O desenvolvimento de uma criança é um processo delicado. Muitos fatores estão em jogo e não estar atento a essa complexidade pode ser um grande erro de pais e educadores. Foi pensando nisso que escolas têm usado como recurso a metodologia da psicomotricidade relacional, um braço da educação física associado à psicologia, cujas origens remontam à década de 1970.
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“Com a psicomotricidade relacional, a gente consegue trabalhar questões voltadas principalmente para o aspecto socioemocional, e não apenas para o aspecto cognitivo, como as escolas costumam fazer, e assim as crianças saem mais fortalecidas”, explica Marianna Canova, mestra em Educação e diretora da escola Peixinho Dourado, de Curitiba, que implantou sessões de psicomotricidade relacional no cotidiano escolar. “Trata-se de olhar para a criança inteira, não fragmentada”.
Naila Cristofolini, mãe do Benício, de 3 anos, tem aprovado as aulas. “Além de trabalhar as habilidades motoras, num ambiente seguro, sem intervenções de adultos, onde as crianças podem expor toda sua potencialidade e criatividade, a psicomotricidade relacional trabalha a socialização em grupo, que foi muito prejudicada com a pandemia”, conta ela. “Esse trabalho em grupo está sendo maravilhoso para o Benício. Percebo que após a aula ele se sente mais leve, mais alegre, com mais autonomia”.
Nas sessões semanais, são utilizados bolas, arcos, bastões, cordas, tecidos e caixas num contexto de brincar não direcionado, de movimento espontâneo. “A gente não direciona a atividade, a criança é que traz o desejo dela inconsciente, daquilo que ela quer brincar”, explica a educadora física e psicomotricista Fernanda Fernandes, professora do Peixinho Dourado.
Com isso, trabalham-se por meio do jogo simbólico e do faz-de-conta os aspectos sociais, cognitivos e comportamentais das crianças, desenvolvendo a aceitação de limites, o ajuste positivo da agressividade, a elevação da autoconfiança, o aprimoramento das potencialidades individuais e a afetividade nos relacionamentos. Assim, inserida no currículo escolar, a psicomotricidade relacional traz benefícios para todas as crianças e pode atuar como fator preventivo em relação a diversos problemas de desenvolvimento psicossocial.
Uma visão integral
Isso é ainda mais válido no contexto atual, já que, segundo Fernanda, a pandemia de fato trouxe muitas dificuldades de socialização para as crianças. “Houve também déficit nas questões motoras, porque a criança, para se desenvolver, tem necessidade de explorar”, diz ela. É precisamente essa consciência da integralidade da experiência da crianças que está na base da psicomotricidade relacional, isto é, a noção de que tudo que se trabalha corporalmente está ligado ao nosso emocional.
“As crianças trazem muitas questões emocionais e de aprendizagem que estão interligadas. Por exemplo: se ela tem dificuldade para escrever, em geral tem também pouco equilíbrio e coordenação motora”, analisa Fernanda. Nesse sentido, o caminho que o psicomotricista pode abrir é o de impulsionar as características positivas da crianças, o que por tabela contribui para o seu desenvolvimento psicossocial.
“Não se foca o problema em si, mas o que a criança tem de bom. Crianças agressivas, por exemplo, gostam de pular, desafiar o medo, etc. O que a gente faz é enaltecer essas características”, comenta Fernanda. “Tivemos um caso de criança agressiva com os coleguinhas, e pudemos ajudá-la enfocando o positivo, aquilo que ela sabe fazer bem. Isso permitiu que ela se sentisse capaz e amada. A forma negativa de chamar atenção ficou em segundo plano e ela foi inserida no grupo: passou a ensinar os outros a subir, escalar, amarrar pontas, enfim, usar sua energia em coisas boas”.