Poucos dias antes da March for Life 2015, que ocorreu em Washington, o site latino da CNN publicou uma interessante reflexão de uma advogada feminista e pró-vida. Erika Bachiochi publicou um estudo sobre aborto e equidade entre os sexos no Harvard Journal of Law & Public Policy, da Universidade Harvard.
Confiram abaixo uma tradução do texto feita por mim. O original pode ser conferido aqui.
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Sou feminista e contra o aborto
As pesquisas que são realizadas rotineiramente desde a decisão da Suprema Corte sobre o caso Roe versus Wade indicam que há mulheres a favor de restrições ao aborto, e em maior proporção que os homens. Como isso ocorre? Por que uma mulher ia querer limitar um direito que a Corte lhe deu há 42 anos?
Como alguém que já apoiou o direito ao aborto, conheço bem a tentação de considerá-lo um símbolo da igualdade da mulher. Afinal, ter um filho inesperado parece interromper a capacidade de uma mulher determinar seu próprio futuro de acordo com suas próprias metas e ambições. Mais comovedor ainda: gerar uma criança quando se vive na pobreza ou quando já se está sobrecarregado em cuidar de outros pequenos, ou também quando há riscos para a saúde, tudo isso parece ser uma injustiça só conhecida pelas mulheres.
O aborto aparentemente oferece às mulheres uma resposta prática à responsabilidade desproporcionada que as relações sexuais nos deixam. Mas o aborto, frequentemente considerado uma solução para a gravidez inesperada em nossa cultura, tenta remediar uma assimetria sexual: o fato biológico de que as mulheres ficam grávidas e os homens não. Ele o faz ao atribuir apenas às mulheres a responsabilidade de cuidar de – ou prescindir de – um ser humano em desenvolvimento e por nascer.
O aborto não espera nada mais dos homens, nada mais da medicina e nada mais da sociedade em geral. O aborto trai as mulheres ao nos fazer crer que devemos ser como os homens – o que quer dizer, não ficar grávidas – para alcançar a paridade com eles, tanto de forma profissional, como social e educativa. Além disso, se somos pobres, estamos sobrecarregadas ou fomos abandonadas pelo pai da criança, ou se os gastos médicos seriam grandes demais para nós ou para nosso filho, a “responsabilidade social” nos obriga a abrirmos mão de nossa própria descendência.
As feministas de hoje nos animam. É esta realmente a igualdade que buscávamos há 42 anos?
Creio que a maioria das mulheres quer ver uma cultura que respeite e honre as mulheres, não apenas pelos talentos inumeráveis que como indivíduos trazemos para nossas profissões, comunidades e país. As mulheres também querem viver numa sociedade que, ao mesmo tempo, valorize nossa capacidade compartilhada, e certamente maravilhosa, de gerar um novo ser vivo. Queremos ser respeitadas pelo trabalho que fazemos como mães.
E se houvesse uma cultura em que se reconhece que a capacidade reprodutiva das mulheres não é um impedimento para nosso status social ? E certamente não é o alfa e o ômega das capacidades das mulheres, como algum dia o foi, mas sim como algo pelo que a sociedade mostre gratidão? No lugar de estruturar a sociedade em torno dos homens, que não tem essa capacidade e são livres de responsabilidades, não seria necessário que a sociedade se estruture em torno daquelas que, além de fazer tudo o que os homens fazem, também geram uma vida em seu ventre?
Tal reestruturação cultural em apoio ao cuidado da mulher – a qual buscam as feministas pró-vida – também beneficiaria aos pais desta geração. Muitos homens prefeririam dedicar muito mais tempo e atenção aos seus filhos do que o fizeram ou puderam fazer os pais das gerações anteriores. As políticas a favor da mulher, da criança e da família permitiriam precisamente isso.
Nem todas as mulheres se tornam mães, mas as que o fazem dependem do apreço que a cultura tenha pela gravidez e pela maternidade, por seu apoio social e profissional. Quando menosprezamos a criança que se desenvolve no útero, uma realidade científica que a maioria dos defensores do aborto chegaram a admitir, menosprezamos e distorcemos a mãe dessa criança. Fazemos crer que as mulheres têm direitos de propriedade sobre seu filho em desenvolvimento e que está por nascer (da mesma forma que os esposos um dia tiveram direito de propriedade sobre suas esposas).
Consentimos com uma lei desumana (protegida pela Constituição há 42 anos) para decidir o destino de outro ser humano, de uma criança vulnerável – seu filho. Fazemos tudo isso no lugar de oferecer o apoio familiar e social de que necessita, seja qual for a situação, e apreciar o papel que desempenha o milagre da vida humana.
Mas vivemos numa época em que falar desse milagre ou das diferenças biológicas entre os sexos parece pitoresco, como se agora tivéssemos chegado mais além do sexo no novo mundo da “fluidez de gênero”. Parece haver um esforço para apagar a noção de mães e pais, como se fazer isso ajudasse o progresso, como se a sociedade finalmente pudesse ser livre dessas velhas determinantes de homem e mulher.
Mas aqui está o problema: podemos fingir que não existem diferenças entre os sexos, mas são as mulheres que suportam a carga quando o fazemos. Tanto os homens como as mulheres fazem sexo, mas é a mulher quem fica grávida, a mulher é quem deve encontrar formas de cuidar e nutrir a criança que se desenvolve em seu útero com valentia e sacrifício, ou quem tem que fazer o impensável e colocar um fim na vida de seu próprio filho. Os homens podem fazer sexo, afastar-se e, com o direito que Roe lhes deu, o fazem cada vez mais.
É hora de admitir a verdade sobre a diferença sexual – esta bela e maravilhosa verdade – e moldar a sociedade para que haja prioridade aos que cuidam dos mais vulneráveis. E é hora de exigir mais, muito mais, da parte dos homens.
Erika Bachiochi
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Leia também:
– Entenda o que foi o caso Roe versus Wade, que legalizou o aborto nos Estados Unidos.
– Grandes mulheres pró-vida: Zilda Arns, Gianna Jenssen, Alveda King
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