Especialmente nos últimos dois anos, com todas as dificuldades que a pandemia de Covid-19 trouxe, ouviu-se muito sobre burnout, um estresse crônico ligado ao excesso de trabalho, que causa exaustão. Só que o isolamento social e a sobrecarga nas casas de grande parte das famílias também trouxeram à tona uma reflexão sobre os mesmos sintomas relacionados à parentalidade.
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Para a pesquisadora em Parentalidade e Autocompaixão, Adriana Drulla, por mais que a Organização Mundial da Saúde tenha definido o burnout como uma síndrome relacionada ao trabalho, não há dúvidas de que o estresse crônico também pode estar ligado ao papel dos pais. “Isso é uma condição que os pesquisadores já chamam de burnout parental. É se sentir sobrecarregado com a rotina dos filhos”, revela.
Os estudos, segundo a pesquisadora, foram intensificados depois do início da pandemia, com o isolamento social e o fato de os pais precisarem, por um longo período, ficar muito mais tempo com os filhos. “É um esgotamento, assim como o profissional, resultante do fato de os pais terem muito mais desafios do que recursos”, afirma Adriana, que completa: “Quando a gente se sente incapaz, incompetente, aquela sensação de ter que carregar o mundo nas costas e não conseguir”.
4 estágios
Adriana esclarece que há uma escala diagnóstica quando se fala em burnout. “Primeiro é a exaustão. A pessoa se sente exaurida. De forma física”. É o caso de quem tem criança pequena que acorda muito durante a noite, segundo ela. Ou o cansaço emocional de quem tem filhos adolescentes, por exemplo.
“O segundo é um distanciamento emocional entre pais e filhos. Como forma de preservar energia. O terceiro é que a parentalidade deixa de ser fonte de satisfação. Aquilo que se sentia antigamente hoje não sente mais. Como se a parentalidade 'perdesse a graça'”, diz Adriana. O quarto estágio é um isolamento porque os pais começam a comparar a parentalidade que exercem hoje com o que gostariam de ser ou já foram no passado.
A principal consequência, revela a pesquisadora, é que esse abismo só aumenta, podendo causar culpa, vergonha e sensação de inferioridade e, nos casso mais graves, negligência e violência com relação à criança. “Até mesmo para os pais que não acreditam em punição e são contra agressão”, ressalta Adriana.
Mulheres sofrem mais
De acordo com Cristina Rodrigues, integrante da Escola de Pais XD Psiquiatra Geral e Perinatal, são as mulheres as que mais sofrem os efeitos desse esgotamento. “Estudos recentes demonstram que apesar do aumento notório do trabalho doméstico durante a pandemia, em 70% das casas esta sobrecarga recaiu exclusivamente sobre as mulheres. 45% das mulheres referem não ter ajuda alguma e 50% afirmam não terem tempo para si”, alerta.
A médica Danielle H. Admoni, psiquiatra na Escola Paulista de Medicina UNIFESP e especialista pela Associação Brasileira de Psiquiatria, diz que há uma dificuldade em identificar os sinais porque ser pai e mãe já é uma tarefa complexa naturalmente. “Quando os pais começam a repensar, deixar o autocuidado de lado, ter alteração de sono, de apetite, irritabilidade, ansiedade precisam pensar que algo está acontecendo”, destaca.
A psiquiatra concorda que as mães são as mais atingidas e diz que saber pedir ajuda é essencial. “Tem coisas que a gente pode delegar. Tem coisas que os pais precisam aprender a dividir e a deixar de lado e, principalmente, pedir ajuda”, sugere a médica. Segundo ela o desenvolvimento das crianças é afetado pelo esgotamento dos pais, por isso solucionar essa questão é essencial.
Em geral, quem percebe o problema são as pessoas de fora, enfatiza Danielle. A médica esclarece que voltar a olhar para si pode ser uma solução. “É importante voltar a ter uma situação prazerosa ao longo do dia, tentar atividades prazerosas em família. E se ficar muito ruim, procurar um profissional de saúde mental”, conclui.