O baldaquino em torno do altar retrata a fauna e a flora brasileiras, remetendo à figura do paraíso bíblico (foto: divulgação/Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida).
O baldaquino em torno do altar retrata a fauna e a flora brasileiras, remetendo à figura do paraíso bíblico (foto: divulgação/Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida).| Foto:

Neste ano, a festa da padroeira do Brasil se reveste de um caráter especial. Em 12 de outubro de 2017, comemoram-se os 300 anos desde que a pequena imagem de Nossa Senhora da Conceição foi encontrada no rio Paraíba do Sul pelos pescadores João Alves, Felipe Pedroso e Domingos Garcia. Estima-se que neste mês mais de um milhão de devotos se dirijam até o interior paulista para visitar o Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida – 200 mil só no dia 12.

Mas é no dia 11 que, finalmente, será apresentada ao público a parte que faltava para completar a basílica: o mosaico da cúpula, formado por mais de 5 milhões de pastilhas estendidas por 2 mil metros quadrados, que retrata a figura bíblica da árvore da vida, rodeada de pássaros da fauna brasileira. Assim, estará concluído o Santuário Nacional – a segunda maior igreja do mundo, atrás apenas da Basílica de São Pedro, no Vaticano –, 71 anos depois do lançamento de sua pedra fundamental.

 

Uma basílica única no mundo

Algumas características fazem do Santuário Nacional uma igreja única. Não se trata apenas de suas dimensões monumentais, mas chama a atenção o cuidado com a concepção artística e litúrgica do local, assinada pelo artista sacro Cláudio Pastro, falecido há um ano.

Painel Painel “A evangelização do Brasil”, obra de Pastro em Aparecida. Divulgação/Santuário Nacional

“Pastro soube aproximar piedade popular e a liturgia, a fé do povo com a teologia, e assim, revelar uma Igreja de muitos rostos, cores e sotaques. Temos orgulho, do ponto de vista litúrgico-teológico e arquitetônico, de termos um espaço como o Santuário Nacional”, garante o padre Thiago Faccini Paro, assessor da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) no setor dedicado ao espaço litúrgico. “Em Aparecida, todos os espaços dialogam entre si. Cada cor, imagem, textura e material tem uma função e significado”.

Cláudio Pastro, falecido em outubro de 2016. Dibulgação/Santuário Nacional Cláudio Pastro, falecido em outubro de 2016. Divulgação/Santuário Nacional

O projeto arquitetônico do santuário data de 1947 e é assinado por Benedito Calixto Neto, que viajou naquele ano para a América do Norte a fim de estudar a arquitetura religiosa moderna. O projeto de Calixto é uma versão mais simplificada, mas maior, do Santuário Nacional da Imaculada Conceição, em Washington.

Não se tratou de nenhuma grande inovação, mas para Pastro esse era o grande trunfo da construção. Isso porque a basílica segue o estilo neorromânico, que remonta ao primeiro milênio e ganhou um revival no início do século XX. Para o artista, trata-se de um estilo arquitetônico especialmente apropriado para a liturgia católica, por sua austeridade, repetição de formas e espaços amplos.

Sobre os tijolos que revestem o templo – de barro cozido, assim como a imagem de Nossa Senhora – Pastro projetou 34 painéis retratando cenas do Evangelho. Além disso, há outros quatro painéis maiores, retratando patriarcas, profetas, apóstolos, santos e personagens da história da Igreja no Brasil, tudo em azulejo. A opção pela azulejaria se baseou na herança da colonização portuguesa do país e na durabilidade do material – no Brasil, a umidade degenera as pinturas com facilidade.

O altar, no centro da basílica, é circundado por linhas em ziguezague que, na tradição indígena, representam o movimento das águas. O símbolo remete ao profeta Ezequiel, que falava da água que corre do altar e fecunda toda a terra. Divulgação/Santuário Nacional O altar, no centro da basílica, é circundado por linhas em ziguezague que, na tradição indígena, representam o movimento das águas. O símbolo remete ao profeta Ezequiel, que falava da água que corre do altar e fecunda toda a terra. Divulgação/Santuário Nacional

A preocupação do projeto do interior da basílica era refletir a centralidade de Cristo na vida da Igreja e conduzir os fiéis a uma grande catequese sobre os grandes temas da vida cristã. “O centro é o altar e a cruz. Maria está ao fundo de uma das naves, fora do espaço celebrativo, acolhendo e conduzindo para aquele que é o centro de nossa fé”, diz Paro. “Através da devoção a Maria, deseja-se aproximar os peregrinos e devotos do seu filho Jesus”.

