Foto de fisioterapeuta que trabalha nas UTIs de COVID 19, em Curitiba PR
Neusa sempre sonhou em cuidar das pessoas, e hoje ela prova o cuidado de uma forma muito intensa durante a pandemia, nas UTIs de COVID 19| Foto:


Neusa Machado Cabral Beleza foi criada no interior maranhense, na cidade de São Domingos do Maranhão, e sempre sonhou em estudar na capital, levar a vida numa cidade grande, “achava ali muito pequeno para meus sonhos, para o que eu queria da minha vida”. Aos 14 anos foi morar com os primos em São Luís para estudar. Ali começou a realização de um sonho e uma vida de muito empenho para trabalhar na área da saúde.

Pilu - como seu pai carinhosamente a chamava - deixou a casa dos pais e a visita à família se limitava aos feriados e datas especiais. Mas todos permaneciam unidos, além dela, seus pais têm mais um filho. Os conselhos, apoio e confiança dos pais, sempre a sustentaram.

 “Quando eu ia para casa meu pai me tratava tão bem, meu Deus, muito carinho e amor. Mas claro, sabia ser firme quando precisava”, lembra a fisioterapeuta. Força e Coragem, este era o bordão do seu pai, dito ao fim de cada ligação.  

Em 2010, aos 17 anos foi aprovada na Universidade Federal do Piauí (UFPI), campus de Parnaíba, no curso de Fisioterapia. Passaram o vestibular, os anos de curso, a residência e, em 2019, a fisioterapeuta se muda para a capital paranaense. Ela e seu marido, Joelmy Beleza, também fisioterapeuta, trabalham no Hospital de Reabilitação Ana Carolina Xavier e Hospital de Clínicas da UFPR, em Curitiba, respectivamente.

De sonhadora à heroína

Aos 28 anos, Neusa trabalha atualmente nas UTIs de COVID 19, onde presencia de perto o que as pessoas estão sofrendo e prova o sentido do seu trabalho, o cuidado com as pessoas e a luta para a vida delas. “Eu fiz um juramento, eu aprendi a cuidar e as pessoas estão precisando de mim.  Somos nós fisioterapeutas que manipulamos a respiração mecânica, o respirador. Nós participamos da entubação e extubação do paciente ”, destaca Neusa.

“Tem sido algo que eu nunca imaginei viver. Nós imaginamos uma pandemia em épocas sem tecnologias, sem vacinas. Nunca imaginei viver isso nessa proporção. Uma pessoa que não tem problema algum de saúde, chega no hospital e vai só piorando, vem a óbito”. UTIs lotadas, gente saindo e entrando, sobrecarga de trabalho, profissionais que se contaminam, que estão longe da família, sobrecarga emocional. Até é proposto um acampamento psicológico, mas, o tempo para realizar? Uma correria! E os profissionais fazendo tudo o que está ao seu alcance.

 “O momento mais forte para mim é quando os pacientes estão acordados, mas com insuficiência respiratória e preciso avisar que serão entubados. Muitos pegam em nossas mãos e dizem: promete para mim que não vai me deixar morrer? Muitos fazem daquele um momento de despedida. ”

A dor do outro é a minha dor

Entre tantas mudanças e desafios no trabalho, a fisioterapeuta recebeu, em março desde ano, a notícia de que seu pai não estava bem de saúde, fez todos os exames e testou negativo para COVID 19, mas ainda sim continuava com a saúde ruim. Francisco de Assis Cabral dos Santos foi diagnosticado com um linfoma.

  • Neusa se casou em 2019 e logo após o casamento veio morar em Curitiba PR


Neusa voltou ao Maranhão para cuidar de seu pai. “Foi aí que vi o meu pai como nunca tinha visto. Triste, cabisbaixo e lembro-me de um momento, quando eu perguntei se ele estava com frio e ele só mexeu a cabeça, não conseguiu falar e eu o cobri”

Pouco tempo depois ele precisou ficar numa UTI. E nesse momento, Neusa acabou conhecendo outro lado, da fisioterapeuta que trata os pacientes nas UTIs nesse período de pandemia à filha de um paciente, que conversava com o médico por ligação uma vez ao dia para saber do pai, para o boletim médico. Ela que não podia visitar e conviveu com todos os protocolos realizados nesse período de distanciamento social com familiar na UTI. Seu pai não resistiu e faleceu em 5 de junho de 2020.

“Eu estive do outro lado e não é fácil. Quando eu voltei para o trabalho falei para os médicos: uma ligação não é o suficiente, uma ligação por dia não é o suficiente. Se a família não atender num primeiro momento, retornem, pelo amor de Deus. Sei que é corrido. Mas pedi para que fossem muito sensíveis neste momento e explicassem de um jeito que a família entenda e passassem segurança, a família precisa muito neste momento. Que sejamos sensíveis às famílias neste momento, apesar da correria e do cansaço no trabalho”, conta Neusa.

Momentos de leveza?

Nos momentos mais difíceis se encontram também os mais felizes, porque se dão nas pequenas coisas. Neusa conta de uma experiência recente com a extubação de um paciente.

“O paciente fraco ainda, depois de ser extubado, olhava fixamente para mim, um olhar dizendo: muito obrigado! Com uma lágrima escorrendo no rosto. Essas alegrias tem um valor muito grande. Tirar o tubo de um paciente é a melhor sensação do mundo hoje. Eu fico muito feliz ”

Um misto de sensações, mas que a faz perceber que esse tempo não é somente de dor e como ela menciona que o fim não é só morte. Há casos de sucessos, de recuperação, e a força dos profissionais de saúde e digo até mesmo das pessoas de modo geral, são os casos de recuperação. A vida das pessoas é a própria Esperança.

“Hoje mesmo eu acordei pensando em todas as coisas, e lembrava muito do que meu pai me dizia: Força e Coragem! ”, finaliza.

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