Todos nós já ouvimos reclamações sobre como os jovens gastam tempo demais online e pouco tempo no “mundo real” – há até estudos que mostram que três em cada quatro adolescentes britânicos entre 12 e 15 anos têm um perfil nas redes sociais e passa cerca de 19 horas online por semana.
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Talvez mais preocupante do que a quantidade de tempo online sejam as descobertas que indicam que o uso de redes sociais pode influenciar a personalidade e o caráter do usuário. Pesquisas recentes mostram, por exemplo, que o uso intensivo dessas redes está ligado ao narcisismo e, além disso, pode ter um impacto negativo nas decisões que tomamos no que se refere aos relacionamentos com os outros e reduzir nosso nível de empatia.
Com isso em mente, um dos nossos mais recentes projetos de pesquisa no Jubilee Centre for Character and Virtues volta o olhar para o impacto que as redes sociais têm no desenvolvimento moral dos jovens, procurando entender os benefícios que o uso desses recursos pode ter nesse processo.
O projeto ainda está em andamento, mas a sua primeira fase já envolveu uma pesquisa com 1.738 pais de jovens de 11 a 17 anos de todo o Reino Unido. Fizemos a eles uma série de questões sobre suas percepções a respeito das redes sociais e sobre as mensagens morais – ou imorais – que aparecem na internet. Nossas descobertas até agora indicam que a atitude dos pais em relação às redes sociais é amplamente negativa. Mais da metade deles concordaram que elas “dificultam ou minam” o desenvolvimento moral ou de caráter de um jovem. Apenas 15% dos pais sustentaram que as redes sociais podem “apoiar ou aprimorar” esse desenvolvimento.
O lado bom
Também perguntamos a respeito do uso que os próprios pais fazem das redes sociais. Pais que fazem uso regular desses recursos reportaram que nas redes há falta de “traços de caráter positivos” como autocontrole, honestidade e humildade. Ao contrário, os pais disseram que veem muita raiva, hostilidade, arrogância e ignorância nas redes sociais.
No entanto, nem tudo são trevas. Nossa pesquisa também mostra que as redes sociais podem ter um lado bom. Três em cada quatro pais que as usam regularmente relataram ter visto materiais com uma mensagem moral positiva pelo menos uma vez por dia – incluindo humor, apreciação da beleza, criatividade, bondade, amor e coragem. E pode ser que a visualização desse tipo de conteúdo positivo possa ter uma influência positiva nas atitudes e no comportamento dos jovens.
Isso acontece porque em páginas como o Facebook e o Twitter os usuários frequentemente se cruzam com novas perspectivas e circunstâncias, como diferentes religiões, culturas e grupos sociais. A exposição online a essas situações pode ajudar os jovens a serem mais compreensivos e tolerantes – e assim desenvolver suas habilidades de empatia. O contato com essas situações permite que eles vejam as coisas a partir de outras perspectivas de uma maneira que talvez não seriam capazes na “vida real”.
Desengajamento moral
É claro que o caminho entre essa exposição e a empatia não é automático. Isso pode ser visto nos altos índices de cyberbullying. De acordo com um relatório de 2015, 62% dos jovens de 13 a 20 anos que já sofreram bullying reportaram algum grau de cyberbullying – o que mostra que a empatia nem sempre está presente em ambientes virtuais.
Há ainda a questão da própria natureza da internet, com a sua ilusão de invisibilidade e anonimato, o que faz com que as pessoas possam se comportar diferentemente online em relação a como agiriam na vida real. Isso por levar a um “desengajamento moral”, quando as pessoas são capazes de agir imoralmente enquanto continuam vendo a si mesmas como pessoas morais. É esse desengajamento que provavelmente encoraja o cyberbullying.
No entanto, embora possa parecer tentador a alguns pais simplesmente proibir o uso de redes sociais, é improvável que essa seja uma estratégia bem-sucedida no longo prazo. Afinal, as elas não vão desaparecer. Em vez disso, precisamos entender melhor a relação entre o seu uso e os valores morais e o caráter de um jovem. Com nossa pesquisa, esperamos conseguir oferecer conselhos construtivos a esse respeito baseados em evidências.
É claro que o ambiente online é um terreno moral que requer uma navegação hábil. Ao entender como as rochas – como o desengajamento moral – podem ser evitadas, podemos ajudar a criar uma rota mais segura e suave para os jovens.
*Blaire Morgan é pesquisadora do Jubilee Centre for Character and Virtues da Universidade de Birmingham, no Reino Unido.
©2020 The Conversation. Publicado com permissão. Original em inglês.