O homeschooling está em alta no Brasil. O que antes era desconhecido do público geral, agora está em constante exposição na mídia e nas redes sociais. O meio político discute a questão no congresso nacional e está pautada até na atual campanha presidencial. A produção de pesquisas acadêmicas sobre este assunto também está em constante elevação, com trabalhos desde o ensino médio até o doutorado, e foi tema recente de redação em concursos vestibulares. Na área da justiça, chegou ao ápice após o reconhecimento de repercussão geral no Supremo Tribunal Federal – STF, com julgamento marcado para o próximo dia 30 de agosto.
Tudo isso aponta para um futuro auspicioso. Mas há alguns possíveis inimigos de quem pratica a Educação Domiciliar e que na verdade são atitudes que precisam mudar. Aqui listamos apenas três.
Desarticulação
O movimento de homeschooling no Brasil sempre sofreu com a dificuldade de articulação e de engajamento das famílias educadoras. O fato de que boa parte delas possui receio de enfrentar problemas com a justiça, deveria ser suficiente para estimular a adesão e o apoio efetivo a entidades representativas como a Associação Nacional de Educação Domiciliar – ANED, mas não é o que ocorre. O número de associados está longe de refletir o crescimento de praticantes, e o trabalho da associação continua baseado na ação quase heroica dos dirigentes, impossibilitando avanços mais ousados na sua esfera de atuação.
Talvez porque há quem avalie que o ideal seria praticar as atividades de homeschooling com o mínimo possível de exposição pública, como forma de tentar passar desapercebido da sociedade e do estado, e portanto livres de qualquer tipo de imposição. Há também aqueles que a princípio mostram-se tão seguros do direito inquestionável sobre a condução educativa dos próprios filhos, que consideram até inadequados os esforços para a atuação política e jurídica em favor do homeschooling. Acreditam corretamente que nenhuma interferência externa seja justificável, e afirmam que nada os poderá impedir de conduzir suas atividades do modo como desejarem. No entanto, estas mesmas famílias, quando são denunciadas à justiça, batem às portas de quem está na linha de frente na defesa dos direitos das famílias educadoras, mesmo que não os tenham apoiado pessoalmente.
É importante pensar como esta realidade irá evoluir, uma vez que estamos prestes a entrar em uma etapa do homeschooling brasileiro, na qual teremos um posicionamento jurídico que poderá vincular toda e qualquer ação e balizar o desdobramento de ações governamentais. O que mudará a partir de então? Será que finalmente as famílias educadoras que esperam passivamente para ver o desenrolar das situações mudarão de atitude e participarão mais efetivamente, a fim de impedir que uma indevida ou exagerada regulamentação transforme a educação domiciliar em algo impossível de se praticar? Pedindo a Deus que isto não se concretize, é possível imaginar que tudo ainda venha a piorar caso não ocorra este despertamento.
Seja qual for o cenário pós STF, haverá muito trabalho a ser feito, mas que dependerá muito da capacidade de articulação das famílias educadoras.
Perfecionismo
O ambiente de uma família educadora não é perfeito. Até porque somos todos humanos. A busca excessiva por um padrão de perfeição, como se fosse necessário provar o tempo todo que o homeschooling realmente funciona ou que é melhor do que a escola, pode trazer muitos prejuízos. Uma das grandes vantagens que uma família educadora possui é exatamente a possibilidade de aprender com os erros, corrigindo-os rapidamente. Deixar para trás algo que não deu certo, seja por qual for o motivo e avançar em direção a um novo modelo ou projeto, não é uma tragédia ou algo que deva causar abatimento e sofrimento aos pais. Ao contrário, é a oportunidade de mudar para alcançar objetivos, o que não seria possível, ou ao menos seria muito difícil de acontecer em um ambiente escolarizado. Mesmo as famílias educadoras que adotam métodos mais profundamente estruturados podem a qualquer tempo dar meia volta em algum aspecto.
O discurso de alguns especialistas em educação beira ao surreal, quando pintam um quadro tão perfeito do ambiente escolar e de sua potencialidade, que obviamente não corresponde à realidade. O homeschooling não precisa deste tipo de artifício para estabelecer-se como uma alternativa ao ensino tradicional. Basta concentrar-se nos ótimos resultados, e observar que estes não são frutos de uma caminhada diária perfeita, irretocável.
Livrar-se do perfeccionismo enaltecerá um aspecto valioso da educação domiciliar, a liberdade para encontrar os melhores caminhos, e livrará muitas famílias da frustração e do desânimo.
Guerra contra a escola
Qualquer tipo de competição contra a escola é uma atitude a ser evitada, para não gerar comparações muitas vezes inadequadas pois trata-se de plataformas com parâmetros muito diferentes, por exemplo quanto a avaliações de aprendizagem. Manter um discurso combativo e negativo em relação ao método escolar como se este fosse um inimigo a ser vencido, ou querendo com isso enaltecer as qualidades do homeschooling não é uma estratégia inteligente, ou nem mesmo justa. Há muitos recursos didáticos sendo utilizados neste exato momento por famílias educadoras ao redor do mundo, e que foram disponibilizados gratuitamente por escolas, institutos, fundações e universidades, gerando um grande benefício. O contrário também ocorre, quando os princípios e a experiência da educação domiciliar servem de inspiração para a implementação de mudanças no sistema escolar. É preciso entender que o direito familiar à escolarização é tão precioso e merecedor de defesa, quanto o de quem optou por outro modelo educacional, como a educação domiciliar. Ambos merecem respeito e que sejam garantidas as condições adequadas para o seu desenvolvimento.