Conheço pais auto intitulados “amigos” de filho adolescente; conheço mães que querem e se orgulham de se denominar “amigas” de filho adolescente. O título de “amigo/a de filho adolescente” me intriga: será um problema não querer ser amiga de filho?
Não sou amiga de filho
Tenho poucos, mas leais amigos. Homens e mulheres, o que pra mim é um privilégio dadas as críticas dedicadas às amizades com sexo oposto avaliadas com demasiada desconfiança.
Siga o Sempre Família no Instagram!
A eles confidencio segredos, troco percepções, discuto e mostro também o meu pior. O apoio e a aceitação são mútuos e as cutucadas imbuída pelo desejo de despertar o melhor do outro são também realidade, o que nem sempre, contudo, sai como esperado e acaba por nos colocar em saias justas e arranhões.
Verdade é que, entre a amizade e sua destruição, o limiar da crítica e da repreensão pode minar e até acabar com o mais aparentemente sólido vínculo. Por isso – e muito mais – rechaço a ideia de ser amiga de filho – especialmente adolescente: meu papel é outro e bem maior e mais desafiador.
Perco o amigo, mas filho, não
Fecho com filho para o que der e vier e, diferente dos amigos, sigo firme no propósito de lhe propiciar a segurança do amor incondicional e do apoio irrestrito, especialmente nos momentos críticos quando tenho vontade de chutar tudo para o alto e ele, para longe.
Não tenho a pretensão de ser sua amiga e, sinceramente, creio que ele também não espera isso de mim. Na vida real e prática de mãe e filho adolescente, descobri situações em que não preciso – nem devo – ser sua amiga. Preciso ser incondicionalmente mãe que, independentemente da circunstância, perde o amigo, mas filho, nunca.
Preciso antes de tudo, assegurar-me no papel de educadora e uma espécie de "facilitadora" de filho principalmente nos momentos de decisões impopulares.
A confiança de não ser amiga de filho
Não hesito em afirmar: sempre fui presente na vida de filho. Nem o ritmo profissional frenético serviu de bengala para delegar responsabilidades – e prazeres – maternais a terceiros. Vivi cada fase de desenvolvimento de filhos sob ativa e alegre união apesar de todo o desafio envolvido na função de mãe.
A relação foi de crescente parceria e reforçou a ideia de estar no caminho certo para um vínculo sólido com filhos. Na adolescência do primogênito, contudo, muita coisa mudou.
Dentre as mudanças, filho passou a preferir e facilmente me trocar pela companhia dos amigos.
Por um tempo, temi que o tal vínculo não fosse tão forte assim como pensava; que a "amizade" construída bastaria para nos manter unidos em programas, atividades e interesses comuns. Mas a fase mudou e, com ela, filho e os papéis de cada um também.
Não sou amiga: sou mãe
Meu adolescente passou a querer privacidade, a nutrir segredos, a viver situações e experiências pessoais sem minha participação e conhecimento:
– Pô, mãe, você não vai ao show comigo, né? Vou com a galera... nada a ver você ir com a gente. - disse ele.
– Mas é aquela banda que a gente ama! Por que não? A gente descobriu o som juntos, lembra? – argumentei em um mix de nostálgico – e sem noção – apego.
– Saco, mãe! Porque vou com meus amigos, né! Nada a ver você ir com a gente. Se você for, fica longe da gente, hein! – sentenciou sem dó nem piedade.
Filho ampliava horizontes e ávido por alçar voo, construía novos vínculos de amizade, amor e parceria. A vida alargada expandia suas possibilidades de formar identidade própria; ampliada as relações para além da família, filho experimentava o novo e se encantava com a novidade.
De repente, a confiança e intimidade mostraram a liberdade de se falar franca e abertamente o que pensa sem melindres e total aceitação o que, entre amigos, é menos possível e entre pais e filho, factível e, a meu ver, esperado ainda que custando mudança no nosso modelo de convivência.
A ríspida resposta não chegou me abalar. Ainda que um tanto chorosa de assistir filho abrindo asas, no fundo sorri e com olhar um tanto melancólico, compreendi: só pai/mãe para entender o incrível processo de amadurecimento por trás de uma reação tão descuidada e, ao mesmo tempo, natural.
Cada um no seu papel
Prezo a segurança parental como alicerce fundamental à relação entre pais e filhos. Sou da opinião de que filho precisa notar e sentir seus pais conscientes, antes de tudo, do seu papel de educadores, responsáveis e apoiadores.
Isso não significa impedimento a se criar vínculos afetivos com filho; apenas diferencia – e clarifica – papéis que, na prática, estruturam a formação do adulto seguro e emocionalmente estável que espero – e tenho como missão – entregar ao mundo.
Assim, dentro do meu, brinquei com sua resposta infantilmente mal criada e, sem melindres, respondi:
– Então tá; bom show, filho! Agora... juízo, hein??
Amiga não; sou mãe
Definitivamente: não sou nem penso que deva ser amiga de filho adolescente. Deixo a outros atores do mundo adolescente a chance de criar tal vínculo e escrever esta história com amigos leais. Poucos ou muitos, não importa desde que desempenhem bem seu papel.
Quanto a mim, assumo o meu de mãe ocupada em incentivar o melhor de filho, corrigir com amor e apoiar com sabedoria suas experiências. A meu ver, não preciso, não devo, nem quero ser mais do que mãe. A missão por si só nos basta e nos torna ainda mais... família.
*Xila Damian é escritora, palestrante e criadora do blog Minha mãe é um saco!, espaço em que conta as situações cotidianas e comuns que vive sendo mãe de adolescentes, buscando desmistificar clichês sobre essa fase dos filhos, para transformá-la em um tempo de aprendizado.