Chegar à tão sonhada aposentadoria pode ser um alívio para muitas pessoas. Se preparar financeiramente talvez seja o maior desafio da maioria que planeja essa etapa da vida. O que muitos esquecem, porém, é que essa mudança de chave pode afetar tanto a rotina que provoca abalos emocionais em quem não está pronto para os anos que virão pela frente.
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Para Renato Mello, de 67 anos, foi uma mudança bem significativa. Aposentado há quatro anos, durante boa parte da vida foi acostumado à adrenalina comum a um grande executivo: muitas viagens e negócios, mais foco na carreira e menos na vida pessoal. Quando não se viu mais motivado a trabalhar, decidiu parar. “Foi no momento certo. Ainda com saúde para aproveitar um pouco mais aquilo que gosto de fazer, como praticar esportes”, revela.
Para a mulher dele, Helena Mello, de 59 anos, também teve início uma fase diferente. Ela parou de trabalhar logo no início do casamento para se dedicar à família e, de repente, se viu com o marido muito mais tempo em casa. Ela ficou preocupada com a nova rotina dele. “Ninguém acreditava que um executivo que trabalhava '20 horas' por dia ia aguentar a vida doméstica”, afirma. Mas os dois se redescobriram como casal e passaram a viajar com mais frequência para ficar perto dos filhos e netos.
Virando a chave
Essa readaptação, seja pessoal, do casal ou até da família toda, é necessária, como explica a psicóloga especialista em idosos Regina Célia Celebrone. “O casal deve se readaptar, deve voltar a se conhecer, como quando casaram, ter novos objetivos e novos ideais”, diz. Os aposentados de hoje, segundo ela, são bem mais cheios de energia e joviais, têm muitos anos pela frente, por isso é essencial ter um plano.
Foi justamente com esse pensamento que Paulo Roberto Pereira, de 67 anos, planejou se aposentar. O engenheiro eletricista ficou por cerca de 15 anos em uma grande empresa, atuando na área técnica e gerencial, mas ainda durante a carreira foi buscar uma atividade na área artística. Ele estudou filosofia, psicanálise, cinema e teatro. Virou cineasta quando decidiu parar com o trabalho que exerceu a vida toda.
“Quando chegou a hora já estava cansado da vida na organização, no mundo empresarial”, comenta Paulo, que completa: “Fui buscar uma atividade na área artística onde pudesse falar o que não podia na estrutura organizacional”, confessa. No começo, ele admite que sentiu um pouco certa ociosidade, mas logo se reencontrou e hoje adora o ritmo mais calmo do que ele chama de segunda vida.
A psicóloga Regina Célia acredita que essa virada de chave transforma porque muda a maneira como a pessoa se vê e como os outros a enxergam. “A pessoa que era conhecida como o 'fulano de tal empresa' agora precisa saber quem é ele. Qual é a identidade dessa pessoa que voltou para casa”, alerta.
Lembre-se: é um processo
Uma das preocupações deve ser exatamente a autoestima, de acordo com Jocely Burda, psicóloga e professora na Faculdade Estácio Curitiba. “Muitos não se preparam psicologicamente para a aposentadoria e, quando chegam lá, não sabem o que fazer. Ficam ociosos e se sentem inúteis”. Ela acredita que atividades em grupo, voluntariado e ter novos hobbies são uma boa solução.
Não parar de trabalhar repentinamente, mas reduzir a carga horária também é uma alternativa, na opinião de Jocely. Ela esclarece, ainda, que o sentimento despertado para homens e mulheres pode ser bem diferente. “O processo difere um pouco porque a mulher se envolve com mais atividades: a família, a casa, a vida. Quando se aposenta volta o olhar para essas outras coisas. O homem normalmente é mais focado. No trabalho, por exemplo. E a mulher vê outras possibilidades”, acredita a psicóloga.
Planejar o lado financeiro é essencial, especialmente para quem quer manter o padrão de vida, mas ser uma pessoa ativa é o que vai garantir uma aposentadoria sem grandes problemas e com mais saúde. Assim como ter o apoio e o respeito dos familiares que terão de conviver mais de perto. “Amadurecimento traz equilíbrio e inteligência emocional. Conversar, não se omitir e nem se esconder dos problemas à medida que os conflitos vão surgindo é o que controla tudo isso”, conclui.