Sentir-se ansioso e frustrado em época de pandemia do novo coronavírus é normal. Números de casos mudam rapidamente e a imprevisibilidade da situação gera a sensação de que ninguém tem o controle. Se esses são os sentimentos que os pais têm diariamente, imagine como está a cabeça das crianças.
Pais ansiosos podem aumentar a ansiedade dos filhos, conforme alerta Fernanda Aoki, psicóloga, mestre pela USP, escritora, palestrante e professora da pós-graduação em Psicanálise da Unifesp. Para aplacar essa sensação, a melhor solução é conversar.
"É importante ter um momento com a criança e que não seja durante o jornal, porque esse vai ser o momento que os pais vão estar preocupados querendo entender o que está acontecendo. Os pais devem digerir [as informações] primeiro e depois sentar com a criança para fazer uma conversa mais lúdica sobre a situação", explica a psicóloga.
A criança, dependendo da idade, pode não entender o que é um vírus e o que ele pode causar. Ainda assim, os pais podem dar a ela ferramentas para que ela possa controlar a situação. "O que diminui a ansiedade da criança é mostrar o que ela pode fazer a respeito. Se ela está no escuro e tem medo, uma lanterna pode ajudá-la. São essas sensações de controle", explica a psicóloga.
Das ferramentas de controle que as crianças podem ter nesse cenário de pandemia, estão:
- Lavar as mãos da forma certa e com frequência;
- Não trocar os brinquedos com o amigo, por enquanto;
- Evitar lugares muito aglomerados, como shoppings ou parques com muitas pessoas;
- Reduzir os beijos e abraços;
- Cuidado ao colocar a mão na boca;
"A criança começa a criar fantasias sobre o coronavírus. Então, se os pais falarem mais em ações positivas, isso ajuda a criança a ter mais calma, a engajá-la na solução do problema. Elas se sentem mais potentes e não impotentes", reforça a psicóloga.
Fale a verdade, e logo
Na tentativa de proteger, alguns pais escondem a verdade dos filhos, mas essa não é uma medida válida. Nem mesmo deixar passar muito tempo para ter essa conversa com as crianças, visto que elas já, provavelmente, criaram fantasias com base no que escutaram na escola.
"O principal é observar a reação das crianças depois [da conversa]. Algumas podem ficar com medo de brincar e muitas vezes os pais querem protegê-los da preocupação, mas a fantasia delas toma conta", explica a psicóloga Fernanda Aoki.
Por onde começar?
Se os pais não souberem por onde começar a conversa com as crianças, deixe que elas falem primeiro. Pergunte o que elas ouviram a respeito e quais dúvidas têm.
"Principalmente com as crianças mais velhas, que já compreendem mais, a melhor forma de delimitar o problema é entender como ele está na cabeça delas", explica a psicóloga Fernanda Aoki.
Em seguida, legitime o sentimento que as crianças tiverem sobre aquele assunto. "A gente não escolhe o que sente e quando os pais invalidam o sentimento, a criança acha que tem algo de errado com ela", reforça.
Validar o sentimento é reconhecê-lo. "Quando a criança diz ter medo do lobo e você diz que ele não existe, isso não diminui o medo dela pelo lobo. Devemos falar: vamos conversar com esse lobo, com esse medo", completa Fernanda.
Para Angela Bley, coordenadora do serviço de Psicologia do hospital Pequeno Príncipe, de Curitiba, diminuir o medo dos filhos significa também colocá-los em perspectiva.
"Não diminuir, mas colocar em uma escala normal. Explicar que existe um vírus, que é desconhecido. A gente brinca no hospital que é o vírus atrapalhado, mas que não existe motivo para pânico e deixar isso claro para a criança. Não é o fim do mundo, mas devemos nos cuidar mais", explica a psicóloga.
"A gente fala que a pressa é inimiga da perfeição, mas é na verdade inimiga da intimidade. Às vezes os pais estão apressados e têm dificuldade em ter intimidade com os filhos. Agora é o momento para parar, olhar para o medo deles, e lidar com os sentimentos. É um momento de crise, existe risco, mas é também de oportunidade de relacionamento, de estar mais próximo da família, dos filhos e desenvolver conversas importantes sobre esses sentimentos", completa Fernanda.