Na escolha da profissão do jovem, a família pode ser uma referência tanto positiva quanto negativa.| Foto: Bigstock
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Tanto na hora de decidir a carreira profissional quanto no momento de bater à porta do primeiro emprego, sabemos muito bem que não estamos completamente sozinhos: carregamos conosco toda a trajetória feita até ali, os referenciais que tivemos e as experiências que nos marcaram. Mas em que medida a vivência anterior, no seio da família, determina o que acontece nesse momento?

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Na escolha da profissão, a família pode ser uma referência tanto positiva quanto negativa, como sublinha o psicólogo Paulo Porto, coordenador da Especialização em Psicologia Organizacional, Gestão de Equipes e Bem-Estar da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). “O jovem que vê, por exemplo, o pai realizado e feliz como dentista, ou advogado, pode se inspirar com esse exemplo. Do mesmo modo, pode ver um parente que não o tratava bem, que era uma pessoa grosseira ou agressiva, e pode associar a pessoa à sua profissão e acabar evitando aquela prática profissional”, explica ele.

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A psicóloga Michele Maba, por sua vez, ressalta que essas relações também configuram o modo como a experiência profissional será vivenciada, seja no relacionamento com chefes, pares ou subordinados. “Se um jovem entende que um determinado ambiente de trabalho é tóxico, é porque ele sabe o que é um ambiente não tóxico, porque experimentou isso em suas relações em casa”, comenta a psicóloga. “Mas se essa pessoa saiu de um lugar onde há uma bagunça emocional, ela pode às vezes se sujeitar a relações abusivas, ou ela mesmo ser agressiva e acabar perdendo boas relações com profissionais ao seu redor por conta disso”.

Conexão, autonomia e limites

Michele explica que desde o começo da nossa vida somos marcados por um conjunto de necessidades emocionais fundamentais. O modo como elas serão correspondidas, principalmente pelos pais ou pelos cuidadores principais, delineia a formação da nossa personalidade e a maneira como enfrentaremos os desafios da juventude e da vida adulta.

“A primeira grande necessidade humana é a de conexão. Dependendo de como nos relacionamos com o bebê, ele se vincula com maior ou menor nível de apego às pessoas de quem depende, com um apego mais saudável ou mais inseguro, e tudo isso determina como essa pessoa se relaciona como ser humano”, explica a psicóloga.

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A outra necessidade é a formação da autonomia. “Pais que foram muito capazes de suprir a necessidade de conexão muitas vezes falham mais ao suprir a necessidade de autonomia. Eles são tão bons em aconchegar e cuidar que podem ter mais dificuldade para soltar a criança na vida, permitindo que ela faça as coisas por si mesma – se alimente, se vista, amarre o calçado –, e acabam adiando a autonomia que, a dado momento, se torna necessária”, diz Michele. Isso tem implicações então no modo como a pessoa se sentirá capaz de lidar com os desafios ao longo da vida.

Uma terceira grande necessidade é a de limites. “Quando uma criança recebe ‘nãos’ adequados, boas explicações, ela entende que existe estabilidade no comando de um adulto, que existe uma preocupação com a prudência, e não simplesmente o reflexo de uma variação de humor do pai ou da mãe”. Isso proporciona uma sensação de segurança ao longo da vida ao enfrentar as contrariedades. Diante da negativa de um chefe, por exemplo, a pessoa pode se sentir mais confortável para aceitar a decisão ou propor uma outra perspectiva – em qualquer dos casos, sempre de forma serena.

O suporte na hora da decisão

Para proporcionar uma experiência saudável do jovem com a sua carreira desde o primeiro momento, Porto indica que é essencial uma atitude de apoio por parte dos pais na hora da decisão profissional. “Muitas vezes, quando chega o período do vestibular, o jovem começa a receber uma pressão sobre a sua decisão, mas ainda não sabe de fato o que quer fazer”, diz o psicólogo. “Para a família, é necessário nesse momento sair de uma postura de cobrança: em vez de colocar mais dúvida e sofrimento sobre o jovem, trazer informações e vivências para ele entender o dia a dia de cada profissão e assim ajudá-lo na decisão”.

Isso impede que a pressão que já é comum nesse momento se torne motivo de afastamento entre pais e filhos. “Muitos pais reclamam que não conseguem conversar com os filhos, mas alguns deles não estão realmente dispostos a escutá-los”, afirma Porto. Em um diálogo verdadeiro, o papel fundamental dos pais não é substituir o filho em suas escolhas, mas justamente oferecer experiências que ajudem na decisão.

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O psicólogo sugere que, em vez de fazer pressão, os pais podem dar oportunidades para que ele conheça melhor algumas profissões – por exemplo, marcando uma conversa com um amigo da família que exerce alguma profissão que o jovem tem em mente ou uma visita a escritórios, consultórios ou outros lugares em que seja possível ter contato com o dia a dia da profissão.

“O jovem precisa de outras experiências para decidir. As decisões precisam de menos pressão e ocorrer com mais naturalidade, de modo mais saudável. Isso faz bem pra todos”, indica Porto, que complementa: “Se o jovem ainda não se decidiu, qual o problema de adiar o vestibular por um ano? ‘Imagine, perder um ano’. Será que é perder um ano? Aos 17 anos muitas vezes não estamos prontos para essa tomada de decisão. Essa linha temporal não é tão rígida. Precisamos repensar isso”.