Foram pelo menos 50 anos morando no hospital Beneficência Portuguesa, em Araraquara (SP). Maria Cotinha, ou só Cotinha, chegou lá ainda criança, após um atropelamento, e de lá saiu somente quando a instituição fechou as portas em 2015. Sem ter para onde ir, a senhora de pouco mais de 60 anos foi adotada por Gláucia Andressa dos Santos Gomes, com 30 anos na época, e funcionária do hospital. Agora mãe e filha comemoram uma importante conquista: Cotinha ganhou sobrenome e tirou seu primeiro RG.
Retribuição: 25 anos depois, enfermeira atende idosa que a tratou na infância
Na época, ainda que sem emprego, Gláucia não conseguiu deixar Cotinha à própria sorte. Ela contou recentemente ao EPTV, que quando o hospital fechou, ninguém quis ficar com a idosa. “Vi que, se abrisse mão dela, ela ia para um asilo, sem saber onde. Eu não podia fazer isso. Ela só tinha a mim”, contou Gláucia, que é cuidadora de idosos. Cotinha chegou ao hospital com cerca de 10 anos, junto com o irmão mais novo que logo faleceu. Nunca ninguém procurou pela menina.
Por não saber falar, Cotinha nunca conseguiu dizer seu nome verdadeiro e por isso recebeu este que tem até hoje, das mulheres que a acolheram no hospital. E por isso também, ela nunca teve sequer um documento de identificação. Mas desde que foram morar juntas, essa foi uma preocupação de Gláucia. Só que a falta de uma certidão de nascimento, sempre foi um empecilho para a regularização da situação de Cotinha.
Enfim, os documentos
Mas há poucos dias essa condição mudou. Com a ajuda de duas advogadas, Cotinha finalmente ganhou um sobrenome e pode tirar seu primeiro RG. Para isso, claro, a idosa precisava ter uma certidão de nascimento, que foi também providenciada e tornou oficial a data em que ela sempre comemorou seu aniversário: 12 de outubro. É no hospital, os funcionários sempre celebraram a vida de Cotinha no Dia das Crianças.
A certidão de nascimento ainda não tem o nome de Gláucia como mãe. Mas para incluir o sobrenome dela no documento, as advogadas usaram do princípio da afetividade, para que incluir o “dos Santos Gomes” de Gláucia, no nome de Maria Cota. “Não tem filiação na certidão de nascimento dela e colocar um sobrenome qualquer a gente falou que não teria necessidade se hoje a mãe dela de fato é a Gláucia”, explicou ao EPTV a advogada Giulia Negrini.
Para Gláucia, conseguir que Cotinha tenha um documento de identidade vai melhorar a qualidade de vida de sua filha. “Hoje posso viajar com ela. Imagina se eu fosse viajar com ela sem documento?”, avaliou a mãe. “Hoje eu posso ir para qualquer lugar. Ir ao cinema, ela paga metade”, brincou.
Adoção inversa
Apesar de se considerarem mãe e filha, as duas ainda têm muito a buscar juntas. Mesmo que agora Cotinha agora tenha o sobrenome de sua mãe do coração, Gláucia é considerada somente a cuidadora dela. O processo de adoção legal pode levar anos, mesmo com o pedido especial das advogadas. Hoje, o adotante no Brasil precisa ter 16 anos a mais do que o adotado e não o inverso. “A lei não tem previsão desse tipo de adoção”, explicou a advogada Adriele Teixeira. “Então o próximo passo é conseguir essa adoção inversa”, finalizou.
***
Recomendamos também:
****
Curta nossa página no Facebook e siga-nos no Twitter.