Em plena era digital não é de se admirar que o jovem de hoje conheça potenciais namorados pela internet enquanto pais sofram imensos sustos com esta inusitada dinâmica do mundo atual.| Foto: Bigstock
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Amor na adolescência sempre dependeu mais da experiência do que da via de comunicação usada para vivê-lo. Em plena era digital não é de se admirar que o jovem “de hoje” (que rótulo chato!) conheça potenciais namorados pela internet enquanto pais sofram imensos sustos com esta inusitada dinâmica do mundo atual.

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O namoro em diferentes versões

Cena 1: O reencontro de namorado da adolescência

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Certo dia fui surpreendida com a mensagem de um namoradinho da adolescência no meu Facebook. Depois de décadas sem notícias, recordamos nossa adolescência recheada de lembranças pueris de um amor tipicamente adolescente: de descoberta do afeto refletido em reações físicas como frio na barriga, ansiedade do encontro, mão suada, coração disparado.

Lembramos também as diferenças daquele tempo de troca de cartas de amor, da agonia da espera dos correios, da espera da melhor foto autografada com dedicatórias afetuosas e do hoje “tão diferente”.

Foi gostoso conversar e relembrar as emoções que inauguraram a fase até então desconhecida para nós e notar que ficaram para sempre marcadas como uma saudável memória da experiência de amor na adolescência.

Cena 2:  A revelação da filha adolescente “de hoje” 

- Mãe, preciso te contar uma coisa... conheci um garoto na internet. É da Nova Zelândia. Completamos 1 ano de namoro e ele faz planos de vir pra cá no verão, ou seja, daqui a 2 meses.

Mãe paralisa. Confusa, não sabe por onde começar.  Muita informação para processar de uma só vez:

- Na internet? Namoro na adolescência agora é virtual? Há 1 ano diante do meu nariz e não vi? Neo-zeolandês? Onde fica a Nova Zelândia mesmo? Que língua falam neste país, meu Deus? Como vocês se entendem? Aliás, vocês conversam? Sobre o quê? “Vem pra cá” oooonde, minha filha? Aqui pra casa? Como assim se sequer o conheço?!  E a família? O que pensam disso? Você quer me enlouquecer! Afinal, QUEM é ele???

- Mãe, calma você tá surtando! Por isso não falei antes! Que saco! Você é muito exagerada!  Escuta primeiro! Vou te contar...

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Até a efetiva – e temida – chegada do “visitante”, dois meses de muita (tentativa de) conversa que, entre bufadas e viradas de olho (de ambos os lados), viraram discussões e brigas na expectativa angustiante de obter detalhes e tentar entender, digerir e... orientar a filha sobre a nova circunstância de um namoro da era digital àquela altura já fato e realidade nos dias “de hoje”.

Entre o passado e o presente

Passado o stress da inusitada revelação, a mãe passou a comparar a nova modalidade de namoro digital com sua experiência adolescente guardada no passado já distante. Neste paralelo, buscava manter um mínimo de sanidade mental para primeiro entender o novo contexto; depois, (tentar) ajudar a filha na condução desta história tão surpreendentemente inimaginável à sua compreensão.

Comparar, de fato, contribuiu com a urgente compreensão e emergencial digestão das diferenças entre o passado e o presente. Apesar de atônita, buscou respostas para as rápidas mudanças da atualidade. Desempenhar seu papel de mãe incluía conhecer sobre o amor na adolescência... da era digital.

Viveu dois meses de intensa angústia misturada com medo, raiva e sentimento de culpa “por não ter notado nada”.  Aliado à bagunça emocional, a necessidade urgente de digerir o surpreendente comunicado e rapidamente formar um mínimo de opinião sobre a situação posta com o cuidado de garantir sua permanência junto da filha neste momento tão importante quanto desafiador para toda a família.

A demonização da tecnologia e os rótulos   

A demonização da tecnologia por parte de pais, familiares, especialistas e estudiosos me manteve sob um desmedido pré-conceito digital por anos o que me induziu a assumir um rígido discurso contra o assunto. Como resultado, também por anos nutri um assustador fantasma que insistia em me convencer de que perderia meu filho para a tecnologia.

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Não à toa, rotulei meu filho como preguiçoso, egoísta, impaciente, individualista e incompetente social. Criticava-o excessivamente e, desapercebidamente, adotei uma postura de mãe-general inflexível e cheia de verdades absolutas. Como de se imaginar, a relação se deteriorou até ficar insustentável.

Vivendo na era digital, diferente e desconhecida de tudo o que vivi, não enxergava o outro lado da moeda julgando – e sentenciando – a minha não só “melhor” como “sem comparação”.

Foi fácil absorver toda a descarga de ansiedade e a avalanche de dúvidas daquela mãe. Inconcebível, também para mim, imaginar o namoro na adolescência pela internet, mas a realidade nos colocava à prova.

Também mãe de adolescente, não estava livre de passar pelo mesmo. Assim me dispus a

assumir a situação como um exercício de precaução... e aprimoramento. Vivi cada parte da assustadora novidade refletindo junto com a mãe aflita as questões envolvidas naquela nova dinâmica.

