Se virmos a vulnerabilidade como a coragem de revelar que somos imperfeitos, ela pode se tornar uma aliada na busca pela felicidade no casamento.| Foto: Unsplash/Anthony Tran
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"Apenas seja você mesmo". O famoso conselho não é tão simples de ser colocado em prática quanto parece. E isso em qualquer relação que estabelecemos, seja com a família, com os amigos e até mesmo com o cônjuge. Sermos nós mesmos – de verdade – diante dos outros, exige muita coragem. E, por mais contraditório que pareça, essa coragem só pode ser fruto de uma disposição interior temida por muitos de nós: a vulnerabilidade.  

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E não é estranho que sermos nós mesmos seja um desafio? Segundo a psicóloga clínica e organizacional Carmem Simon, isso acontece porque "passamos alguns anos construindo nossa imagem, isto é, aquilo que queremos que os outros percebam que somos", comenta. E "geralmente criamos mecanismos para proteger nossos pontos vulneráveis do 'ataque' externo".  

Em uma relação matrimonial, tudo isso ganha ainda mais intensidade. Afinal, o casamento é um espaço de intimidade no qual manter uma imagem arquitetada se torna insustentável com o passar do tempo. É por isso que permitir-se ser vulnerável é importante em todas as relações, mas no casamento é essencial.

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Longe de ser uma fraqueza 

Se procurarmos no dicionário o significado da palavra vulnerabilidade, vamos encontrar algo relacionado à fraqueza, à fragilidade e a estar sujeito a ser ferido, ofendido, derrotado. Por outro lado, se pensarmos a vulnerabilidade como a coragem de revelar quem realmente somos – imperfeitos –, ela pode se tornar uma tremenda aliada na busca pela felicidade.  

Carmem explica que se fazer vulnerável "é 'despir-se' diante do outro, tirar a persona (máscara do teatro grego) e revelar-se, abrir-se, dar-se a conhecer nas suas potências e fraquezas". Essa definição soa como algo que é – ou, pelo menos, deveria ser – intrínseco à vida conjugal.  

No entanto, o medo de revelar o pior de nós acaba por impedir esse aspecto tão bonito da intimidade humana e que só os esposos podem usufruir. "Acredito que a grande dificuldade está na vaidade de manter a imagem perfeita, idealizada e tão valorizada", opina Carmem.

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Três passos para perder o medo 

Para a psicóloga clínica e pós-graduanda em Gestalt-Terapia Juliana Pimenta de Andrade, o primeiro passo é buscar entender o quê diante do outro nos faz querer esconder-nos. "Isso pode ter influências de outras relações, em preconceitos sofridos, em palavras e ações 'engolidas', em questões mal resolvidas, em não acolhimento dessas fragilidades em outras relações íntimas, em crenças sociais e culturais introjetadas relacionadas a demonstração de emoções, como 'homem não chora', 'não se pode confiar em ninguém', etc".  

Já o segundo passo está em compreender que nos relacionar envolve correr riscos. "Risco do outro nos alegrar, nos surpreender, nos decepcionar, nos entristecer", comenta a psicóloga. E será que a pessoa que escolhemos para passar o resto da vida juntos não é uma pessoa com a qual vale a pena correr todos esses riscos?  

Depois disso, o terceiro passo é, simplesmente, "aceitar que não somos perfeitos, não somos totalmente felizes, animados, doces, pacientes, e por aí vai, muito pelo contrário", lembra Juliana. "Até o último dia de nossa vida estaremos em processo de crescimento e desenvolvimento, sempre teremos algo para melhorar como pessoas e principalmente como esposo e esposa. Será na própria relação que vamos nos construindo".

Ferramenta de manipulação, não! 

Contudo, é preciso muito cuidado para não compreender vulnerabilidade como uma falta de personalidade. Isso porque esse tipo de entendimento abre portas para abusos dentro da relação.  

De acordo com Juliana, a vulnerabilidade pode se tornar uma ferramenta de manipulação quando um dos cônjuges deixa de respeitar a diferença do outro, quando não percebe a imperfeição do outro e, principalmente, quando não compreende que o outro não vai sempre lhe agradar e nem superar todas as suas expectativas. Ou seja, quando o esposo ou a esposa se coloca "em um lugar de superioridade em relação ao outro, e isso já demonstra uma relação que não está em harmonia, em equilíbrio".