Que mãe já não ouviu conselhos como: “Não dê muito colo senão a criança vai ficar mimada” ou “Isso é manha! Seu filho está fazendo isso só porque quer colo”? Nos últimos anos, especialistas de diversas áreas têm tido muito trabalho para desmistificar essa ideia de que colo demais gera crianças mimadas, apegadas e dependentes – uma percepção equivocada, resultado de uma enxurrada de informações que hoje são acessíveis a qualquer mãe, mas que, na maioria das vezes, mais atrapalham do que ajudam e orientam.
Vera Iaconelli, psicanalista e diretora do Instituto Gerar, afirma que, por vezes, a própria ciência acabou criando barreiras para aquilo que é totalmente espontâneo. Orientações que levam as mães a evitar oferecer colo ao seu filho ignoram o fato de que o ser humano é um ser social e que é através desse ato que ele encontra um lugar de acolhimento e, principalmente, de reconhecimento: somos humanos, somos frágeis e todos precisamos de amor.
Isso vale não só para os bebês, mas para todo ser humano em qualquer fase da vida. É claro que são nos primeiros meses de vida que esse lugar de acolhimento físico se torna fundamental. Um recém-nascido acaba de chegar a um mundo que, para ele, é cheio de sensações e cores diferentes. Até pouco tempo atrás, ele se encontrava em um lugar totalmente seguro onde era bem alimentado, bem aquecido e mais do que isso, não precisava chorar para comunicar que precisava de todas essas coisas. Por isso, segundo Vera, o útero é o colo perfeito.
Quando o bebê nasce, é importante que a família entenda que o olhar, a voz e o toque, também fazem parte do colo, bem como a compreensão de que todo esse afeto não deve ser resumido somente na figura da mãe. O lugar de acolhimento não pode ser algo que a criança corra o risco de perder. No caso da falta da mãe, por exemplo, o bebê precisa saber que continua podendo contar com um colo. “É preciso criar um ‘ambiente mãe’”, afirma a psicanalista, onde toda a família esteja envolvida e a criança possa ser reconhecida em seus sofrimentos.
Essencial para o desenvolvimento
“O colo é tão necessário aos humanos quanto o alimento” reforça Vera. Estudos clínicos de universidades respeitadas, como a Harvard University, constataram que o colo é essencial para a sobrevivência e desenvolvimento físico, psíquico e emocional das crianças, ao mesmo tempo que a falta dele pode causar distúrbios psíquicos com consequências futuras na vida do ser humano. Isso porque a espécie humana é a única que precisa dessa interação física e emocional na primeira fase da vida.
“Nos primeiros momentos de vida, o bebê sequer reconhece o limite do seu próprio corpo e será a partir do colo, do toque, que essa sensação e dimensão se formará”, explica Florência Fuks, pediatra da Clínica Conviva e do Hospital Israelita Albert Einstein. Acolher, amparar e oferecer afeto a um bebê é algo quase intrínseco a qualquer ser humano pois, segundo a pediatra, o bebê “convoca” quem está a sua volta.
Longe de ser manha
Contestando os “achismos” de muitos, para Florência o choro de um bebê está longe de ser manha. “Ele é o poder de comunicação que o bebê tem”, explica a pediatra. A criança chora para mostrar que está desconfortável com algo e quando recebe colo mostra que era disso que ele precisava. “A cólica, por exemplo, pode ser lida como uma solicitação de aconchego em uma fase de imaturidade e de dificuldade de organização do próprio bebê de forma autônoma”, esclarece Florência. “O mesmo ocorre com adolescentes, jovens e adultos em períodos de angústia, tristeza, desesperança e dor”.
Para as mães que se preocupam com o limite do colo, a orientação da pediatra é clara: “Ofereça muito. Prefiro lidar com o excesso do que com a falta”. O colo estrutura e naturalmente vai dando a noção de limite para a criança.
Ao longo da vida, há uma espécie de evolução do colo, porém ele continua sendo necessário. Enquanto um bebê precisa, literalmente, dos braços de alguém, com o passar dos anos, o ser humano se sente acolhido e cuidado através de um abraço, uma palavra, um olhar, uma ligação. Em tempos difíceis – como o enfrentamento de uma doença, a perda de alguém próximo ou uma situação de necessidade –, é por meio desse afeto que uma pessoa sente sua dor aliviada, além de sentir-se segura e consciente de seus próprios limites.
*A repórter participou do evento “Novalgina – O poder do colo”, a convite da Sanofi