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Certamente muitos pais, passados os anos turbulentos do cuidado com os filhos na infância e na adolescência, se dão conta de o quanto a parentalidade os transformou. Ser responsável pelo desenvolvimento de uma nova pessoa é uma experiência intensa e envolvente, que nos atravessa e nos ultrapassa.Estar atento a esse processo no momento em que ele acontece, encarando a missão de ser pai ou mãe como uma constante lição e procurando estar plenamente presente em cada momento de interação com os filhos, é a proposta da parentalidade consciente, uma corrente que utiliza técnicas de mindfulness no exercício da parentalidade.

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“A parentalidade consciente entende que por trás de um comportamento sempre há necessidades. É para isso que ela olha: para as necessidades tanto da criança quanto dos pais”, explica a psicóloga Iara Mastine, certificada pela Academia de Parentalidade Consciente, de Portugal. “De maneira geral, as famílias adeptas a essa corrente conseguem uma comunicação mais efetiva com os filhos. Além disso, os pais conseguem ter uma coerência melhor no próprio comportamento, por serem capazes de identificar as suas próprias necessidades no interior da família”.

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A referência que trazemos 

Muito do peso que os pais podem colocar sobre os filhos provêm de problemas não resolvidos dos pais, que projetam sobre os pequenos expectativas que nem sempre são para o seu bem. A parentalidade consciente sublinha que a educação dos filhos é um processo que não tem a ver só com os filhos: tem a ver com os pais. E isso tem muito a ver com autoconhecimento.

“Olhando para as minhas necessidades, eu exerço o autoconhecimento. Assim, consigo identificar a forma como fui criada e escolher se eu quero reproduzir aquele comportamento, fazendo exatamente igual ao que meus pais fizeram, ou se quero fazer algo de diferente”, orienta a psicóloga. “Quando questionamos a nossa forma de agir, conseguimos ser mais conscientes no nosso dia a dia e promover o respeito a cada situação específica”.

“Entender as necessidades da criança leva a trabalhar de uma forma personalizada e, assim, a ter resultado, porque estou olhando para um ser único”

“Por que eu faço questão que meu filho esteja na cama às 21 horas, se ele pode dormir até mais tarde? Será que é porque eu tinha que ir dormir nesse horário quando era criança? Eu estou reproduzindo o que aprendi ou tentando entender a necessidade específica do meu filho?”, exemplifica Mastine. Isso nada tem a ver com um estilo permissivo do exercício de pai ou mãe – pelo contrário, a parentalidade consciente propõe o discernimento e o conhecimento como critérios para o estabelecimento de limites, em vez do medo, do simples costume ou de carências pessoais.

Nessa proposta, é importante se perceber aberto às mudanças, entendendo que a parentalidade é um processo e aprendendo constantemente com ele. É o que se denomina mente de principiante – fazer as coisas como se fosse pela primeira vez, com intensidade e curiosidade, sem julgamento. Assim, o medo, o automatismo ou a superproteção, que tão frequentemente guiam a nossa forma de ser pais e mães e prejudicam o desenvolvimento dos nossos filhos, deixam o volante.

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“Entender as necessidades da criança leva a trabalhar de uma forma personalizada e, assim, a ter resultado, porque estou olhando para um ser único”. Mastine exemplifica: “Se a criança faz birra, não há uma receita pronta de o que fazer nesse caso. É preciso entender a necessidade que há por trás. Pode ser cansaço, pode ser algo que ela aprendeu, pode ser algo que ela viu que em outros momentos ou em outras pessoas teve um reforço positivo”.

Uma família mais harmoniosa

A parentalidade consciente utiliza ainda técnicas de comunicação não-violenta. “Na comunicação não-violenta, eu preciso acolher o que o outro expressa. É dizer à criança que pede colo em um momento inadequado: ‘Filho, eu entendo que você deve estar muito cansado. Eu também estou bem cansado’ – ou seja, pratico a empatia na verbalização. Ao mesmo tempo, indico o que deve ser feito: ‘O que a gente pode fazer? Sentar um pouquinho aqui e esperar o cansaço passar para levar as compras até o carro ou você me ajuda a levar um pouquinho, e a gente vai levando pouco a pouco, sem eu precisar pegar você no colo neste momento?’”, indica a psicóloga.

“Quando eu consigo compreender aquilo que meu filho precisa, tenho uma relação com mais harmonia e respeito – e a harmonia familiar é o que todo mundo procura hoje”, afirma Mastine. “Quando olho para mim, para o que tenho falta e me respeito, eu mudo a minha forma de ser – e assim sou um exemplo diferente para a minha família”. Um psicólogo pode ajudar nesse propósito, oferecendo caminhos para desenvolver a inteligência emocional, atendendo à necessidade de lidar com o próprio comportamento e proporcionando a ampliação do repertório de cada mãe e pai.

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Viver a parentalidade de maneira consciente implica também dar-se conta das diferenças entre as gerações e no quanto isso implica no desenvolvimento de algumas habilidades e virtudes nas crianças. “Hoje temos crianças com índices de ansiedade maiores do que antigamente. Elas têm mais dificuldades para aprender alguns valores que eram ensinados de forma mais espontânea pela própria sociedade décadas atrás”, explica Mastine.

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“A paciência, por exemplo, fazia parte do dia a dia. Na nossa infância, enfrentamos muita fila com nossos pais em bancos e mercados, por exemplo. Hoje tem famílias que fazem tudo pela internet. Antigamente você assistia a um desenho e tinha que esperar até o dia seguinte para ver outro episódio. Hoje não. O imediatismo está sempre presente e não há a experiência da espera”, avalia a psicóloga. O que fazer? É preciso lançar mão de outras estratégias, como fazer um momento culinário com os filhos ou iniciá-los no mundo da jardinagem – processos que sublinham a importância da espera.

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