Vivemos a era da informação e rapidamente entramos na era digital. Hoje, quem diria, já vivemos a era pós-digital. Se naquela primeira fase sofri o impacto do grande volume de informações disponíveis ao alcance de um “click”, hoje vivo as agruras da era pós-digital exponencialmente acessível e dinâmica. Prova disso é estar aqui falando sobre relacionamento com filho adolescente por meio de um blog, canal inimaginável para mim até poucos anos atrás.
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Enquanto experimentava a profunda transformação do conhecimento e da comunicação vivia também a escassez de tempo. Inesperadamente encantada com o fácil acesso à informação e ávida por absorver o máximo de dados possível, acreditei no “quanto mais, melhor”. Assim, priorizar virou ação esquecida e o que de fato merecia minha atenção ficou em segundo plano.
Atraída pelo mundo globalizado que se abria diante dos meus olhos a partir de um simples click, passei a não ter mais tempo para ler aquele livro, falar com a amiga, visitar os pais, praticar o esporte preferido, efetivamente “curtir” férias, sair com a turma do trabalho... e conviver com meu filho adolescente.
Não entendia mais meu filho
Na rotina diária, alimentei a ideia – e consequentemente a agenda – de que quanto mais ocupada estivesse, melhor e mais necessária me tornaria. Adotei frases do tipo “não posso” e “não consigo” a qualquer convite que me exigisse assumir um compromisso fora da tão disputada agenda que logo se tornou parâmetro de vida.
A era da informação – ou digital ou pós-digital, não importa – me levou ao que passei a chamar de “ânsia do tudo”: de querer saber tudo, de estar antenada a tudo, de responder tudo, de ter – e dar! – opinião sobre tudo, de fazer... de tudo.
A “ânsia do tudo” me mantinha no modo “ligado” 24 horas por dia
Sem filtro e sem tempo, me habituei a deixar para depois aquele contato com a amiga, aquela mensagem à irmã aniversariante, aqueles parabéns ao sobrinho formando, aquele reencontro com colega de turma. Sob uma falsa modéstia, passei a justificar meus deslizes com frases do tipo “tô na correria”.
A falta de tempo passou a ser motivo de minhas recusas às tentativas de qualquer relacionamento. Pouco a pouco, minhas interações se restringiram a contatos de trabalho; me relacionar com pessoas deixou de ser uma prática espontânea e natural.
Ao me tornar mãe, o já pouco tempo ficou ainda mais escasso e, por isso, ainda mais precioso. A agenda já bastante ocupada ganhou novas funções e, inevitavelmente, minhas prioridades mudaram.
Assumi o desafio da maternidade consciente e desempenhei a função com muita dedicação: cuidei do meu bebê com atenção e participação ativas, acompanhei suas diferentes fases de desenvolvimento, presenciei suas primeiras conquistas como o primeiro passinho (mães adoram citar este momento como indicador de peso em sua auto avaliação), troquei muitas e muitas fraldas, coloquei para dormir, brinquei. Em suma, no final das contas, me validei como boa mãe desde o início.
Nova fase: mãe de adolescente
A adolescência chegou. Com ela, idealizei: meu filho adolescente me libertaria da função de mãe para retomar a agenda do “tô na loucura”; afinal, “ele havia crescido e se tornara um homem”, pensava... e dizia. De fato, meu filho ganhou autonomia e, junto, responsabilidades e deveres. Neste “pacote”, ganhou também voz própria e ativa para opinar, argumentar, pedir; reclamar, contestar, discutir... e brigar.
Foram muitos os sinais de alerta recebidos como prevenção à tormenta que se aproximava. Apesar de assustada, reduzia a lente respondendo:
- Que exagero!
Decidida a manter-me neutra até “minha vez”, hoje vejo que subestimei o desafio de ser mãe de adolescente ainda que tão antenada e conhecedora da atualidade como me julgava ser. A tal “era da informação a um click”, definitivamente, não estava ajudando nesse território hostil.
O alerta do filho adolescente
O primeiro sintoma da chegada da adolescência foi a dificuldade de comunicação. Estranhamente não falávamos mais a mesma língua, nossa sintonia se perdeu e, logo, o diálogo se foi. Absorta na vida profissional e convicta de que já tinha um “homem criado” em casa, descuidei da comunicação com meu filho adolescente reassumindo o modo “ligado 24 horas por dia” sem tempo para me relacionar agora também com ele.
Sob o mantra “tô corrida”inclusive com meu filho adolescente, não tinha tempo para as histórias de seu dia na escola, mas para a cobrança da lição de casa; não tinha tempo para seus receios e ansiedades com a turma que não o aceitava, mas para cobrar-lhe vida social porque estava sempre trancado no quarto; não tinha tempo para rir com as piadas e memes que lhe chegavam pelo zap, mas para exigir que largasse o celular ordenando-o a “fazer alguma coisa”.
Várias situações vividas com meu filho adolescente nos afastaram até que o abismo físico e emocional ficou insuportável. Foi quando o escutei dar, senão o maior, um dos mais tristes alertas sobre nossa distância:
- Mãe, você é um saco! Você não me entende!
Sua reação foi como um tapa na cara. Senti a dor da palavra refletir no meu corpo. Como um “sacode”, entender sua mágoa foi devastador. Naquele momento, percebi a importância do cultivar relações, só possível quando praticamos o convívio e o diálogo. Independente da era, é o que gente sabe (ou deveria) fazer de melhor.
Na minha indisponibilidade, perdi o relacionamento com meu filho adolescente e já não o entendia mais. Incompetente ao diálogo, me afastei até me perder do meu filho adolescente. Seria essa a causa daquele alerta de mães sobre a adolescência?
A decisão de entender meu filho adolescente
Decidida a recuperar o caminho de onde nos perdemos, priorizei reaprender a me relacionar começando por meu filho adolescente.
Assim, aprendi a escutar mais do que falar; a me conectar mais do que só estar presente; a colocar-me disponível. Finalmente entendi que meu filho adolescente lutava bravamente para se fazer entender... tanto quanto eu. Errando e acertando, encontramos nosso caminho. De um jeito novo e com uma dinâmica diferente, estamos aprendendo juntos.
Inegavelmente, a prática mostrou que nada supera o tempo bem empregado, o recurso bem aplicado e a prioridade bem estabelecida. Colocar-se disponível é um exercício cansativo, mas, antes, uma decisão. Hoje sou eu quem alerta tantos outros pais sobre a desafiadora adolescência que, ao contrário do que muitos repetem, nos dá a chance de crescer junto com nossos filhos... desde que realmente queiramos cultivar relações para a vida. Eu quis e sou mais feliz por isso.
*Xila Damian é escritora, palestrante e criadora do blog Minha mãe é um saco!, espaço em que conta as situações cotidianas e comuns que vive sendo mãe de adolescentes, buscando desmistificar clichês sobre essa fase dos filhos, para transformá-la em um tempo de aprendizado.