Com o isolamento social necessário para mitigar os efeitos da pandemia do novo coronavírus, uma opção antes abraçada apenas por uma pequena parcela se tornou a regra para as pessoas que fazem acompanhamento psicoterapêutico: a psicoterapia online. Não é de se descartar que, passada a quarentena, muitas pessoas pensem em continuar nessa modalidade. Afinal, faz diferença encontrar-se presencial ou virtualmente com seu psicoterapeuta?
“Estudos sobre a viabilidade da psicoterapia online têm sido feitos desde o início dos anos 2000 em países como Estados Unidos, Austrália, China, Canadá e Reino Unido”, explica a psicóloga Vitória Baldissera de Souza, que comparou as duas modalidades de acompanhamento em sua dissertação de mestrado. “Esses estudos têm indicado que o efeito da psicoterapia online é muito parecido com o da presencial, seja na redução de sintomas, no nível de satisfação do cliente ou na formação do vínculo terapêutico”.
Por isso, segundo Vitória, a psicoterapia online, que foi liberada pelo Conselho Federal de Psicologia em 2018, não precisa se limitar a ser um recurso para momentos como o atual. “Às vezes a pessoa muda de cidade, mas não quer trocar de psicólogo. Às vezes é migrante e quer conversar com um psicólogo da sua língua nativa”, diz ela. Mas a modalidade online não é indicada em todos os casos.
“Um limite que precisa ser muito bem considerado – depois que a gente passar esse período de distanciamento social – é se a pessoa vai se beneficiar da psicoterapia online. Às vezes, dependendo da demanda, a psicoterapia online pode acabar alimentando o problema da pessoa – no caso de pessoas tímidas, com síndrome do pânico e dificuldade de sair de casa, com ansiedade social ou com vício em tecnologia”, exemplifica a psicóloga. “Às vezes a hora da terapia é o único momento da semana que a pessoa tem para sair de casa e assim treinar uma série de habilidades e fazer vários enfrentamentos”.
Nesses casos, e mesmo em outros em que o psicólogo entender que a modalidade presencial seria mais benéfica para o paciente, é necessário que as sessões online sejam vistas como uma solução provisória. “Num momento emergencial, a psicoterapia online deve ser indicada e utilizada. Mas a longo prazo é preciso pensar algum tipo de transição para o presencial”, explica Vitória.
Experiência
A irmã de Vitória, Marina Baldissera de Souza, faz psicoterapia online desde antes da quarentena. Ela, que mora em Florianópolis, precisou passar um período na casa dos pais, em Curitiba, no começo deste ano. “Nesse período, comecei a fazer terapia com outra psicóloga, para tentar seguir outra linha de terapia. Gostei do trabalho dela e para continuar a fazer terapia com ela, decidimos começar a fazer sessões online”, conta Marina.
Para ela, a comunicação entre cliente e terapeuta ganha uma desvantagem e uma vantagem nessa modalidade. “Como a velocidade da internet pode comprometer o áudio e o som, a sessão exige certa paciência”, diz. “Mas caso dê alguma crise de choro na sessão ou eu acabe saindo angustiada por alguma coisa que foi conversada, não preciso me expor no transporte público, pois já estarei em casa. Isso acaba me deixando um pouco mais à vontade para me abrir”.
Vitória identifica ainda que pode haver uma lacuna quanto à linguagem corporal na comunicação entre o psicólogo e o cliente. “Perdemos informações que teríamos se a sessão fosse presencial – se a pessoa está mexendo muito as mãos, batendo o pé ou de braços cruzados. Perdemos conteúdo nisso”, explica. “Por outro lado, a câmera nos coloca em uma distância menor do rosto da pessoa e conseguimos acessar coisas que na sessão presencial não conseguiríamos – um olho lacrimejando, uma expressão de preocupação”.
A psicóloga ressalta, porém, que essas particularidades na comunicação não afetam a formação de vínculo entre profissional e cliente, segundo o que a pesquisa tem demonstrado. No entanto, ela alerta para outro fator: a segurança digital. “O psicólogo deve ter um bom programa de proteção de dados no seu computador e solicitar que a outra pessoa também tenha. Os dois devem estar atentos ao risco inerente de vazamento de dados em qualquer situação em que utilizemos a internet”, orienta Vitória. “É preciso escolher muito bem o programa. Ele deve ter criptografia – idealmente de ponta-a-ponta – e não só antivírus, mas proteção contra qualquer tipo de hackeamento”.