Comemoração

A coroa comemorativa dos 300 anos. Divulgação/Santuário Nacional A coroa comemorativa dos 300 anos. Divulgação/Santuário Nacional

As atividades começam cedo no dia 12 em Aparecida. Devotos participarão de uma vigília da meia-noite às 5h, quando haverá a primeira missa do dia. A missa principal será às 9h30, no pátio da basílica. Representando o papa Francisco, estará presente o cardeal italiano Giovanni Battista Re, que presidiu a 5ª Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, realizada em Aparecida em 2007, bem como o conclave que elegeu Francisco em 2013.

À tarde, uma procissão sairá do Porto Itaguaçu, ponto do rio em que a imagem foi encontrada, até o santuário, onde haverá mais uma missa e um grande show que deve reunir Daniel, Fafá de Belém, Elba Ramalho e outros cantores.

No dia anterior, 11, a imagem de Aparecida ganhará uma coroa comemorativa que contém, em seu interior, terra proveniente das 27 unidades federativas do Brasil.

Datas marcantes

De um oratório à beira da estrada a uma basílica imensa visitada por três papas: a história do Santuário Nacional

1717 – Três pescadores encontram a imagem no Rio Paraíba, primeiro o corpo, depois a cabeça. Conta-se que a pesca, que não tinha dado resultado até então, foi abundante logo depois da descoberta.

1745 – É inaugurada a primeira igreja dedicada a Nossa Senhora da Conceição Aparecida. A imagem, que até então ficava na casa de Felipe Pedroso, um dos pescadores, e depois foi para um oratório à beira da estrada, é levada para a capela.

1888 – É inaugurado a Igreja de Monte Carmelo, hoje conhecido como Basílica Velha ou Matriz Basílica, cuja construção tinha sido iniciada em 1844.

1894 – As atividades da igreja são confiadas a missionários redentoristas vindos da Alemanha.

1930 – O papa Pio XI proclama Nossa Senhora Aparecida padroeira do Brasil.

O projeto arquitetônico é baseado no Santuário Nacional da Imaculada Conceição, em Washington. Divulgação/Santuário Nacional O projeto arquitetônico é baseado no Santuário Nacional da Imaculada Conceição, em Washington. Divulgação/Santuário Nacional

1946 – É lançada a pedra fundamental do novo santuário, mas ela foi roubada na mesma noite e a nova pedra só foi colocada em 1954.

1953 – A data da festa de Aparecida é fixada em 12 de outubro. Antes disso, ela era festejada em 7 de setembro.

1955 – Tem início a construção do santuário.

1978 – A imagem é retirada do nicho por um rapaz com distúrbios psicológicos que, ao ser pego, a derruba, quebrando-a em mais de duzentos pedaços. Reconstituída, a imagem só voltou à igreja no ano seguinte.

1980 – O papa João Paulo II inaugura o novo santuário. Uma lei declara 12 de outubro feriado nacional.

1983 – A CNBB dá ao templo o título de Santuário Nacional.

2007 – O santuário recebe a visita do papa Bento XVI e sedia a 5ª Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano.

2013 – O papa Francisco visita o santuário.

A imagem encontrada em 1717, no nicho da basílica que a abriga. Divulgação/Santuário Nacional A imagem encontrada em 1717, no nicho da basílica que a abriga. Divulgação/Santuário Nacional

Como a imagem foi parar no rio?

Segundo a historiadora Tereza Pasin, a imagem venerada em Aparecida teria sido esculpida no século XVII. Nossa Senhora da Conceição era uma devoção em alta naquela época e era costume que imagens pequenas como a de Aparecida adornassem oratórios domésticos. O frei Agostinho de Jesus é considerado o provável autor da imagem.

Mas como a imagem foi parar no rio? Segundo Pasin, pode ser que alguém, desejando se desfazer da imagem quebrada, a tenha jogado ali. Outra hipótese é que ela ficasse em uma capelinha na cidade vizinha de Roseira que foi arrastada por uma enchente.

Detalhe do mosaico da cúpula. Divulgação/Santuário Nacional Detalhe do mosaico da cúpula. Divulgação/Santuário Nacional

71 anos?

Os 71 anos da basílica de Aparecida – na verdade 62, se contarmos a partir do início efetivo da construção, em 1955 – são um piscar de olhos perto do tempo de construção de outras grandes igrejas do mundo.

Catedral de Colônia, Alemanha – 1248-1473 e 1840-1880 – 245 anos

Catedral de Notre-Dame, Paris, França – 1163-1345 – 182 anos

Templo Expiatório da Sagrada Família, Barcelona, Espanha – 1882-2028 (previsto) – 146 anos

Basílica de São Pedro, Vaticano – 1506-1626 – 120 anos

 

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