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O Davi tem quatro anos, é um menino muito amado e de um olhar incrivelmente encantador. Ele é um querido, muito carinhoso, risonho e adora abraços, é ativo, está sempre de bom humor e querendo brincar, é um verdadeiro anjinho de Deus na terra, um serzinho iluminado. Ele é extremamente explorador, observador e sempre atento ao que está acontecendo ao seu redor, presta atenção aos detalhes, consegue ver uma formiguinha no muro e acompanhá-la até que desapareça do seu olhar e é capaz de assoprar um dente de leão e ficar acompanhando suas sementinhas se dispersarem no ar. Tem uma memória visual admirável, nunca vi coisa igual. Ama música, é organizado, nem precisa pedir para que guarde os brinquedos, para tirar o prato da mesa ou colocar as almofadas no lugar. Ama a natureza, ficar com os pés no chão, sentindo a energia que a terra traz e apreciando a chuva caindo do céu e tocando sua mãozinha, com aquelas covinhas nos dedos, expressando essa sensação de uma forma tão sublime, é lindo de se ver. Ele é a personificação do amor verdadeiro, do altruísmo, da empatia. É um pedaço da minha alma e desperta em mim um sorriso sincero e orgulhoso.

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Ele também tem autismo. Foi diagnosticado há quase dois anos e, recentemente teve a confirmação de mais um diagnóstico, epilepsia. Cerca de 30% dos casos de autismo tem essa comorbidade associada. Não é fácil, não é bonito, não é previsível. Ele tem movimentos repetitivos (as estereotipias), é não verbal (ainda não fala) e tem dificuldades de socialização. Ele tem uma busca sensorial constante, precisa desta estimulação para se regular, ficar tranquilo, ele precisa de rotina, muita rotina.

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Antes disso tudo, desta aventura inexplicável e surpreendente, eu era uma sonhadora, voava muito alto, o céu era o limite. Era enérgica, praticava esportes radicais e queria conquistar o mundo. Um espírito livre, otimista e curioso, sem muita rotina, apenas vivia o momento. Ao mesmo tempo, tinha metas claras e bem definidas, fazia planos, era organizada. Estabelecia meus limites, físicos e financeiros, e me mantinha sempre informada. Tinha uma carreira que me permitia conhecer lugares incríveis, viajar o mundo. Eu tinha sempre uma listinha de coisas a fazer no ano seguinte. Acredito que ainda tenha um pouco disso, com algumas belas e intensas mudanças. Virei ativista pela inclusão, o autismo está na minha pauta diária, na teoria e na prática.  Entretanto, com a rotina de terapias, consultas, escola, exames, clínicas e hospitais, trabalhar “fora” tinha se tornado absolutamente inviável e o Davi precisava que seus dias fossem bem regulados. Não estava conseguindo ficar em nenhum lugar por inteiro, mas tinha uma boquinha para sustentar e um homenzinho que precisava de um apoio para encarar a primeira infância de forma leve, porém constante. Então resolvi arriscar tudo e fazer aquilo que o meu coração pedia tanto e se enchia de plenitude, ficar com ele, ser sua voz, segurar na sua mão. Pedi demissão! Foi uma das melhores decisões que tomei na vida, ser a dona do meu próprio negócio, da minha própria vida e conciliar tudo isso. Empreender foi preciso, e é fantástico!

 Desde pequena sou fascinada pelo universo da criação. Costurava as roupas das minhas bonecas com pontos bem grosseiros, achava o máximo, eu devia ter uns 6 anos. Com oito anos minha avó me apresentou o crochê. Ela usava os fios de costura que sobravam das confecções e fazia verdadeiros obras de arte, queria fazer igual. Crescidinha, fiz faculdade de administração, quatro pós graduação, um MBA e algumas outras especializações por aí, o mercado exigia e eu ia seguindo o fluxo. Enfim abri o meu atelier e decidi resgatar a minha essência, fazer do meu hobby a minha profissão. Comecei a dar aulas de artesanato, busco ajuda-las a se descobrirem e se transformarem, através das artes manuais, dos seus talentos, dos seus sonhos, mostrando que são capazes de gerar renda, fazendo o que se amam.

                Dificuldades? Temos, claro que temos! Mas encaramos com leveza e bom humor, assim somos nós. O Davi me ensinou a enxergar a vida como um enigma grande e complexo, um enorme quebra cabeças cujas peças principais somos nós, e só conseguiremos encaixá-las se olharmos com simplicidade e coragem.  Agora consigo ver o mundo através do prisma de emoção, com a sensibilidade dele, aprendi o que é entrega, disponibilidade, paciência, compreensão, renúncia. Aprendi a aproveitar o tempo, a observar, a vibrar com as pequenas vitórias, comemorar as pequenas conquistas, a chorar só de alegria, a caminhar despretensiosamente e com sabedoria. Aprendi a agradecer, sorrir com a alma, ser feliz.

Silvia Colodel

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Mãe solo, artesã, ativista pela inclusão, crochet design e costureira criativa