O jornal norte-americano The New York Times publicou uma fotografia impressionante nessa segunda-feira (23/10): uma equipe de cirurgiões realizando uma operação em um feto de 24 semanas, com o uso de uma microcâmera inserida no útero da mãe – um procedimento relativamente recente, ainda em fase de experimentação. A cirurgia foi realizada no Hospital Pediátrico do Texas, em Houston.
O feto foi diagnosticado com um severo problema de espinha bífida – quando a espinha dorsal e a medula espinhal não se desenvolvem adequadamente, causando geralmente inaptidão para caminhar, acúmulo de líquido no cérebro, falta de controle na bexiga e outras complicações. A cirurgia não corrige completamente o problema, mas pode diminuir as complicações e o grau de deficiência.
O feto recebeu uma injeção de anestesia antes de se iniciar a operação, que durou três horas. O procedimento foi conduzido pelo obstetra Michael Belfort e pelo neurocirurgião pediátrico William Whitehead, que desenvolveram um tipo de cirurgia muito mais promissor para esses casos do que o procedimento padrão.
A equipe fez uma larga incisão no abdômen da mãe – Lexi Royer, de 28 anos –, colocando para fora o seu útero, e fez dois pequenos cortes de 4 milímetros no órgão. Em um deles, foi inserido um fetoscópio, um pequeno telescópio com câmera e lâmpada. O outro corte foi usado para outros pequenos instrumentos. O líquido amniótico foi retirado e em seu lugar foi colocado dióxido de carbono, para manter o útero expandido.
Esperança
Lexi e seu marido, Joshua, de 29, descobriram que esperavam um filho em maio. Ela já tinha tido um aborto espontâneo e tinha dificuldade para engravidar. Quando descobriram o problema do seu bebê, os médicos sugeriram o aborto – ao The New York Times, Lexi diz que se sentiu realmente pressionada a abortar.
Mas ele poderia ser o único filho que eles teriam. Pesquisando na internet, o casal encontrou grupos no Facebook de pais que passaram pelo mesmo problema – e descobriu que muitos deles reportaram bons resultados de um procedimento cirúrgico que os médicos de San Diego, onde mora o casal, nunca tinham ouvido falar: cirurgia fetoscópica.
No começo de setembro, eles foram a Houston e descobriram que a cirurgia era promissora para o bebê. “O seu tornozelo se flexiona, o que é um sinal muito bom de que ele pode ser capaz de andar”, explicou a mãe ao jornal. “E mesmo se não puder, precisar de uma cadeira de rodas não arruína a qualidade de vida de uma pessoa”.
Além disso, os médicos disseram que a cirurgia teria boas chances de fazer com que o bebê não precisasse implantar um instrumento para drenar o excesso de líquido no cérebro – o que seria necessário durante toda a sua vida, exigindo que a peça fosse substituída de tempos em tempos, o que aumenta o risco de infecção.
Realizada a cirurgia, Lexi confessa que a recuperação é dolorosa, mas não se arrepende. “Eu sinto que era definitivamente a coisa certa a se fazer”, disse. “Ver o ultrassom e como ele está bem, movendo seus pés e tornozelos, me deixa muito feliz”. O bebê deve nascer em janeiro.
Cirurgia
A cirurgia pré-natal para corrigir a espinha bífida não é uma novidade. No início, havia muito cuidado: a cirurgia só era feita se o problema mostrasse ser letal – a minoria dos casos. Mas a cirurgia pós-natal se mostrava muito pouco eficaz.
Como parte do dano causado pela espinha bífida é devido ao líquido amniótico, que é tóxico para o tecido nervoso exposto pelo problema, na década de 1990 a cirurgia pré-natal começou a ser praticada mais largamente. Um estudo de 2011 confirmou que a operação, se feita antes do nascimento, era bem mais eficaz que se feita depois.
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A novidade da cirurgia realizada em Houston – um procedimento experimental – é que na operação comum não se retira o útero de dentro do abdômen da mulher: faz-se um corte no abdômen e no útero e opera-se o feto diretamente. Na cirurgia fetoscópica, o útero é retirado – mas não desatado do corpo da mulher, é claro – e a operação é feita através de uma câmera. A cirurgia comum, devido ao amplo corte feto no útero, aumenta o risco de que o bebê nasça prematuramente.
Para treinar para o procedimento, Belfort e Whitehead operaram ovelhas e criaram um simulador feito com uma bola do tamanho de uma bola de basquete – que, por sua vez, é do tamanho de um útero às 24 semanas de gestação. Dentro da bola, eles “operaram” uma boneca revestida com pele de frango. Eles repetiram o procedimento mais de 30 vezes e pelo menos duas vezes por mês voltam a treinar, para manter as habilidades em dia.
A primeira cirurgia do tipo aconteceu em julho de 2014. Os resultados têm sido bons: nenhum feto morreu, poucos precisaram de drenos e algumas das mães puderam até mesmo dar à luz por parto normal – algo impossível no procedimento comum.
Com informações do The New York Times.
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