo, marca profundamente o psiquismo infantil de maneira negativa e, consequentemente, influencia o adulto que um dia ela será”, destaca.
E Farias salienta que a reação das crianças ao toque de pessoas próximas diz muito sobre o ambiente no qual ela está inserida – se é acolhedor ou hostil. Numa consulta médica é possível observar se o toque do cuidador acalma ou provoca agitação, fobia ou irritação. Desta forma, é possível identificar o adulto agressor no caso de maus-tratos, por exemplo.
Ana Elizabeth explica que a criança sente as tensões positivas ou negativas no toque, no gesto ou na voz e responde com seu corpo. “A comunicação corporal é muito mais verdadeira e autêntica que a própria fala”. Isso acontece, de acordo com ela, porque o toque é mais direto na transmissão de uma mensagem, quer seja ela positiva ou negativa, porque chega ao outro com naturalidade e pode ser decodificada na essência de sua intenção.
Aspectos culturais influenciam a percepção ao toque
Segundo Farias, as questões culturais também devem ser levadas em consideração. Por exemplo, a interpretação do toque em culturas orientais, anglo-saxônicas e latinas é diferente. “Uma família anglo-saxônica às vezes é mais agressiva, já os brasileiros são mais afetivos. E a falta do toque em culturas afetivas causam prejuízos mais pronunciados. As crianças e adolescentes são comparativos e ao olhar seu entorno social, percebem a diferença quando há uma tendência maior ao abraço e isso não acontece com ela”, finaliza o especialista.