O cenário é comum para várias famílias com crianças pequenas: durante o jantar, os pais posicionam um tablet para a criança se distrair com um desenho animado enquanto come. Para deixá-las ainda mais imersas em atividades, joguinhos lotam a tela dos dispositivos móveis e as crianças estão cada dia mais vidradas na vida digital.
A pandemia da Covid-19 colocou a família em uma nova dinâmica, com adultos em home office e as crianças em casa, demandando atenção a todo instante, com os pais criando maneiras de entreter as crianças para não interromperem durante o trabalho, solução que muitas vezes direciona diretamente para televisão, celular e tablets.
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Mas a pandemia também abriu novas interações entre pais e filhos, que podem ser exploradas com mais empenho, como envolver a criança em atividades domésticas e reservar um tempo para brincar com os filhos longe das telas. É exatamente na infância e juventude que todos deveriam ser expostos, o máximo possível, a interações e experiências reais, é nessa idade que o desenvolvimento cerebral é mais intenso, e por isso experiências com o mundo são essenciais para a formação das funções executivas como memória, noção de volume, organização mental e também competências socioemocionais de empatia, respeito, convívio em sociedade, entre outras.
Historicamente, o papel do desenvolvimento de competências socioemocionais e funções executivas sempre foi da família. Observando os pais no jantar, colocando a mão na massa do pão, arrumando a mesa com talheres, colocando o pé no chão, brincando com brinquedos de formas e pesos diferentes, são diversos os estímulos do contexto familiar que as crianças usam para desenvolver capacidades motoras, de lógica e espaço.
Considerando que a Organização Mundial da Saúde (OMS) indica que crianças não devem ser expostas a mídias digitais antes dos 2 anos de idade, também é muito importante que os pais valorizem a experiência com a natureza pelo menos até os 7 anos, mantendo o mundo digital ponderado para no máximo uma hora por dia.
Porém, no contexto do mundo atual, os pais e responsáveis trabalham cada vez mais, seja em escritórios ou home office, e desde a mais tenra idade as crianças começam em creches e instituições de ensino. Com essa transformação, o papel de ensinar às crianças competências como empatia, respeito, convivência, confiança, criatividade foi parar dentro das escolas, que atualizam suas grades curriculares para que os jovens saiam da escola com uma formação completa nos aspectos didático e socioemocional.
O ensino de competências socioemocionais para a trajetória profissional é uma questão de sobrevivência e também de adaptabilidade. Para carreiras que ainda nem existem, o trabalhador do nosso século 21 precisa estar preparado para mudanças, precisa se adaptar facilmente a novas situações e precisa entender a responsabilidade dele com si próprio e com os outros, além de ter controle emocional.
Com a falta dessas competências socioemocionais, percebemos pessoas que não aceitam críticas, que argumentam e desafiam tudo que vai contra a verdade que criaram. Nativos da era tecnológica e redes sociais, os jovens também conhecem como ninguém a linguagem que faz uma publicação on-line alcançar milhares de pessoas. Se adicionarmos competências socioemocionais e gestão de emoções a essas qualidades intrínsecas dos jovens, a argumentação e a forte interação com a tecnologia, criaremos pessoas capazes de realmente transformar o mundo, que podem usar todos esses artifícios para realizar ações solidárias, pensar no seu papel em sociedade e sempre respeitar o outro.
O principal objetivo do desenvolvimento das competências socioemocionais é criar o sentimento de corresponsabilidade social, o “eu sou responsável pelo outro e pelas minhas atitudes que afligem os outros”. Os jovens precisam ser ensinados de que suas ações afetam as pessoas, precisam saber que emoções existem e não podem ser negligenciadas, e sim administradas. As novas regras da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) pretendem desenvolver as capacidades socioemocionais das crianças desde o início do Fundamental I até o término do Ensino Médio. O resultado que todos nós esperamos é que o estudante saia da escola capaz de olhar com respeito para a sociedade, para seus colegas, para sua família, e que desperte a vontade de melhorar a realidade em que vive.
*Renata Aguilar é neuropsicopedagoga e colaboradora/desenvolvedora de conteúdo educacional na rede Super Cérebro