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Juntas, trocamos ideias, opiniões sempre atentas a escutar e a considerar as novas circunstâncias desafiando verdades absolutas arraigadas. Dispostas a encontrar saídas, abrimos a mente e o coração para acolher a adolescente e, por tabela, contribuir para que sua experiência de amor na adolescência também fosse digna de boas memórias.

O amor adolescente da era digital  

A adolescente não se furtou de conversar com a mãe. Relatou sua experiência amorosa no modo digital de forma apaixonada. Depois de um ano de relacionamento virtual, o casal adolescente decidiu apostar no presencial o que exigiu envolver mais gente e mais esforço agora dos seus respectivos pais.

O amor aflorado estava ali: vivo, ativo, intenso e, tal como no passado, gostoso de ser revelado, vivido e provado.

- Seria esta uma versão atualizada do clássico Romeu & Julieta da era digital? - pensei intrigada. - O amor mudou? Adolescentes “de hoje” valorizam o amor?

Respostas que nunca tivemos prontas e definitivas: sempre dependeram mais da experiência individual do que do tipo de comunicação utilizada para vivê-la. A intensidade do amor, o frio na barriga, a ansiedade do “encontro” virtual, a aceleração cardíaca do amor “impossível” pela internet... emoções que o amor na adolescência da era digital também provoca estavam lá!

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Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]

O amor na adolescência e a tecnologia

Impossível ignorar o fato de que os adolescentes “de hoje” nasceram neste ambiente digital. Crescer neste habitat tecnológico não tornou nossos filhos insensíveis ao amor.  A paixão e o amor na adolescência continuam acontecendo só que com recursos um tanto... diferentes.

A carta entregue pelo correio, a melhor foto impressa com dedicatória e o perfume do papel de carta criteriosamente escolhido para enviar a mensagem de amor foram substituídos por emails, emojis, whattsapps, vídeos, fotos digitais e sessões de skype. Tudo em tempo real, mas com a intensa emoção de outrora.

Contar com os recursos tecnológicos ampliou a possibilidade de viver experiências amorosas. A geografia ilimitada promovida pela globalização fez aumentar vertiginosamente a chance de encontros amorosos entre pessoas de países sequer lembrados no mapa mundial como o neo-zeolandês que forçosamente impingiu intensivões de geografia e língua estrangeira à família para se fazer presente.

Sem dúvida, a era digital trouxe grandes desafios aos pais de adolescente. A nova dinâmica de encontros e relacionamentos virtuais – e globais! – é, no mínimo, inusitada para não dizer assustadora. Mas mais do que isso: é fato e independe do meu gosto e aprovação. Acontece e, por isso, precisamos nos preparar para viver a situação junto de filho.

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Romeu & Julieta da era digital

Capítulo Final: o jovem casal digital oficializou o namoro e, apaixonado, viveu a experiência sob os olhos atentos dos pais de ambos os lados enfim entrosados via sessões de skype, grupos de whattsapp, e-mails semanais e fotos diárias.

Por três anos comemoraram aniversário de namoro com visitas alternadas entre países e continentes nas férias. 

- Namoro firme, hein? Planos de casar, filha?

- Aaai, mãe! Fala sério! Você é mesmo muito exagerada... temos muito o que fazer ainda... terminar os estudos, planejar a vida profissional, arrumar um bom emprego...

De repente, noto em sua consciente expectativa de futuro mais uma similaridade com meu passado adolescente. 

- O que realmente mudou nesta história? – me questionei de novo.

E a resposta, desta vez, veio fácil: sem dúvida meu preconceito contra a era digital e os adolescentes “de hoje”.  Nesta versão atualizada de Romeu & Julieta, os protagonistas não morrem e as famílias se integram gradativamente... como antes.

O que importa não muda nunca

A era digital já é parte denossa vida, recurso que (re)conecta pessoas do presente... e do passado.  Como aquele namoradinho da adolescência – hoje pai e leitor voraz do meu blog – também está aprendendo que o mundo mudou e continuará mudando. Mas a missão de orientar um filho – inclusive sobre o amor na adolescência da era digital – continua o mesmo e requer permanecer junto dele para isso.

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Portanto, acostumemo-nos com a ideia de que encontrar a “cara metade” não está mais restrito ao nosso quadrado: pode acontecer em qualquer lugar do mundo e pelo computador!  E como se não bastasse, pode evoluir para um namoro real tal qual vivido no passado, apenas iniciado por uma via diferente.

Queiramos ou não, é imperativo conhecer este mundo digital sem ideias preconcebidas.  Do contrário, cairemos na cilada de, demonizando a tecnologia, querer “matar o mensageiro” em vez de usar do recurso para cumprir a missão de educar filho para a vida “de hoje”.

Enfim, atualizemo-nos e foquemos no que importa e nunca muda: ajudemos nosso ou nossa adolescente a viver o namoro na era digital com segurança contribuindo para que a experiência – apesar de assustadoramente inusitada aos nossos olhos e corações – renda boas ou até melhores memórias como à época em que namoro só era viável presencialmente... ou por correio.

*Xila Damian é escritora, palestrante e criadora do blog Minha mãe é um saco!, espaço em que conta as situações cotidianas e comuns que vive sendo mãe de adolescentes, buscando desmistificar clichês sobre essa fase dos filhos, para transformá-la em um tempo de aprendizado.